O Globo
O jogo pesado do presidente da Câmara,
deputado Arthur Lira, marcou o dia de ontem, com ameaças de cortar o ponto dos
deputados faltosos, tentativa de antecipar a sessão de votação sobre a PEC dos
Precatórios para a noite, adiantando-se a uma possível decisão da ministra do
Supremo Tribunal Federal (STF) Rosa Weber sobre o pedido de parlamentares para
suspender o segundo turno por irregularidades que afetam a Constituição.
O boato em Brasília é que a ministra já tomou a decisão de acatar o pedido de
oposicionistas e que Lira desistiu de antecipar a votação tanto por falta de
votos quanto para tentar contornar o que seria uma decisão definitiva que
impediria a votação do segundo turno marcada para hoje de manhã. O presidente
da Câmara demonstra, com a manobra abortada de tentar antecipar a votação, a
maneira truculenta com que usa a presidência para fazer valer seus interesses
pessoais.
Lira abriu mão, por falta de argumentos ou hábito de não dialogar, de se
explicar à ministra Rosa Weber, que deu 24 horas para que demonstrasse que não
feriu a Constituição com as manobras regimentais usadas na votação do primeiro
turno, tais como permitir o voto de deputados em licença, ou porque estão em
missão oficial no exterior, ou por estarem doentes. Ora, se estão licenciados,
não podem votar, como é tradição no Congresso. Que, aliás, o bom senso
recomenda.
O pedido de audiência com o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luiz Fux, que aconteceu na tarde de ontem, foi mais uma ousadia de Lira, pois visava a constranger o presidente de outro Poder diante de uma ação que tramita no STF contra suas decisões. Se considera que a decisão da ministra Rosa Weber é uma intromissão no Poder Legislativo, como Lira acha que pode pressionar o ministro Luiz Fux “visitando-o” com líderes da Câmara e do Senado?
A discussão no STF está muito grande, e a Corte aparentemente dividida em relação às pautas da Câmara dos Deputados, como a PEC dos Precatórios e as emendas do relator. São duas ações distintas, sob a relatoria da mesma ministra Rosa Weber. A liminar para a suspensão, por falta de transparência, das emendas do relator já está sendo analisada no plenário virtual, de hoje até amanhã. A para a suspensão do segundo turno da votação da PEC dos Precatórios deve ter uma decisão da relatora até esta manhã.
É uma situação delicada, porque o deputado Arthur Lira preside a Casa com agressividade, passa por cima do regimento interno e faz interpretações descabidas que ultrapassam a Constituição para conseguir seus objetivos. O STF não pode interferir nas decisões internas do Congresso, a não ser quando a Constituição é ofendida. Esta é a decisão a tomar: se os ministros entendem que as mudanças de regimento ferem a Constituição, ou se simplesmente são questões internas que devem ser resolvidas pelo Legislativo.
São interpretações que Arthur Lira força por um lado, e a minoria contesta, pois não quer ser esmagada pela maioria, ainda mais quando ela é formada por verbas secretas e argumentos falaciosos. Tudo isso transforma o controle da sociedade muito difícil. Ninguém sabe quem ganhou as verbas secretas, como ganhou e por que ganhou. Por exemplo, porque votou a favor do governo.
A divisão do STF hoje torna as decisões mais complexas, porque são apenas dez ministros, e o empate mantém a decisão que está sendo contestada. Somente no habeas corpus o empate favorece o réu. Em casos como os que estão em julgamento, o presidente do Supremo, no caso Luiz Fux, tem o direito de dar o voto de minerva, mas raramente isso acontece. Seria assumir sozinho uma decisão que literalmente divide o plenário.
Por fim, há um aspecto econômico fundamental embutido dentro desse imbróglio político, a insegurança jurídica que afasta os investidores, não apenas os internacionais. Como algum deles vai investir num país em que o governo decide do nada que não vai mais pagar o que deve?
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