Por Raymundo Costa – Valor Econômico
BRASÍLIA - A relação entre a presidente Dilma Rousseff e o vice-presidente Michel Temer entrou em 2016 como terminou em 2015, muito mal, apesar de os dois estarem com seus mandatos mais ameaçados na Justiça Eleitoral do que estavam ano passado. O vice continua na geladeira do Palácio do Planalto, mas também não tem interesse numa reaproximação e atribui as especulações nesse sentido a mais um lance de "marquetagem" palaciana.
A ameaça aos mandatos de Dilma e Temer é um pedido de impugnação da chapa feito pelo PSDB ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Por isso, o PMDB agora avalia que Temer pode vir a ser beneficiado, se a Câmara correr com o processo de impeachment, que ganhou uma nova força após a prisão do publicitário e jornalista João Santana, o responsável pelas campanhas eleitorais do PT.
Em vez de se reaproximar, a intenção do vice, segundo aliados, é descolar-se ainda mais da presidente, inclusive na defesa no TSE. De acordo com pemedebistas, muito embora a prestação de contas da chapa tenha sido única, os sistemas de arrecadação na campanha de 2014 foram separados e Santana respondia única e exclusivamente ao PT e à campanha à reeleição da presidente.
Para mostrar que Temer teve uma participação secundária na campanha, o PMDB fez um levantamento do tempo reservado ao candidato a vice na televisão: duas aparições de 30 segundos cada, em 2014. Na primeira eleição de Dilma, em 2010, a figuração de Temer se resumiu a uma aparição de 30 segundos.
Se novas provas da Lava-Jato forem incorporadas ao processo do TSE, como pediu o PSDB, o vice já tem a defesa pronta: João Santana era marqueteiro, consultor e conselheiro da presidente Dilma. Não havia relação entre o publicitário e a campanha do vice. "Não há contaminação da campanha de Temer", diz um dirigente do PMDB.
Na avaliação dos aliados do vice, não existe a menor possibilidade de o processo de impugnação da chapa no TSE ser concluído ainda este ano. Além do exame das novas provas eventualmente incorporadas ao processo, se perder na Justiça Eleitoral a presidente Dilma ainda poderá recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF), o que deve estender a conclusão do processo para o fim de 2016 ou início de 2017.
Com a possibilidade de Temer perder o mandato de vice junto com Dilma no julgamento do TSE, o PMDB e setores da oposição avaliam que o pedido de impeachment em tramitação na Câmara pode ser viabilizado. Se Dilma for impedida, a expectativa é que Temer teria condições de formar uma coalizão política para completar o mandato da presidente e fazer os ajustes necessários na economia. Com a política pacificada, o TSE poderia arquivar o pedido do PSDB.
Mas essa é uma solução que também não tem um prazo definido à vista. Nas contas feitas no Palácio do Planalto, o STF somente deve publicar o acordão da sua decisão sobre o processamento do impeachment entre abril e maio, o que levaria a Câmara a somente instalar a comissão especial já próximo do meio do ano. A favor de uma decisão da Câmara sobre o afastamento da presidente pesa o fato de que, se Dilma e Temer forem impugnados no TSE, assume a Presidência da República o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Se a impugnação ocorrer ainda neste ano, antes de completado a metade do mandato de Dilma, Cunha teria de convocar novas eleições num prazo de 90 dias. Mas se a decisão definitiva sair só em 2017, como é previsto, e ela for pela impugnação da chapa, o Congresso poderá eleger indiretamente alguém para completar o mandato de Dilma - neste caso, poderia ser o próprio Cunha ou o presidente do Senado, Renan Calheiros, ambos envolvidos na Lava-Jato. Essa é uma saída condenada por todos os partidos políticos.
No momento em que o impeachment volta à pauta, o programa partidário que o PMDB exibirá na TV, esta noite, critica indiretamente a presidente Dilma Rousseff pela condução do país na crise. Sem mencionar o nome da presidente, o programa afirma que falta uma "direção firme" para tirar o país da crise, enquanto "desanda" a economia.
"Estamos vivendo dias muito difíceis, principalmente em função dos nossos próprios erros", diz o vice Temer, que é presidente nacional do PMDB. "Não há outra saída a não ser a de sentarmos à mesma mesa e mostrarmos que temos uma democracia consolidada, que somos éticos, competentes e confiáveis". Temer gravou sua participação na última terça-feira, depois que já era conhecida a ordem de prisão do publicitário João Santana. Mas a maior parte do programa, que apresenta a manifestação de 47 parlamentares, estava pronta desde o fim de semana passado. "O Brasil precisa de pacificação e consenso. E é pra já!", diz o vice.
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