DEU EM O GLOBO
Inflação turbinada em R$58 bi
Governo injetou dinheiro extra na economia ao descumprir a meta de esforço fiscal em 2010
Martha Beck e Vivian Oswald
Os alimentos e as commodities em geral não foram os únicos vilões da inflação em 2010 - que fechou o ano em 5,91% pelo IPCA, acima do centro da meta de 4,5% fixada para o período. O próprio governo acabou por atiçar um de seus maiores algozes ao gastar mais do que estava previsto e inundar a economia com cerca de R$58 bilhões no ano passado. Essa é a diferença entre o que a equipe econômica se propôs a economizar para o pagamento de juros da dívida pública (o chamado superávit fiscal primário), que era de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB), e o que efetivamente conseguiu poupar: 1,6% do PIB, segundo cálculos do banco ABC Brasil.
No mercado, há quem diga que o governo teria feito um esforço fiscal ainda menor, de apenas 0,9% do PIB.
- Gastar mais é como emitir dinheiro na economia. Despesas maiores significam mais contratações, mais obras e mais renda. Tudo isso aumenta a demanda - afirma o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, que é ex-diretor do Banco Central (BC).
O governo afrouxou a disciplina fiscal em 2010 por dois caminhos: fez manobras contábeis (como a capitalização da Petrobras) de R$33,3 bilhões, que lhe permitiram gastar mais sem o equivalente efetivo do lado das receitas, e injetou diretamente na economia R$24,7 bilhões ao turbinar despesas correntes e com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
- Essa operação da Petrobras foi algo totalmente bizarro. O que o governo fez em 2010 foi descumprir a meta de primário e pressionar fortemente a demanda - ressalta o economista-chefe do ABC Brasil, Luiz Otávio Leal.
Sem ajuste fiscal, juros serão maiores
Segundo o economista da Máxima Asset Management Elson Telles, se em 2011 o governo não fizer um ajuste fiscal efetivo (entregando, sem descontos permitidos, o superávit cheio de 3,1%), o Banco Central poderá ter de manter os juros elevados mais tempo para manter a inflação dentro da meta:
- O objetivo deste ano será trazer a inflação para o centro da meta ou para algo muito próximo disso. O problema é que existe muita gente cética quanto à capacidade do governo de reduzir seus gastos no tamanho necessário.
Para Leal, do ABC Brasil, além de cortar despesas na carne, o governo terá de evitar operações como a capitalização do BNDES, que, embora não gere uma despesa primária, influencia a atividade econômica, porque permite ao banco de fomento elevar o volume de empréstimos ao setor produtivo:
- Isso não entra no Orçamento, mas afeta a inflação. Terá que ser levado em consideração pelo BC na hora de decidir a trajetória da Selic.
Os economistas lembram que o câmbio, que dá uma ajuda extra na hora de controlar os preços (pois a queda do dólar estimula a competição no mercado interno por meio de mais importações), continuará nesse caminho em 2011. O único problema será se houver uma guinada no mercado internacional que faça o dólar disparar, dificultando o papel da política monetária.
- Mas não vejo isso ocorrendo no horizonte - diz Telles.
- Os gastos a mais do governo influenciam, sobretudo, os preços dos bens não comercializáveis (itens que não podem ser exportados ou importados), pois os outros bens acabam se equilibrando em função das importações - explica Freitas.
Preocupada com as pressões inflacionárias dos gastos cada vez maiores do governo, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) propôs ontem um corte de R$40 bilhões no Orçamento da União de 2011, aprovado pelo Congresso Nacional. Para cumprir a meta de superávit de R$117 bilhões em 2001 (3,1% do PIB), a União precisa enxugar o atual Orçamento em pelo menos R$32 bilhões.
A CNI adverte em nota técnica que gastar menos é um fator decisivo para o governo controlar a inflação sem precisar elevar a taxa de juros a médio prazo. "A política fiscal expansionista dos últimos anos precisa ser revista. Caso esse caráter não seja alterado, o esforço da política monetária para conter um excesso de demanda que pressione a inflação será maior e irá comprometer o crescimento da economia".
A entidade ressaltou que "depois da política de expansão fiscal necessária para combater os efeitos da crise internacional (no fim de 2008 e ao longo de 2009), o momento é de reduzir o ritmo de crescimento dos gastos públicos para adequá-los ao crescimento da economia".
Pela quinta semana seguida, o mercado piorou suas projeções para a inflação de 2011 e reforçou a expectativa de que o Comitê de Política Monetária (Copom) voltará a subir a Selic - hoje em 10,75% ao ano -- na semana que vem. Segundo a pesquisa Focus do Banco Central (BC) divulgada ontem, a primeira de 2011, os economistas calculam que o IPCA fechará 2011 a 5,34%, acima dos 5,32% vistos na semana anterior, e ainda mais longe do centro da meta oficial do governo, de 4,5%.
A pesquisa Focus mostrou ainda que o mercado continua, pela sexta semana seguida, enxergando que a Selic terminará 2011 em 12,25%, sendo que o movimento de alta teria início na próxima semana, com a primeira reunião do Copom sob a batuta do novo presidente do BC, Alexandre Tombini. As contas são que a autoridade monetária elevará a taxa básica de juros em meio ponto percentual agora.
Inflação turbinada em R$58 bi
Governo injetou dinheiro extra na economia ao descumprir a meta de esforço fiscal em 2010
Martha Beck e Vivian Oswald
Os alimentos e as commodities em geral não foram os únicos vilões da inflação em 2010 - que fechou o ano em 5,91% pelo IPCA, acima do centro da meta de 4,5% fixada para o período. O próprio governo acabou por atiçar um de seus maiores algozes ao gastar mais do que estava previsto e inundar a economia com cerca de R$58 bilhões no ano passado. Essa é a diferença entre o que a equipe econômica se propôs a economizar para o pagamento de juros da dívida pública (o chamado superávit fiscal primário), que era de 3,1% do Produto Interno Bruto (PIB), e o que efetivamente conseguiu poupar: 1,6% do PIB, segundo cálculos do banco ABC Brasil.
No mercado, há quem diga que o governo teria feito um esforço fiscal ainda menor, de apenas 0,9% do PIB.
- Gastar mais é como emitir dinheiro na economia. Despesas maiores significam mais contratações, mais obras e mais renda. Tudo isso aumenta a demanda - afirma o economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC), Carlos Thadeu de Freitas, que é ex-diretor do Banco Central (BC).
O governo afrouxou a disciplina fiscal em 2010 por dois caminhos: fez manobras contábeis (como a capitalização da Petrobras) de R$33,3 bilhões, que lhe permitiram gastar mais sem o equivalente efetivo do lado das receitas, e injetou diretamente na economia R$24,7 bilhões ao turbinar despesas correntes e com o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC).
- Essa operação da Petrobras foi algo totalmente bizarro. O que o governo fez em 2010 foi descumprir a meta de primário e pressionar fortemente a demanda - ressalta o economista-chefe do ABC Brasil, Luiz Otávio Leal.
Sem ajuste fiscal, juros serão maiores
Segundo o economista da Máxima Asset Management Elson Telles, se em 2011 o governo não fizer um ajuste fiscal efetivo (entregando, sem descontos permitidos, o superávit cheio de 3,1%), o Banco Central poderá ter de manter os juros elevados mais tempo para manter a inflação dentro da meta:
- O objetivo deste ano será trazer a inflação para o centro da meta ou para algo muito próximo disso. O problema é que existe muita gente cética quanto à capacidade do governo de reduzir seus gastos no tamanho necessário.
Para Leal, do ABC Brasil, além de cortar despesas na carne, o governo terá de evitar operações como a capitalização do BNDES, que, embora não gere uma despesa primária, influencia a atividade econômica, porque permite ao banco de fomento elevar o volume de empréstimos ao setor produtivo:
- Isso não entra no Orçamento, mas afeta a inflação. Terá que ser levado em consideração pelo BC na hora de decidir a trajetória da Selic.
Os economistas lembram que o câmbio, que dá uma ajuda extra na hora de controlar os preços (pois a queda do dólar estimula a competição no mercado interno por meio de mais importações), continuará nesse caminho em 2011. O único problema será se houver uma guinada no mercado internacional que faça o dólar disparar, dificultando o papel da política monetária.
- Mas não vejo isso ocorrendo no horizonte - diz Telles.
- Os gastos a mais do governo influenciam, sobretudo, os preços dos bens não comercializáveis (itens que não podem ser exportados ou importados), pois os outros bens acabam se equilibrando em função das importações - explica Freitas.
Preocupada com as pressões inflacionárias dos gastos cada vez maiores do governo, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) propôs ontem um corte de R$40 bilhões no Orçamento da União de 2011, aprovado pelo Congresso Nacional. Para cumprir a meta de superávit de R$117 bilhões em 2001 (3,1% do PIB), a União precisa enxugar o atual Orçamento em pelo menos R$32 bilhões.
A CNI adverte em nota técnica que gastar menos é um fator decisivo para o governo controlar a inflação sem precisar elevar a taxa de juros a médio prazo. "A política fiscal expansionista dos últimos anos precisa ser revista. Caso esse caráter não seja alterado, o esforço da política monetária para conter um excesso de demanda que pressione a inflação será maior e irá comprometer o crescimento da economia".
A entidade ressaltou que "depois da política de expansão fiscal necessária para combater os efeitos da crise internacional (no fim de 2008 e ao longo de 2009), o momento é de reduzir o ritmo de crescimento dos gastos públicos para adequá-los ao crescimento da economia".
Pela quinta semana seguida, o mercado piorou suas projeções para a inflação de 2011 e reforçou a expectativa de que o Comitê de Política Monetária (Copom) voltará a subir a Selic - hoje em 10,75% ao ano -- na semana que vem. Segundo a pesquisa Focus do Banco Central (BC) divulgada ontem, a primeira de 2011, os economistas calculam que o IPCA fechará 2011 a 5,34%, acima dos 5,32% vistos na semana anterior, e ainda mais longe do centro da meta oficial do governo, de 4,5%.
A pesquisa Focus mostrou ainda que o mercado continua, pela sexta semana seguida, enxergando que a Selic terminará 2011 em 12,25%, sendo que o movimento de alta teria início na próxima semana, com a primeira reunião do Copom sob a batuta do novo presidente do BC, Alexandre Tombini. As contas são que a autoridade monetária elevará a taxa básica de juros em meio ponto percentual agora.
Colaborou: Patrícia Duarte
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