Folha de S. Paulo
Brasil manteve direitos e ganhou dinheiro por
ter derrotado golpe bolsonarista
O primeiro ano do governo Lula superou
todas as expectativas razoáveis e pelo menos empatou com alguns chutes
otimistas.
O crescimento deve ser quase quatro vezes
(3%) as expectativas do mercado no início do ano (0,8%). O desemprego é o mais
baixo desde o começo de 2015. Em se confirmando as previsões do relatório
Focus, a inflação deve ficar dentro da meta pela primeira vez desde 2020. O
salário-mínimo teve seu primeiro aumento real em anos.
Fatores externos certamente ajudaram o
sucesso econômico. Mas Fernando
Haddad construiu e implementou com competência uma agenda econômica de
frente ampla.
A aprovação da reforma tributária é um dos grandes eventos políticos no Brasil neste século. Haddad ainda emplacou o arcabouço fiscal, a tributação de fundos exclusivos e offshores, e segue na briga pela correção das ineficiências e iniquidades do Estado brasileiro.
Note-se que o governo incorporou propostas do
centro liberal e, ao mesmo tempo, deu início a reformas redistributivas que a
esquerda não conseguiu fazer nas presidências anteriores do PT. O Brasil ainda
captou US$ 2 bilhões no exterior com a emissão dos títulos "verdes" e
deve aprovar em breve as regras de um mercado de carbono.
De volta ao Ministério do Meio Ambiente, Marina Silva já
conseguiu reduzir o desmatamento na Amazônia em 22%. Depois de vários anos em
que Ricardo
Salles queimou safras futuras com sua promoção do aquecimento global,
a reconstrução é difícil, mas está acontecendo.
Na educação, Camilo
Santana criou o programa de promoção do ensino integral, que planeja
alcançar 3,2 milhões de crianças até 2026. Na semana passada, a Câmara aprovou
um ótimo programa que oferecerá uma bolsa e uma poupança a estudantes pobres
que completarem o ensino médio. De autoria da deputada Tabata Amaral (PSB-SP),
o projeto constava do programa de governo de Simone Tebet. O governo deveria
implementar os bons projetos do MEC com mais pressa.
Por outro lado, as negociações sobre o novo
ensino médio —um problema gigante herdado de governos anteriores— seguem
difíceis no Congresso.
Na diplomacia, o Brasil deixou de ser o pária
que foi durante o governo Bolsonaro, mas boa parte disso foi imediatamente
alcançado no dia em que Jair perdeu a eleição. A política externa revelou-se um
desafio mais difícil do que Lula esperava: os espaços multilaterais em que
atuou impetuosamente em seus primeiros mandatos (ONU, OMC etc.) estão
esvaziados. O cenário geopolítico é incomparavelmente pior do que 20 anos
atrás. Quase
começou uma guerra entre Venezuela e Guiana. Ainda não foi possível fechar
o acordo entre Mercosul e União Europeia.
As nomeações para o Judiciário foram a área
em que Lula foi mais conservador. Indicou gente que lhe é próxima, ou confiável
por ser " garantista". Os indicados podem perfeitamente ter um bom
desempenho. Mas lamento que mulheres e negros não tenham sido contemplados,
como foram em outras administrações petistas.
Diante disso tudo, desafio o leitor a achar
primeiros anos de mandato muito melhores do que este na história da Nova
República. O próximo ano deve ser bem mais difícil. Mesmo assim, devemos
comemorar um ano que começou derrotando um golpe de Estado e terminou com a
primeira grande reforma tributária de nossa democracia.
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