quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Jarbas de Holanda: Lava-Jato e economia empurram crise política para novo patamar

1) A amplitude da operação Acarajé, pondo em xeque a campanha reeleitoral de Dilma Rousseff, e a conversão do ex-presidente Lula de testemunha em investigado em processos do Ministério Público, bem como de específicos da Lava-Jato, anularam quase por completo as expectativas do Palácio do Planalto e da cúpula do lulopetismo, alimentadas até a última sexta-feira, de três mudanças que teriam peso relevante nos cenários político, econômico e institucional de fevereiro em diante. Mudanças que podem ser assim resumidas: reversão da incerteza sobre a continuidade do mandato presidencial, com a eleição dias antes do líder do PMDB na Câmara, que inviabilizariam de vez o processo de impeachment; ganhos de credibilidade junto aos investidores internos e externos, com as propostas, a rigor promessas, da busca de reequilíbrio das contas públicas, feitas pelo novo ministro da Fazenda, Nelson Barbosa; e o esvaziamento das investigações do Ministério Público de São Paulo sobre as vexaminosas relações entre Lula, a esposa e o luxuoso triplex do Guarujá, suspensas na sexta pela manhã, por liminar conseguida por um deputado petista.

2) Mas essas expectativas frustraram-se, no essencial, no início da segunda-feira, anteontem, com a ordem de prisão do publicitário João Santana, marqueteiro das principais campanhas do PT, inclusive da última para a reeleição de Dilma (além disso, uma espécie de ministro sem pasta e conselheiro especial da presidente). Prisão decretada com base em fortes indícios, para as autoridades judiciais e da Polícia Federal, do uso de vultosos recursos provenientes de propinas do petrolão para pagamento de serviços dele em contas secretas no exterior durante esta campanha. Expediente semelhante ao confessado pelo marqueteiro do então presidente Lula na fase do mensalão, Duda Mendonça. Quanto às promessas do ministro da Fazenda de medidas, futuras, para ajuste fiscal, os analistas e diversas lideranças do mercado logo as contrapuseram aos objetivos, imediatos, do Executivo: aumento da carga tributária com a recriação da CPMF e a adoção de uma banda fiscal que, descontando receitas não realizadas, possa legalizar a troca do superávit de 0,5% do PIB estabelecido no orçamento deste ano por um terceiro déficit primário consecutivo em 2016 já admitido de quase 1%, junto com mais uma taxa de forte contração da economia, já projetada para repetir a deste ano – em torno de -4%. A avaliação externa negativa é bem resumida pela agência Moody’s ao justificar a decisão anunciada hoje de rebaixamento da nota de crédito do país: “a perspectiva de deterioração adicional dos indicadores da dívida do Brasil em um ambiente de baixo crescimento”. E a essas duas frustrações seguiu-se uma terceira: ao invés do bloqueio das investigações do Ministério Público de São Paulo sobre o triplex do Guarujá, com o esperado cancelamento, em seguida, o Conselho Nacional da instituição decidiu ontem, por unanimidade, que elas sejam mantidas e sob o comando do mesmo promotor, Cássio Conserino. Tudo isso tendo como pano de fundo a piora progressiva da situação da economia, com aumento do desemprego, persistência da inflação nos dois dígitos, queda generalizada do consumo, expansão da inadimplência. E com um horizonte de sequência do processo recessivo e seus efeitos sociais em 2017.

3) Para concluir, cabe antecipar possíveis repercussões políticas e institucionais do impacto dos novos desdobramentos das investigações sobre corrupção, desenvolvidas com o pano de fundo acima resumido. De pronto, ele reforça as ações judiciais do PSDB (respaldadas por outros partidos de oposição) em julgamento no TSE que denunciam a prática de crimes eleitorais no financiamento da campanha da chapa governista da titular Dilma e do vice Michel Temer, na disputa presidencial de 2014. Ações que, com as denúncias originais robustecidas por novos dados das investigações da Lava-Jato, podem levar à cassação da chapa. Simultaneamente configura-se um reaquecimento da demanda pelo impeachment da presidente, com provável retomada de grandes manifestações de rua a partir da que está em preparo para o próximo dia 13 de março. E com um ingrediente político-partidário surpreendente: o readensamento da tendência pró-impeachment no PMDB, inclusive por alas mais próximas do presidente Temer após sua reeleição no início de março, como alternativa a uma troca de governo por meio de cassação também do vice por decisão do TSE.

4) E a soma de tal impacto com o agravamento do processo recessivo e de seus efeitos econômicos e sociais abrirá espaço a dois outros expressivos e contraditórios atores no cenário à frente. Primeiro – a mobilização do empresariado que, por causa da forte paralisia econômica e das projeções de longa extensão disso, será viabilizável por suas lideranças para pressionar por uma troca de governo, apoiando o impeachment e/ou a cassação, mas preferindo o caminho menos traumático de uma renúncia. E o segundo – o próprio Lula, por mais improvável que pareça hoje, através de uma recomendação desse caminho, diante de falta de respostas “populares” às crises que sacodem o país e dos seus desastrosos efeitos políticos num ano eleitoral como este. Como tentativa de contenção e reversão do enorme desgaste do PT e dele mesmo, articulada com os chamados movimentos sociais e começando com uma radical contraposição a um novo governo.

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Jarbas de Holanda é jornalista

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