Fecha o cerco a Pimentel
• Alvo de operação da PF, governador é suspeito de corrupção por ter despesas pagas por empresário
Jailton de Carvalho, Catarina Alencastro e Gabriela Valente - O Globo
Escândalos em série
BRASÍLIA - A Polícia Federal deflagrou ontem operação em que investiga o governador de Minas Gerais, Fernando Pimentel (PT), pela prática de possíveis atos de corrupção e lavagem de dinheiro e por participação em organização criminosa supostamente chefiada pelo empresário Benedito Oliveira. Ao mencionar os indícios de corrupção, um documento da PF diz que o empresário pagou despesas com transporte e hospedagem do governador e da mulher dele, Carolina Oliveira, no Kiaroa Resort, em Maraú, na Bahia, entre 15 e 17 de novembro de 2013, quando Pimentel era ministro do Desenvolvimento.
Carolina também é investigada por receber pagamentos de empresas que obtiveram recursos do BNDES na época em que ela trabalhava como assessora do banco e Pimentel era ministro do Desenvolvimento. O BNDES é subordinado ao ministério.
A PF formulou a acusação contra o governador em relatório apresentado na chamada Operação Acrônimo 2 ao ministro Herman Benjamin, relator do inquérito sobre o assunto no Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Benjamim considerou parte das acusações consistentes e autorizou a PF a fazer ontem busca e apreensão de documentos em Brasília, Belo Horizonte, Rio e São Paulo. Entre os locais visitados pelos policiais estão um escritório em Belo Horizonte usado por Pimentel na campanha eleitoral e outros endereços de empresas que fizeram negócios com Carolina nos últimos anos. Mas o ministro não autorizou a busca e apreensão no Palácio da Liberdade e nas residências de Pimentel, a oficial e a particular.
Empresas investigadas
Na lista de empresas objeto de busca estão a Pepper Comunicação Interativa, agência que prestou serviços a campanhas do PT ano passado (inclusive à campanha da presidente Dilma Rousseff nas redes sociais), e continua prestando serviços ao partido. Também foram feitas apreensões na empresa MR Consultoria, do jornalista Mário Rosa, e em endereços de Otílio Prado, ex-auxiliar do governador de Minas.
Segundo a polícia, Benedito Oliveira pagou R$ 12.127,50 pela hospedagem do então ministro e da mulher no resort, por intermédio de Pedro Augusto Medeiros, também acusado de movimentar parte do dinheiro do empresário. A partir da análise de uma troca de mensagens encontradas num dos celulares do empresário, a PF sustenta ainda que Carolina viajou ao resort num avião com despesas bancadas pelo empresário.
"Diante das convergências supracitadas, é provável que Benedito tenha pago a hospedagem e a viagem em avião particular para o então ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Damata Pimentel", diz relatório. No documento, a polícia aponta mais três outros casos que colocariam sob suspeita as relações do governador e da mulher com o grupo de Benedito Oliveira. Entre as situações destacadas estão o subfaturamento de notas fiscais relativas a serviços que a Gráfica Brasil, de Oliveira, prestou para a campanha que resultou na eleição ao governo de Minas, ano passado.
Uma das notas fiscais emitidas pela Gráfica Brasil aponta a produção de 250 mil santinhos para a campanha de Pimentel. Mas as ordens de serviço apontaram a produção de 2,5 milhões de santinhos, ou seja, um número dez vezes maior que o registrado na contabilidade formal. A polícia encontrou disparidades também nos custos de produção dos santinhos. "Enquanto na parte esquerda da tabela constata-se o valor de produção de todos os materiais em R$ 781.183,45, na nota fiscal o valor de emissão é de apenas R$ 88.735,00", diz o relatório.
O subfaturamento teria como objetivo evitar que o então candidato a governador pelo PT estourasse os limites de gastos fixados pela Justiça Eleitoral.
O documento lembra ainda que a contas da campanha de Pimentel estão sendo questionadas no Tribunal Superior Eleitoral (TSE). A polícia também levanta suspeita sobre pagamentos da Marfrig Global Food, do Groupe Casino, da Pepper e da MR Consultoria para a Oli Comunicação, empresa de Carolina.
A Marfrig e o Casino têm interesses junto ao BNDES, banco de desenvolvimento vinculado ao Ministério do Desenvolvimento. Parte dos pagamentos foram feitos num período em que Pimentel estava à frente do ministério e Carolina atuava como assessora do BNDES. A PF suspeita que os repasses tenham ligação com o interesse das empresas por financiamentos do BNDES.
A Marfrig desembolsou R$ 595 mil para a Oli Comunicação entre novembro de 2011 e abril de 2012. O Groupe Casino pagou R$ 362.868,20 para a empresa de Carolina entre abril e julho de 2012. "É razoável inferir-se que pode ter havido simulação de contratação da Oli Comunicação pelo Groupe Casino e pelo Marfrig Global Foods, a fim de repassar valores que, em última análise, poderiam ter como destinatário o então ministro de Estado titular do MDIC", diz o relatório.
Sócia oculta da Pepper
No texto, a PF menciona 11 notas fiscais de serviços de consultoria que a Oli teria prestado à Pepper, mas sem deixar claro qual o montante recebido por Carolina. A polícia suspeita que Carolina seria uma espécie de sócia oculta da Pepper. No documento, a PF destaca ainda que a Oli recebeu R$ 2,4 milhões da MR Consultoria entre 2012 e 2014, "o que configuraria, em média, pagamentos da ordem de R$ 800 mil por ano".
A PF argumenta que a Oli tinha registro de apenas um único funcionário, e que a MR também é empresa de pequeno porte. No relatório, a PF sustenta que Mário Rosa, dono da MR, é sócio de Benedito Oliveira na Roi Participações. A partir daí, conclui que Mário Rosa "simulou a contratação de consultoria da Oli" para "escamotear a origem/movimentação/propriedade dos valores envolvidos".
O ministro Herman Benjamin considerou "consistentes os indícios de materialidade e de autoria até agora coligidos" pela PF, e determinou o aprofundamento das investigações. Além das buscas no palácio e na casa de Pimentel, a PF também pediu autorização para apreender documentos na sede do PT, do BNDES e da BR Distribuidora, que pagou despesas de Benedito no resort usado por Pimentel. Mas os pedidos foram rejeitados.
"É de se notar que a realização de busca em sede de partido político por autoridades policiais é medida de extrema gravidade no regime democrático, devendo estar plenamente justificada em elementos concretos, considerando-se, sobretudo, que o pluralismo politico é um dos fundamentos do Estado brasileiro", afirmou o ministro. Benjamin disse ainda que os fatos apontados pela PF são referentes ao período anterior à chegada de Pimentel ao governo. Por isso, não havia necessidade de busca no palácio.
Queixa de arbitrariedade
Para o governo de Minas, a atuação da PF "é a extensão da arbitrariedade cometida anteriormente (na Operação Acrônimo I)". "Com base somente em ilações e deduções fantasiosas, essa investigação prossegue eivada de irregularidades, tanto que os pedidos para a realização de busca e apreensão nas sedes do governo de Minas Gerais, na residência oficial e na residência particular do governador, e ainda em relação a sua esposa, foram negados pelo ministro", diz a nota.
O presidente do PT, Rui Falcão, disse que a investigação sobre a agência Pepper não tem relação com o partido.
- Ela (Pepper) presta serviço para nós. O que ocorreu lá a empresa tem que se manifestar. Não tenho detalhes. Não creio que isso envolva qualquer tipo de relação da Pepper com o PT - disse Falcão.
Mário Rosa confirmou que contratou Carolina entre 2012 e 2014. Disse que o contrato para prestação de serviço jornalístico não envolvia recursos públicos.
- Questionamentos são razoáveis considerando que trabalho num ambiente de gestão de crise. Mas não recebi dinheiro público nem federal, nem estadual, nem municipal.
O advogado Melillo Dinis, da Pepper, disse que a empresa não cometeu irregularidade. Ele nega ainda que a Pepper tenha sociedade com a Oli Comunicação ou com Carolina, como acusa a PF.
- A Pepper não tem e nunca teve qualquer relação societária com a Oli Comunicação ou com Carolina - disse. (Colaborou André de Souza)
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