O Globo
Cientista político comenta em livro que o
segundo turno sempre confirma o primeiro turno
Se pegarmos alguns detalhes da mais recente
pesquisa Datafolha, veremos que a sensação de otimismo com a economia aumentou
sensivelmente entre a população, e que a rejeição ao presidente Bolsonaro,
embora muito alta, caiu de 60% para 51%. Como consequência, a diferença dele
para o ex-presidente Lula também foi reduzida sensivelmente nos últimos meses.
Não há indicação de que essa redução esteja sendo conseguida com a rapidez
necessária para que Bolsonaro possa ultrapassar Lula ainda no primeiro turno,
nem de que isso acontecerá. Mas há indícios de que a eleição não terminará no
primeiro turno.
O presidente entra na campanha oficial de radio e televisão, na qual tem que aumentar a rejeição de Lula enquanto tenta reduzir a sua própria, com disposição para desconstruir a imagem do ex-presidente, trazendo ao tempo presente os escândalos de corrupção que abalaram a imagem do PT e do próprio Lula. O ex-presidente fará o mesmo, pois manter a rejeição a Bolsonaro em mais de 50% o inviabiliza como candidato competitivo.
A maior sensação de bem-estar que a
pesquisa do Datafolha registrou deve-se ao efeito da redução do preço dos
combustíveis, dos benefícios aos taxistas e à expectativa do Auxílio Brasil
turbinado para R$ 600. A pesquisa ainda não registrou o efeito da entrada do
dinheiro no bolso do cidadão de renda baixa, e o resultado perverso do
empréstimo consignado nesse público, que lhe dará uma sensação de capacidade de
consumo que mais adiante será cobrada em endividamento.
Se Bolsonaro conseguir levar a eleição para
o segundo turno, poderá se beneficiar também do efeito das bondades
distribuídas durante o mês de outubro. Isso se conseguir manter a inflação sob
controle, pois as deflações registradas não contiveram a alta dos preços dos
alimentos, fator fundamental para reverter o humor dos menos favorecidos.
O que define uma eleição é, em última
instância, a inflação. O cientista político Alberto Carlos de Almeida acaba de
lançar um livro cujo título - “A mão e a luva” - é emprestado de um famoso
romance de Machado de Assis, mas que se presta a analisar todas as eleições
ocorridas desde a redemocratização, em 1989, até os dias de hoje, tentando
entender quando a mão do candidato a presidente se encaixa na luva da maioria
do eleitorado, da “opinião pública” na sua definição.
Guiomar, a heroína do romance de Machado de
Assis, escolhe entre três pretendentes aquele que dá match, em internetês, com
suas expectativas: não o mais romântico, nem o mais rico, sim o mais ambicioso,
que lhe daria “o lustre de seu nome”. Esse match entre a opinião pública e os
candidatos acontece devido a várias possibilidades: situação da economia, com
ênfase especial na inflação e ao desemprego, aumento do consumo, políticas
públicas que atendam aos mais necessitados, escândalos de corrupção.
Uma constatação fundamental, aparente na
sua simplicidade óbvia, mas pouco percebida, é que até hoje o segundo turno da
eleição apenas confirmou o resultado do primeiro, não havendo registro de uma
reviravolta. Esse fato faz com que ele sugira que adotemos o critério usado em
diversos países da nossa região, determinando que o candidato que tenha 45% ou
mais no primeiro turno seja automaticamente considerado eleito.
Com essa regra, apenas em 2014, na disputa
entre Dilma e Aécio, haveria segundo turno. O segundo turno seria um
desperdício de tempo e dinheiro, para Alberto Carlos de Almeida, pois todas as
condições para uma vitória - ou derrota - estão dadas no primeiro.
O livro não discute hipóteses, apenas
analisa os números e suas consequências. A sensação de bem-estar individual,
embora reforçada por auxílios e benefícios que os governos populistas
distribuem com intuitos eleitorais, só se realiza se a economia estiver
funcionando bem, sobretudo no controle da inflação, cujos efeitos deletérios
atingem com mais força os mais pobres, sempre. O sucesso do Plano Real, que
levou Fernando Henrique Cardoso a duas vitórias no primeiro turno quando, em
1994, não sabia nem se seria eleito deputado federal, deu-se devido ao sucesso
eficaz do controle da hiperinflação que há anos castigava o povo brasileiro.
O Plano Cruzado anterior levou a uma vitória esmagadora do MDB do então presidente José Sarney nas eleições estaduais, uma primeira tentativa de controle da inflação e das contas públicas que, se tivesse tido continuidade, poderia ter antecipado os efeitos do plano estabilizador vitorioso do governo Fernando Henrique. Alberto Carlos de Almeida ressalta que foi a perda de controle da inflação, muito antes dos protestos de 2013, que ocasionou o desgaste político que levou ao impeachment da então presidente Dilma Rousseff. Assim como o PT chegou ao governo em 2002 com Lula muito devido à subida da inflação no segundo governo do PSDB.
Um comentário:
Eu gostaria muito que tudo encerrasse no primeiro turno.
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