Valor Econômico
‘Rochedos’ no Judiciário preocupam executivos com atuação em Brasília, associações empresariais e integrantes do corpo diplomático estrangeiro
Vem do latim a palavra “risco”. Mais
precisamente, do vocábulo “resecare”, que significa “cortar separando”, e
remete à noção do perigo que os navegantes tinham ao passar por rochas
perigosas e pontiagudas. Pois a maré das eleições municipais baixou, e expôs
dois rochedos que preocupam executivos com atuação em Brasília, associações
empresariais e integrantes do corpo diplomático estrangeiro. Ambos no
Judiciário.
Nos últimos dias, é claro, esses interlocutores também mantiveram expectativas em relação à sabatina de Gabriel Galípolo, indicado para a presidência do Banco Central (BC) e depositário das esperanças do governo quanto à redução das taxas de juros a partir do ano que vem. A trajetória da dívida brasileira e a situação estrutural das contas públicas permanecem no radar. Mas, ainda que afastadas as incertezas macroeconômicas, permanecerá a necessidade de análise de outros aspectos do risco político existente no Brasil.
Um deles emerge da disputa entre o grupo
ítalo-argentino Ternium e a Companhia
Siderúrgica Nacional (CSN).
Bilionário, o embate sobre a aquisição de
participação na mineradora Usiminas é visto como determinante para as
discussões sobre a aplicação da lei nas compras de ações de sociedades abertas,
em que a oferta pública se faz necessária nos casos de efetiva alienação do
controle da companhia. Ele versa sobre o “tag along”, ou seja, a prática de
estender a oferta das ações aos demais acionistas - mecanismo que assegura aos
minoritários a oportunidade de se livrar de suas respectivas participações em
uma determinada companhia quando ocorre mudança de controle.
Em junho, o Superior Tribunal de Justiça
(STJ) determinou à Ternium o pagamento de uma indenização de R$ 5 bilhões
à CSN por
entender que o negócio da Usiminas não seguiu os procedimentos legais
necessários. Essa decisão alterou o acórdão, após embargo de declaração
da CSN,
formando o entendimento de que houve mudança de controle da Usiminas com a
entrada do grupo Ternium e, portanto, a Companhia
Siderúrgica Nacional teria direito ao “tag along” por ser sócia
minoritária da empresa mineira.
Em 2011, a Ternium adquiriu 27,7% do total do
capital votante da Usiminas. Na época, a japonesa Nippon Steel detinha 30% da
participação. Após a operação, a CSN ajuizou
ação por entender que o grupo deveria ter cumprido a determinação legal de
oferta pública aos sócios minoritários. Ela detinha o equivalente a 17,4% do
capital social da Usiminas. Já a Ternium argumentou que não haveria
obrigatoriedade de realização da oferta, pois não exercia o controle da
companhia.
Mas o caso chegou às mãos do ministro André
Mendonça, do Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda não decidiu como
procederá. Na prática, dependendo do andamento, pode haver a suspensão de todos
os julgamentos sobre “tag along”, inclusive o que suscitou o questionamento.
O caso ganhou corpo. Mais recentemente,
federações de indústrias e associações empresariais entraram como interessadas
no processo. Como um “leading case”, argumentam, ele tende a servir de
precedente para outros semelhantes: pede-se que seja esclarecido o artigo 254-A
da Lei 6404/76, a chamada “Lei das S.A.”. A avaliação é que o desfecho pode ter
impacto no setor de fusões e aquisições e, também, na tomada de decisões de
investimentos estrangeiros no Brasil.
Do outro lado, o argumento é que a provocação
do STF é que tem gerado insegurança jurídica, por ser capaz de suspender
julgamentos em andamento. Ainda assim, o tema tem sido objeto de gestões entre
diplomatas estrangeiros, a chancelaria brasileira e o Palácio do Planalto. O
vice-primeiro-ministro da Itália, Antonio Tajani, que também está à frente do
Ministério das Relações Exteriores, visita nesta semana a Argentina e o Brasil.
O outro ponto de atenção é o retorno das
operações do X.
Após posicionamento da Procuradoria-Geral da
República (PGR) de que a rede social acolhera as ordens da Justiça, o ministro
Alexandre de Moraes, também do STF, autorizou o desbloqueio do X. Ele retornará
ao ar depois de 40 dias, pois indicou uma representante legal no país, retirou
conteúdo com “fake news” e pagou as multas no valor de R$ 28,6 milhões.
Entre executivos e diplomatas estrangeiros,
existe a compreensão de que era necessário demonstrar ao bilionário Elon Musk
que, sim, ele sempre precisará respeitar a legislação nacional. Um empresário,
por mais rico que seja, não terá apoio quando violar a soberania do país.
Por outro lado, existe uma expectativa - ou
melhor, uma torcida - de que ganhe nova luz a discussão sobre a realização do
bloqueio de recursos em contas bancárias da Starlink como forma de garantir o
cumprimento das sanções impostas ao X.
Moraes considerou que deveria haver responsabilidade solidária entre as empresas. No entanto, agentes do mercado e integrantes da comunidade internacional baseados na capital federal alertam que esse foi um sinal preocupante para os investidores, pois agora estariam turvos os limites entre CPFs e CNPJs. Interessa ao país que essas dúvidas sejam dirimidas o mais breve possível, abrindo caminho para quem quiser navegar no Brasil.
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