Se fosse à frente, ideia de apresentar já projeto para desvincular gastos do Orçamento atrapalharia reforma da Previdência sem gerar maiores ganhos
O noviciado de Paulo Guedes no Ministério da Economia tem produzido um nível de solavancos moderado, seja em relação ao que se esperava de um quadro sem experiência na máquina pública, seja na comparação com as trepidações que acometem outros setores da gestão Jair Bolsonaro (PSL).
O economista pareceu ter compreendido depressa as especificidades políticas de sua nova posição.
Para compensar a falta de traquejo —sua e de auxiliares levados ao ministério—, escalou nos degraus abaixo técnicos com conhecimento da máquina e do Congresso. Percebida a centralidade da reforma da Previdência, passou a ceder em outros tópicos de sua agenda.
Dedicou-se a desbastar os possíveis entraves a seu programa de desestatização em burocracias poderosas, como o Tribunal de Contas da União. Como mostrou o leilão de aeroportos nesta sexta (15), cuja arquitetura foi toda desenhada no governo de Michel Temer (MDB), daí poderão vir notícias mais concretas para a ansiada reanimação da atividade econômica.
Mas a obsessão de Guedes com o tema da desvinculação de despesas orçamentárias produziu um tropeço na semana passada.
Em entrevista a O Estado de S. Paulo no domingo (10), o ministro disse que uma emenda para desvincular e desindexar os gastos dos orçamentos públicos começaria a tramitar no Senado Federal concomitantemente à reforma da Previdência, que entrou pela Câmara.
De imediato nova preocupação tomou conta do mundo partidário, com repercussões no financeiro. Se o plano fosse à frente, não apenas a energia política seria dispersada. Cresceria também o número de adversários das duas propostas.
Felizmente, diante das críticas, o ministro desistiu da ideia. Tudo indica que vai no mínimo esperar o trâmite do texto previdenciário.
Há mérito na ideia de devolver aos atuais legisladores parte da competência para definir o destino das verbas públicas, prerrogativa demasiadamente subtraída pela Carta. Mas a simples desvinculação, além do custo político, não traria muito ganho nesse aspecto.
A grande maioria dos gastos orçamentários da União, dos estados e dos municípios se traduz, ao fim e ao cabo, em salários de servidores, aposentadorias ou pensões. Essas despesas não podem ser suspensas nem reduzidas, mesmo se houver a desvinculação constitucional.
Será muito mais trabalhoso aumentar a margem de manobra dos governos e dos parlamentares no manejo dos seus orçamentos. Uma série de mudanças legais e jurisprudenciais será necessária.
A reforma da Previdência constitui só o primeiro passo nesse rumo. Mas, de tão necessário, todos os outros dependem dele. Por isso o governo deveria evitar ruídos capazes de complicar sua aprovação.
Nenhum comentário:
Postar um comentário