• Recesso chega em boa hora para o Palácio do Planalto
-Valor Econômico
A eleição do novo presidente da Câmara dos Deputados foi comemorada no Palácio do Planalto não apenas por ter como desfecho a vitória de Rodrigo Maia (DEM-RJ), um deputado nada hostil ao atual governo. O episódio representou o primeiro embate político do presidente interino Michel Temer contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e a presidente afastada Dilma Rousseff, do qual o pemedebista sabia que não poderia sair derrotado.
O eventual sucesso da candidatura do ex-ministro da Saúde Marcelo Castro, que votou contra o afastamento da antiga chefe contrariando os interesses de seu próprio partido, seria visto como uma fragilidade do Planalto. Era tudo o que Temer precisava evitar, num momento em que prepara uma agenda internacional a ser realizada em setembro, após a conclusão do processo de impeachment no Senado, e realiza um esforço de comunicação para tornar-se mais conhecido pela população e amplificar a divulgação das iniciativas de sua gestão.
O governo fez o que pôde para evitar que Castro passasse para o segundo turno do pleito. E conseguiu diminuir o apoio ao ex-auxiliar de Dilma a modestos 70 votos. Passada essa fase, porém, Temer investirá mais tempo e capital político para apaziguar sua base de sustentação na Câmara e promover a aproximação entre o seu governo e senadores que ainda não demonstram convicção na condenação definitiva da petista.
Para o Planalto, o recesso parlamentar chegou em boa hora. Abriu uma brecha para o governo gerar fatos positivos, como o anúncio de medidas pontuais voltadas a estimular a atividade econômica, sem o risco de o Congresso lhe criar novos embaraços. Afinal, apesar das promessas de líderes de diversos partidos de que a ressaca da disputa na Câmara não será capaz de corroer a unidade da base aliada, os radares do Palácio do Planalto estão voltados a identificar se a insatisfação do Centrão com o resultado da eleição pode se transformar em risco de derrota no plenário.
O intervalo nos trabalhos do Congresso também deve garantir a Temer mais tempo para fazer novos gestos a senadores, à medida em que o desfecho do processo de impeachment de Dilma se aproxima. Um dos alvos prioritários é o senador Wellington Fagundes (PR-MT), que nos últimos dias foi ao Palácio do Jaburu conversar com Temer a respeito do seu relatório sobre a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e em seguida foi um dos convidados de honra em uma audiência entre o presidente interino e representantes dos prefeitos de todo o país, no Palácio do Planalto. Os senadores Benedito de Lira (PP-AL) e Cristovam Buarque (PPS-DF) também têm recebido atenção especial do Executivo.
Temer não pede de forma explícita votos para afastar de vez Dilma da Presidência da República. Faz gestos políticos que tornem viáveis as suas aspirações. Não por acaso pretende reunir-se em breve com os chefes dos demais Poderes.
Em paralelo, o presidente interino passou a trabalhar numa tentativa de popularizar sua imagem. Temer passou a gravar pequenos vídeos e divulgá-los nas redes sociais, abordando assuntos como o reajuste do Bolsa Família e o financiamento estudantil. De forma coloquial e sem paletó, apresenta-se e diz estar falando diretamente do Palácio do Planalto. Sua intenção é atingir as camadas mais pobres da população e o Nordeste, segmentos do eleitorado nos quais Lula e o PT continuam a demonstrar força.
Esses acenos para o público doméstico antecedem a estreia que Temer planeja ter no exterior, depois de efetivado no cargo. Além do discurso inaugural da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova York, o Palácio do Planalto prepara para o pemedebista viagens presidenciais à China e ao México. A intenção é apresentar uma normalidade institucional e estabilidade política que Dilma já não conseguia mais mostrar quando falava a líderes e investidores internacionais.
Nas análises feitas a interlocutores, Temer diz acreditar que a cada 30 anos, aproximadamente, a democracia brasileira passa por crises. A atual seria deixada para trás com a conclusão do processo de impeachment e os acordos políticos que elegeram Maia presidente da Câmara e criaram as condições para o Palácio do Planalto fechar uma aliança programática com parte expressiva da coalizão governista.
O discurso de Temer no exterior terá como objetivo atrair investimentos e criar as condições para a reativação da economia. À frente de uma comitiva de empresários e acompanhado do ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, ele planeja destacar o perfil de sua equipe econômica e os compromissos de seu governo na área fiscal e na profissionalização das empresas estatais - berço das irregularidades que ajudaram a minar a imagem do Brasil entre os investidores estrangeiros.
A Lei de Responsabilidade das Estatais, que o presidente interino sancionou no fim do mês passado e pelo menos em teoria contém mais filtros para as indicações a cargos de direção de empresas públicas por partidos políticos, é vista como um trunfo do pemedebista para a negociação com aliados. No entanto, os parlamentares voltam do recesso parlamentar já no início de agosto. E o governo não demorou a sinalizar que acelerará as nomeações para cargos estratégicos na máquina pública federal.
O esforço de Temer de recuperar a imagem do país pode ruir se os novos nomeados logo protagonizarem escândalos de corrupção. Caso isso ocorra, a sensação de autoridades que acompanham a Lava-Jato poderá se tornar realidade e a Lei de Responsabilidade das Estatais será vista apenas como uma tentativa do Parlamento em criar um álibi capaz de inocentar os agentes políticos responsáveis pela distribuição de cargos. Não custa lembrar que alguns dos ex-dirigentes da Petrobras investigados, processados e condenados eram funcionários de carreira e por diversas vezes foram apresentados por partidos políticos como indicações técnicas.
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