Pelo que se viu na sexta-feira e no sábado, a inédita renovação do Senado - das 54 cadeiras disputadas nas eleições do ano passado, 46 foram preenchidas por novos parlamentares - foi apenas uma troca de nomes. Os costumes permaneceram os mesmos, se não é que pioraram. O início da 56.ª Legislatura do Senado foi uma grande bagunça, com estudantadas de ensino médio, afrontas ao Regimento Interno do Senado e uma reiterada indiferença pelos bons modos. Ainda que o senador Renan Calheiros tenha sido derrotado - o que é uma excelente notícia -, a eleição para a presidência do Senado foi uma vitória das piores práticas políticas. A tão esperada “nova política” ainda não foi vista.
Após a posse dos senadores, quando juraram respeitar a Constituição e as leis do País, deveria ser feita a eleição da presidência da Casa. No entanto, não houve eleição na sexta-feira. A sessão, que durou mais de cinco horas, foi um show de agressões, insultos e arbitrariedades. O dia 1.º de fevereiro de 2019 ficará marcado como um momento vergonhoso da história do Senado.
Apesar de ser candidato, o senador Davi Alcolumbre (DEM-AP) assumiu a presidência da sessão, numa afronta à neutralidade que deve existir na condução dos trabalhos eleitorais. Não cabe a um candidato presidir a sessão que pode ser a da sua própria eleição. Questionado a respeito desse estranho comportamento, o senador Alcolumbre simplesmente não se levantou da cadeira. Era a tática da força.
Confirmando sua disposição para o confronto, o senador Alcolumbre pôs em votação se o voto para a eleição da presidência do Senado seria aberto ou fechado. Afrontava, assim, o Regimento Interno da Casa, que expressamente diz que “a eleição dos membros da Mesa será feita em escrutínio secreto”. A sessão, na qual deveria ocorrer a votação, passou a ser usada para mudar as regras da eleição. E ainda por cima, fazendo com que uma questão de ordem prevalecesse sobre o Regimento Interno.
Para surpresa de quem esperava que a nova composição da Casa fosse ter mais apreço pela legalidade - afinal, o respeito à lei é um dos aspectos da “nova política” -, 50 senadores votaram contra o Regimento Interno. Após grande tumulto, a sessão de sexta-feira foi suspensa.
No sábado, parte da legalidade foi restabelecida por meio de uma decisão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF). Acionado pelo MDB e o Solidariedade, o ministro Dias Toffoli determinou que, em obediência ao Regimento Interno da Casa, a eleição da presidência do Senado deveria ser secreta. Também decidiu que o senador Davi Alcolumbre, notório candidato à presidência da Casa, não poderia presidir a sessão preparatória. “Na falta dos membros da Mesa anterior, assumirá a Presidência o mais idoso dentre os presentes”, prevê o Regimento Interno.
Assim, o senador José Maranhão (MDB-MA) deveria assumir a presidência da sessão preparatória.
Já no sábado, após os discursos de praxe, a primeira votação teve de ser anulada, pois na urna havia 82 cédulas, sendo 81 os senadores. Na segunda votação, Davi Alcolumbre sagrou-se vencedor, com 42 votos. Apesar de ser uma votação secreta, muitos senadores mostraram a cédula aberta na hora de votar, num prenúncio das muitas confusões que ainda estão por vir nessa legislatura. Quando a lei não é bem vista, muitos preferem ignorá-la. A opinião pública, ou o que cada um acha que é a opinião pública, torna-se a lei absoluta. Não é esse o espírito que deve vigorar numa República, especialmente entre membros do Senado.
Não há dúvida de que o senador Renan Calheiros não reunia as condições para presidir o Senado dentro do que se espera da “nova política”. Mas o que foi feito nos dois primeiros dias de fevereiro envergonha a história do Senado. Não há possibilidade de boa política fora dos cânones institucionais. O Regimento Interno do Senado é lei para os senadores - ele não pode ser ignorado quando o seu conteúdo desagradar a alguns. O novo presidente do Senado, Davi Alcolumbre, mostrou do que é capaz quando seus interesses estão em jogo. Não foi um bom começo.
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