O Palácio do Planalto e o PT acharam prudente dar um tempo antes de se manifestarem oficialmente, mas se decidirem vir a público para definir uma posição a respeito da entrevista concedida a Eliane Catanhêde e publicada no domingo pelo Estado em que Marta Suplicy diz o que pensa sobre ambos, dificilmente terão algo novo a dizer, uma vez que a senadora paulista, não obstante a importância política de seu depoimento, também não revelou nenhuma grande novidade. As críticas que fez ao PT são, em síntese, exatamente as mesmas que têm sido colocadas pelo contingente cada vez maior de ex-petistas desiludidos: obcecado pelo poder, o PT traiu suas origens.
Assim, a entrevista da ex-prefeita de São Paulo e ex-ministra da Cultura, menos por suas revelações, mas pela relevância política de quem as faz, traz uma contribuição importante para o debate no momento em que o futuro do governo Dilma Rousseff e de seu partido ganha destaque na agenda política.
Marta Suplicy é categórica em seu diagnóstico: “Ou o PT muda, ou acaba”. O sintoma mais evidente da deterioração do projeto político original do partido, para a senadora, são os “desmandos” que têm cometido o governo e os responsáveis pelo comando da legenda: “Cada vez que abro um jornal, fico mais estarrecida com os desmandos do que no dia anterior. É esse o partido que ajudei a criar e fundar? Hoje, é um partido que sinto que não tenho mais nada a ver com suas estruturas. É um partido cada vez mais isolado, que luta pela manutenção no poder”.
A ex-prefeita, que foi uma das principais articuladoras do movimento “Volta, Lula”, que propunha a candidatura do ex-presidente à sucessão de Dilma já em 2014, confirma na entrevista que, embora Lula estivesse muito insatisfeito com o desempenho e o comportamento de sua criatura – “Estou conversando com ela, mas não adianta, ela não ouve” – e por isso tivesse realmente cogitado substituí-la como candidato, jamais admitiu publicamente essa hipótese e acabou chegando à conclusão de que não deveria entrar na disputa: “Ele é um grande estadista, mas não quis enfrentar Dilma. Pode ser da personalidade dele não ir para um enfrentamento direto, ou porque achou que geraria uma tal disputa que os dois iriam perder”. Percebe-se a preocupação de Marta de poupar Lula, embora não consiga disfarçar a frustração por ter sido preterida por ele, em benefício, respectivamente, de Fernando Haddad e de Alexandre Padilha, nas escolhas para os candidatos do PT a prefeito da capital e a governador, em 2012 e 2014.
Apesar das acusações de Marta ao governo Dilma em geral e em particular ao novo ministro da Cultura, Juca Ferreira, e ao presidente do PT, Rui Falcão, é provável que o Palácio do Planalto prefira não se manifestar. Num primeiro momento as lideranças do PT adiaram uma possível declaração oficial sob a alegação de que precisavam, antes, “consultar Lula”.
Militantes do PT, no entanto, adiantaram-se na tentativa de desqualificar a ex-ministra e suas opiniões, apelando ao argumento de que ela estaria agindo movida por “mágoa” ou por cálculo, neste caso porque estaria disposta a deixar o PT para concorrer à sucessão de Fernando Haddad no ano que vem. Declaração do deputado federal Vicente Cândido (SP), além de contrariar os fatos, dá o tom com que os petistas pretendem tratar a questão: “Eu lamento. A Marta teve todas as portas abertas no PT e sempre galgou os cargos que almejou”.
Por sua vez, o vice-presidente petista Alberto Cantalice, aquele que divulgou no site do partido uma “lista negra” de jornalistas que acusou de “maldizer os pobres”, queixou-se do óbvio: “É uma entrevista muito ruim para o partido. Essas vaidades, colocando interesses pessoais acima do partido, prejudicam muito. A militância vê isso com muito maus olhos”.
Outro vice-presidente do PT, José Guimarães, preferiu fazer um ataque direto à senadora de seu partido, recorrendo ao expediente lulista de lançar acusações ao vento: “Ninguém do PT tem o direito de ser instrumento de manipulação de quem quer que seja”. O PT, de fato, precisa mudar. E muito.
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