DEU NO CORREIO BRAZILIENSE
Núcleo da Justiça Eleitoral e do TCU mapeia corrupção administrativa, confundida de propósito com “recurso não contabilizado”
Mirella D’Elia e Flávia Foreque
A Justiça Eleitoral apertará o cerco aos políticos à caça de crimes de caixa 2. Para isso, criou um núcleo especializado na auditoria das contas de partidos e candidatos, que está em fase de implantação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Oficialmente, o objetivo é aprofundar a operação pente-fino nas prestações de contas, um trabalho que já é feito pela Corte. Mas a iniciativa pode ir além da busca de irregularidades na arrecadação de dinheiro em campanhas eleitorais. O novo núcleo foi ampliado a partir de parceria inédita com o Tribunal de Contas da União (TCU).
Técnicos do TCU que integram o núcleo, criado há seis meses, querem aproveitar a parceria para ir atrás de outros crimes, como corrupção, que, muitas vezes, são postos na conta da Justiça Eleitoral, tida como mais lenta e com punições mais brandas. A ideia é que o núcleo possa atuar de forma mais rápida na busca e na punição de irregularidades quando o assunto é a arrecadação de dinheiro em campanhas políticas. Mas ele também poderá desmontar a tese do caixa 2, suscitada frequentemente por políticos flagrados em situações suspeitas. E alertar o Ministério Público sobre indício de crimes que fujam da esfera de atuação dos técnicos do TSE e do TCU.
Recentemente, após a operação Caixa de Pandora, que investiga suposto esquema de corrupção no Distrito Federal, o então presidente da Câmara Legislativa do DF, Leonardo Prudente (DEM), disse que o dinheiro que recebeu do ex-secretário de Relações Institucionais do DF Durval Barbosa foi para financiar sua campanha eleitoral de 2006. E que a doação não foi contabilizada, ou seja, seria fruto de caixa 2. Leonardo Prudente está licenciado do cargo. O governador José Roberto Arruda (DEM) alega que o dinheiro recebido era para a compra de panetones. E que foi registrado na Justiça Eleitoral. Além da suspeita de crime eleitoral, Arruda é investigado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por suspeita de corrupção.
Como o núcleo está sendo formatado, os limites e as atribuições do grupo ainda são tratados de forma reservada no TSE. Mas há consenso em torno de uma questão: a banalização do caixa 2. De forma reservada, ministros do TSE lembram que, para escapar de processos de impeachment, que correm no Legislativo de forma célere, políticos tentam jogar para a Justiça Eleitoral a investigação de irregularidades. “O caixa 2 virou uma desculpa cômoda. Quando o sujeito é pego com dinheiro na meia ou na cueca, diz que é para pagar saldo de campanha. O sujeito diz: ‘Não roubei, não corrompi, não fui corrompido. Apenas não contabilizei (o dinheiro)’. Ele está em busca da condescendência da sociedade”, diz um dos ministros da mais alta Corte de Justiça Eleitoral do país.
A iniciativa ganha força com a proximidade do processo eleitoral do ano que vem. “O objetivo é chegar a 2010 com uma equipe pronta para fazer toda essa parte de auditoria. O Estado já tem vários órgãos de controle. Se nos ajudarmos mutuamente, se houver uma reciprocidade, se houver uma troca de informações, vamos dar mais efetividade ao combate à corrupção. É uma união de esforços”, diz o presidente do Tribunal do TCU, Ubiratan Aguiar.
Lacunas
Parlamentares ouvidos pelo Correio reconhecem que a iniciativa pode coibir o caixa 2 em eleições futuras. Mas apontam outras lacunas, ainda existentes, que dificultam o monitoramento das despesas de campanha. O deputado Chico Alencar (PSol-RJ) defende mais transparência na doação de recursos para os políticos. O parlamentar faz referência a doações feitas aos partidos políticos que, por sua vez, repassam o dinheiro aos candidatos — mecanismo que se pulverizou no cenário eleitoral recente do país e ficou conhecido como “doação oculta”. Alencar reconhece ainda que o caixa 2 é usado por políticos em campanha para acobertar outras irregularidades. “Ele ameniza outros delitos financeiros, serve para aumentar o patrimônio.”
Por isso, para Alencar, “quanto mais parcerias entre órgãos técnicos, mais inibidas ficarão as práticas por baixo do pano”. Para o líder do PSDB na Câmara, José Aníbal (SP), a parceria entre os dois tribunais é um sinal de que o atual sistema está “exaurido”. “Isso mostra que, dentro do processo político, a questão do mérito, do programa, deu lugar (à preocupação com) dinheiro de campanha”, afirma. Na avaliação do tucano, é clara a intenção de alguns políticos de fazer uso do caixa 2 e enriquecer de forma ilícita durante campanhas eleitorais, o que só mudaria com o fim da impunidade.
Memória
Núcleo da Justiça Eleitoral e do TCU mapeia corrupção administrativa, confundida de propósito com “recurso não contabilizado”
Mirella D’Elia e Flávia Foreque
A Justiça Eleitoral apertará o cerco aos políticos à caça de crimes de caixa 2. Para isso, criou um núcleo especializado na auditoria das contas de partidos e candidatos, que está em fase de implantação no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Oficialmente, o objetivo é aprofundar a operação pente-fino nas prestações de contas, um trabalho que já é feito pela Corte. Mas a iniciativa pode ir além da busca de irregularidades na arrecadação de dinheiro em campanhas eleitorais. O novo núcleo foi ampliado a partir de parceria inédita com o Tribunal de Contas da União (TCU).
Técnicos do TCU que integram o núcleo, criado há seis meses, querem aproveitar a parceria para ir atrás de outros crimes, como corrupção, que, muitas vezes, são postos na conta da Justiça Eleitoral, tida como mais lenta e com punições mais brandas. A ideia é que o núcleo possa atuar de forma mais rápida na busca e na punição de irregularidades quando o assunto é a arrecadação de dinheiro em campanhas políticas. Mas ele também poderá desmontar a tese do caixa 2, suscitada frequentemente por políticos flagrados em situações suspeitas. E alertar o Ministério Público sobre indício de crimes que fujam da esfera de atuação dos técnicos do TSE e do TCU.
Recentemente, após a operação Caixa de Pandora, que investiga suposto esquema de corrupção no Distrito Federal, o então presidente da Câmara Legislativa do DF, Leonardo Prudente (DEM), disse que o dinheiro que recebeu do ex-secretário de Relações Institucionais do DF Durval Barbosa foi para financiar sua campanha eleitoral de 2006. E que a doação não foi contabilizada, ou seja, seria fruto de caixa 2. Leonardo Prudente está licenciado do cargo. O governador José Roberto Arruda (DEM) alega que o dinheiro recebido era para a compra de panetones. E que foi registrado na Justiça Eleitoral. Além da suspeita de crime eleitoral, Arruda é investigado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) por suspeita de corrupção.
Como o núcleo está sendo formatado, os limites e as atribuições do grupo ainda são tratados de forma reservada no TSE. Mas há consenso em torno de uma questão: a banalização do caixa 2. De forma reservada, ministros do TSE lembram que, para escapar de processos de impeachment, que correm no Legislativo de forma célere, políticos tentam jogar para a Justiça Eleitoral a investigação de irregularidades. “O caixa 2 virou uma desculpa cômoda. Quando o sujeito é pego com dinheiro na meia ou na cueca, diz que é para pagar saldo de campanha. O sujeito diz: ‘Não roubei, não corrompi, não fui corrompido. Apenas não contabilizei (o dinheiro)’. Ele está em busca da condescendência da sociedade”, diz um dos ministros da mais alta Corte de Justiça Eleitoral do país.
A iniciativa ganha força com a proximidade do processo eleitoral do ano que vem. “O objetivo é chegar a 2010 com uma equipe pronta para fazer toda essa parte de auditoria. O Estado já tem vários órgãos de controle. Se nos ajudarmos mutuamente, se houver uma reciprocidade, se houver uma troca de informações, vamos dar mais efetividade ao combate à corrupção. É uma união de esforços”, diz o presidente do Tribunal do TCU, Ubiratan Aguiar.
Lacunas
Parlamentares ouvidos pelo Correio reconhecem que a iniciativa pode coibir o caixa 2 em eleições futuras. Mas apontam outras lacunas, ainda existentes, que dificultam o monitoramento das despesas de campanha. O deputado Chico Alencar (PSol-RJ) defende mais transparência na doação de recursos para os políticos. O parlamentar faz referência a doações feitas aos partidos políticos que, por sua vez, repassam o dinheiro aos candidatos — mecanismo que se pulverizou no cenário eleitoral recente do país e ficou conhecido como “doação oculta”. Alencar reconhece ainda que o caixa 2 é usado por políticos em campanha para acobertar outras irregularidades. “Ele ameniza outros delitos financeiros, serve para aumentar o patrimônio.”
Por isso, para Alencar, “quanto mais parcerias entre órgãos técnicos, mais inibidas ficarão as práticas por baixo do pano”. Para o líder do PSDB na Câmara, José Aníbal (SP), a parceria entre os dois tribunais é um sinal de que o atual sistema está “exaurido”. “Isso mostra que, dentro do processo político, a questão do mérito, do programa, deu lugar (à preocupação com) dinheiro de campanha”, afirma. Na avaliação do tucano, é clara a intenção de alguns políticos de fazer uso do caixa 2 e enriquecer de forma ilícita durante campanhas eleitorais, o que só mudaria com o fim da impunidade.
Memória
Escândalos recorrentes
Nos últimos anos, a proliferação de escândalos envolvendo políticos popularizou o termo no Brasil, mas nem sempre foi confirmada a prática de crime eleitoral.
2002
Em 1º de março de 2002, a Polícia Federal apreendeu R$ 1,3 milhão em espécie na empresa Lunus Serviços e Participações, da governadora do Maranhão Roseana Sarney e de seu marido, Jorge Murad. Na ocasião, a filha de José Sarney era pré-candidata à Presidência pelo então PFL (hoje DEM). Os envolvidos afirmaram que o dinheiro era doação de empresários para a campanha de Roseana. Ela desistiu da disputa presidencial no mês seguinte.
2004
A revista Época divulgou trechos de uma fita de vídeo em que Waldomiro Diniz, ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil e homem de confiança do então titular da pasta, José Dirceu, aparece cobrando propina e contribuição para campanhas ao bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. O encontro teria ocorrido em 2002, quando Waldomiro era presidente da Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro). Com a revelação do vídeo, o assessor de Dirceu foi exonerado.
2005
José Adalberto Vieira, assessor do então deputado estadual José Nobre Guimarães (PT-CE), foi detido por agentes federais em São Paulo com R$ 200 mil numa mala e US$ 100 mil na cueca. Guimarães hoje é deputado federal. Segundo o Ministério Público Federal, havia indícios de que parte dos recursos seria destinada ao diretório do PT no estado. O flagrante ocorreu durante o escândalo do mensalão e derrubou José Genoino, irmão de Guimarães, da presidência do PT.
2006
A Polícia Federal apreendeu, em setembro de 2006, R$1,7 milhão com petistas em um hotel de São Paulo. Valdebran Padilha e o então assessor da campanha de reeleição de Lula, Gedimar Passos, afirmaram que a intenção era negociar um dossiê contra os tucanos. O presidente qualificou os petistas de “aloprados”. Inquérito contra o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) por suposto envolvimento no esquema foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ele disputava o governo de São Paulo.
2002
Em 1º de março de 2002, a Polícia Federal apreendeu R$ 1,3 milhão em espécie na empresa Lunus Serviços e Participações, da governadora do Maranhão Roseana Sarney e de seu marido, Jorge Murad. Na ocasião, a filha de José Sarney era pré-candidata à Presidência pelo então PFL (hoje DEM). Os envolvidos afirmaram que o dinheiro era doação de empresários para a campanha de Roseana. Ela desistiu da disputa presidencial no mês seguinte.
2004
A revista Época divulgou trechos de uma fita de vídeo em que Waldomiro Diniz, ex-subchefe de Assuntos Parlamentares da Casa Civil e homem de confiança do então titular da pasta, José Dirceu, aparece cobrando propina e contribuição para campanhas ao bicheiro Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. O encontro teria ocorrido em 2002, quando Waldomiro era presidente da Loterj (Loteria do Estado do Rio de Janeiro). Com a revelação do vídeo, o assessor de Dirceu foi exonerado.
2005
José Adalberto Vieira, assessor do então deputado estadual José Nobre Guimarães (PT-CE), foi detido por agentes federais em São Paulo com R$ 200 mil numa mala e US$ 100 mil na cueca. Guimarães hoje é deputado federal. Segundo o Ministério Público Federal, havia indícios de que parte dos recursos seria destinada ao diretório do PT no estado. O flagrante ocorreu durante o escândalo do mensalão e derrubou José Genoino, irmão de Guimarães, da presidência do PT.
2006
A Polícia Federal apreendeu, em setembro de 2006, R$1,7 milhão com petistas em um hotel de São Paulo. Valdebran Padilha e o então assessor da campanha de reeleição de Lula, Gedimar Passos, afirmaram que a intenção era negociar um dossiê contra os tucanos. O presidente qualificou os petistas de “aloprados”. Inquérito contra o senador Aloizio Mercadante (PT-SP) por suposto envolvimento no esquema foi arquivado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Ele disputava o governo de São Paulo.
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