O isolamento de Bolsonaro – Editorial | O Estado de S. Paulo
Seus recuos ou acenos ao diálogo são apenas táticos, para manter a esperança de que a institucionalidade prevalecerá, enquanto o bolsonarismo trabalha para miná-la
O presidente da República, Jair Bolsonaro, escolheu isolar-se dentro de seu próprio governo. Multiplicam-se os relatos de que Bolsonaro já não dá ouvidos nem mesmo a alguns de seus principais ministros, inclusive em questões de alta complexidade e que demandam o parecer de especialistas. O desencontro entre o discurso irresponsável do presidente em relação à epidemia de covid-19 e as recomendações de cautela por parte do Ministério da Saúde foi apenas o mais recente exemplo do distanciamento de Bolsonaro daqueles que trabalham para auxiliá-lo neste momento dramático.
Em sua quarentena particular, optou deliberadamente por não mais levar em conta as opiniões daqueles cuja função é fornecer-lhe os dados da realidade e apontar soluções com base neles. Tem preferido prestar atenção em conselheiros que o atiçam contra tudo e todos que são considerados obstáculos a seu projeto de poder.
Assim, não foi acidental a participação do vereador Carlos Bolsonaro, filho de Jair Bolsonaro, em reuniões nas quais o presidente discutiu a epidemia de covid-19 com governadores de Estado. Sem qualquer expertise conhecida na área de epidemiologia ou na de administração de crises, Carlos Bolsonaro esteve presente na condição de coordenador do chamado “gabinete do ódio”, um grupo informal que assessora o presidente sobre estratégias nas redes sociais.
Enquanto o País se une e se mobiliza para encontrar maneiras de enfrentar e superar a epidemia, o presidente e seus filhos se empenham em criar conflitos, sempre com o objetivo de auferir lucros eleitorais. Desde que tomou posse, Bolsonaro já se indispôs diversas vezes com os demais Poderes e com a imprensa. O alvo atual são os governadores, a quem Bolsonaro criticou duramente em cadeia nacional de rádio e TV depois de se consultar com o “gabinete do ódio”, atitude que estarreceu até mesmo alguns de seus ministros e assessores.
Com isso, Bolsonaro transformou um gravíssimo problema econômico e de saúde pública – a epidemia de covid-19 – em palanque próprio para demagogia. Ao se queixar do isolamento compulsório e dos efeitos econômicos da quarentena imposta pelos governos estaduais e municipais, minimizando a epidemia, Bolsonaro apresenta-se como porta-voz de milhões de brasileiros aflitos com sua queda de renda e com a interrupção de negócios – embora seu governo tenha tomado até agora poucas e tímidas medidas para mitigar o desastre econômico.
Sem qualquer escrúpulo, explora essa angústia com objetivos políticos, jogando a crise econômica na conta dos governadores – que apenas estão fazendo o que precisa ser feito para poupar vidas. E, no cúmulo da desfaçatez, ainda o faz de maneira cínica: em postagem no Twitter, acusou os governadores de “fazer demagogia diante de uma população assustada” em vez de “falar a verdade”. E continuou: “Aproveitar-se do medo das pessoas para fazer politicagem num momento como esse é coisa de covarde!”.
Nas redes sociais, os bolsonaristas, encabeçados por outros dois filhos do presidente, Eduardo e Flávio Bolsonaro, trataram de espalhar textos e vídeos – falsos ou fora de contexto – que embasam seus questionamentos acerca das medidas restritivas dos governadores contra a epidemia. O site do ex-astrólogo Olavo de Carvalho, cujos seguidores formam o “gabinete do ódio” no Palácio do Planalto, acusou os governadores de, “na surdina”, se “aliarem à China contra Bolsonaro”. O próprio Olavo de Carvalho chegou a postar um vídeo em que diz que a epidemia de covid-19 “simplesmente não existe”, sendo “a mais vasta manipulação de opinião pública que já aconteceu na história humana”.
É esse tipo de opinião que tem orientado o presidente Bolsonaro em suas atitudes e pronunciamentos nos últimos dias. Seus recuos ou acenos ao diálogo são apenas táticos, para manter a esperança de que a institucionalidade prevalecerá, enquanto o bolsonarismo trabalha febrilmente para miná-la. Cada vez mais encerrado no “gabinete do ódio”, Bolsonaro não tem outra coisa a oferecer ao Brasil.
No zero, um enorme desafio –Editorial | O Estado de S. Paulo
Cálculo do BC inclui retração da indústria e do investimento em capacidade produtiva
Crescimento zero, a nova projeção do Banco Central (BC) para a economia brasileira, é uma estimativa mais otimista que as de várias instituições do mercado. Os estragos causados pelo surto de coronavírus deverão ser bem maiores, segundo economistas de bancos, financeiras e consultorias. A maior parte dos cálculos aponta perdas de produção na faixa de 1% a 2%, mas há cenários piores. O Banco Safra, por exemplo, reduziu de -0,3% para -2,8% o resultado previsto para 2020. Todos os cálculos, no entanto, são especialmente inseguros. É difícil dizer quando haverá condições para a normalização gradual dos negócios e da vida cotidiana – condições seguras, sem a precipitação defendida por gente irresponsável.
A prioridade é proteger a vida, como disseram os governadores em carta ao presidente Jair Bolsonaro, mas também é preciso, como lembraram, dar algum apoio econômico a empresas e famílias, especialmente às mais pobres. Governos de outros países têm avançado nessa direção. A iniciativa mais espetacular foi o pacote americano de US$ 2 trilhões. Bancos centrais também têm atuado com vigor nas maiores economias. No Brasil, o BC elaborou medidas com efeito potencial de R$ 1,2 trilhão no mercado de crédito, mas ainda falta um engajamento maior dos bancos privados.
Essas medidas foram lembradas pelo presidente do BC, Roberto Campos Neto, quando apresentou, ontem, o relatório trimestral de inflação com as novas projeções. O crescimento estimado para o Produto Interno Bruto (PIB) é praticamente o mesmo calculado no Ministério da Economia, de 0,02%. Em dezembro o BC apostava numa expansão de 2,2%.
Na maior parte dos setores o resultado será pior que em 2019, quando o PIB cresceu apenas 1,1%, menor taxa em três anos. As estimativas do BC incluem um tombo nos dois primeiros trimestres, com alguma reação na segunda metade do ano e resultado final nulo. As projeções para os primeiros três meses de 2020 já seriam afetadas, segundo o relatório, pelo desempenho abaixo do esperado no fim de 2019 e no começo deste ano.
A agropecuária se manterá, segundo os novos cálculos, como o setor mais saudável. Deve crescer 2,9%, taxa maior que a de 2019 (1,3%) e igual à projetada em dezembro. A indústria deve encolher 0,5%, tendo avançado só 0,5% no ano anterior. A queda será puxada pelo setor de transformação (-1,3%), com prejuízo para a estrutura econômica e nova perda para o emprego formal. Na média, os serviços terão crescimento zero, com o comércio interno recuando 0,7%. Com expansão de 2,4%, os serviços de informação devem ser o segmento com melhor desempenho.
Do lado da demanda, o consumo das famílias deve aumentar 0,8%, bem menos que no ano anterior (1,8%). O consumo do governo passará de -0,4% em 2019 para 0,2%, contribuindo para alguma sustentação da economia. O investimento em máquinas, equipamentos e construções deve diminuir 1,1%, comprometendo o vigor da retomada nos próximos anos. A exportação de bens e serviços deve passar de uma contração de 2,5% em 2019 para crescimento de 0,9%. Com avanço estimado em 0,6%, a importação deve aumentar menos que em 2019 (1,1%).
Apesar de algum crescimento, a importação de bens e serviços continuará muito moderada, segundo o BC, contribuindo para reduzir de 2,7% para 2,5% do PIB o déficit em transações correntes. Nos 12 meses até janeiro, esse déficit chegou a 2,91% do PIB, mesmo com baixa atividade e consumo fraco. Se a projeção do BC estiver correta, o governo poderá tocar as medidas de recuperação sem se preocupar muito com as contas externas. Não representarão risco próximo, apesar de suas más condições.
O governo deve esforçar-se para o Brasil fechar o ano com números melhores que os projetados. Respeitados economistas propõem ações excepcionais, como aquelas iniciadas em várias economias e defendidas pelo Fundo Monetário Internacional. Não se salvará a economia, contudo, afrouxando a prevenção sanitária e expondo milhões à contaminação e milhares à morte. Nenhum governo tem esse direito.
Proteção das atividades essenciais – Editorial | O Estado de S. Paulo
É louvável o esforço para que não sejam afetados os serviços e as atividades essenciais
No início de fevereiro, ainda não havia nenhum caso confirmado de infecção pelo novo coronavírus no País e, de forma diligente, o governo federal apresentou ao Congresso um projeto de lei dispondo sobre as “medidas para enfrentamento da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus”. De forma igualmente diligente, o Congresso aprovou poucos dias depois a proposta. Sancionada pelo presidente Jair Bolsonaro, a Lei 13.979/20 entrou em vigor no dia 7 de fevereiro.
A lei prevê algumas medidas drásticas que as autoridades poderão adotar, de acordo com suas competências, para fazer face à pandemia. Entre outras ações, o artigo 3.º elenca o isolamento, a quarentena, a realização compulsória de exames e a “restrição excepcional e temporária, conforme recomendação técnica e fundamentada da Anvisa, por rodovias, portos ou aeroportos de entrada e saída do País, e locomoção interestadual e intermunicipal”. Esse último trecho foi incluído pelo próprio presidente da República, por meio da Medida Provisória (MP) 926/20.
De forma prudente, a MP 926/20 estabeleceu que todas as medidas previstas na lei “deverão resguardar o exercício e o funcionamento de serviços públicos e atividades essenciais”. Não há como se combater a pandemia do novo coronavírus se os serviços públicos e as atividades essenciais param de funcionar. A MP 926/20 previu ainda que caberia ao presidente da República determinar, mediante decreto, quais serviços públicos e atividades são essenciais.
Em 20 de março, o presidente Jair Bolsonaro assinou o Decreto 10.282/20, regulamentando a Lei 13.979/20. Segundo o ato presidencial, “são serviços públicos e atividades essenciais aqueles indispensáveis ao atendimento das necessidades inadiáveis da comunidade, assim considerados aqueles que, se não atendidos, colocam em perigo a sobrevivência, a saúde ou a segurança da população”. Entre outros, o Decreto 10.282/20 lista os serviços médicos e hospitalares, a assistência social, as atividades de segurança, os serviços postais, o transporte de passageiros por táxi ou aplicativo, os serviços de telecomunicação e internet, o serviço de call center e a coleta e o tratamento de esgoto e lixo.
Na quarta-feira passada, o presidente Jair Bolsonaro editou um novo ato (Decreto 10.292/20), incluindo como essenciais serviços e atividades que não constavam do primeiro ato, tal como a fiscalização do trabalho. Outras atividades foram detalhadas com maior precisão. Por exemplo, o primeiro decreto referiu-se à “produção, distribuição e comercialização de combustíveis e derivados”. No novo ato, consta como atividades essenciais “produção de petróleo e produção, distribuição e comercialização de combustíveis, gás liquefeito de petróleo e demais derivados de petróleo”.
Causou perplexidade, é de reconhecer, a inclusão de “atividades religiosas de qualquer natureza” no elenco dos serviços essenciais, tendo em vista os riscos de aglomeração e contato físico que esse tipo de evento costuma acarretar. No entanto, o ato presidencial menciona expressamente uma condição para a realização das atividades religiosas: “Obedecidas as determinações do Ministério da Saúde”.
É louvável o esforço do Estado prevendo e especificando as medidas necessárias para o enfrentamento da pandemia do novo coronavírus, tais como isolamento e quarentena. Igualmente louvável é o esforço para que essas medidas não afetem os serviços públicos e as atividades essenciais, o que poderia deixar a população em situação ainda mais vulnerável. É preciso enfrentar essa crise com prudência, responsabilidade e um grande sentido prático. Nesse sentido, é de fundamental importância que a população receba, com clareza, as devidas orientações sobre o que deve ser feito e o que deve ser evitado. Ruídos na comunicação podem produzir ainda mais danos num cenário já repleto de incertezas e prejuízos. Como lembra o primeiro artigo da Lei 13.979/20: “As medidas estabelecidas nesta lei objetivam a proteção da coletividade”. Tudo deve estar orientado para atender a essa finalidade.
Está atrasado o apoio aos mais atingidos pela crise – Editorial | O Globo
Há pequenas firmas, trabalhadores informais e milhões que sequer estão nos programas de assistência
A sucessão de pacotes que vêm sendo baixados no mundo para se contrapor aos efeitos econômicos e sociais da paralisação das economias provocada pela pandemia do novo coronavírus confirma o atraso do Brasil em reagir. A China já demonstrara que o melhor antídoto era o isolamento social, para impedir que o vírus usasse a grande capacidade de se disseminar, e tinha razão. Mas a queda vertical do consumo, devido ao desaparecimento do consumidor das ruas, e o fechamento de fábricas, sem operários, fazem uma combinação com grande poder destrutivo.
Dar suporte às empresas, para que evitem demitir, e lançar ou reforçar redes de amparo social para os menos favorecidos são aspectos desses conjuntos de medidas que precisam ser contemplados pelas novas ações do governo brasileiro. Já foram anunciadas medidas para facilitar o crédito às empresas, antecipados pagamentos a aposentados e pensionistas, ações necessárias, mas muito aquém da dimensão das dificuldades que já estão aí.
A ampliação do Bolsa Família, para abranger mais 1,2 milhão de famílias, é um passo certo. Porém continua pouco. O que os países ricos têm feito ajuda a alertar Brasília para a gravidade da situação. Os Estados Unidos, donos da maior economia, estão aprovando no Congresso um pacote de US$ 2 trilhões para apoiar empresas e também a população. Mais que o PIB brasileiro. É a maior linha de ajuda da história americana. Como na crise de 2008/9, deverão ser compradas ações de empresas pelo Estado, para que não quebrem. Chama a atenção que estejam criando um programa para destinar cheques de US$ 1.200 a todo adulto com renda na faixa de classe média, com o adicional de US$ 500 por criança.
É porque uma característica desta crise é atingir de forma rápida o cidadão, ao baixar as portas de fábricas e do comércio. O grande desafio é fazer chegar a ajuda a ele.
O governo britânico anunciou que garantirá ao trabalhador autônomo 80% do que ele recebe por mês, até um determinado limite. Algo neste sentido terá de ser feito no Brasil, em outra dimensão. Pois a grande informalidade no país exige que o governo distribua dinheiro nesta grande parcela da população. O Ministério da Economia tinha um plano de destinar R$ 200 a cada um desta faixa social. Com acerto, o Congresso decidiu agir e ontem, quando a Câmara se preparava para aprovar um projeto de lei que estabelecia o pagamento de R$ 500, houve entendimento com o governo para ser R$ 600.
O governo terá de ser ágil na execução das propostas. É impossível que a máquina pública consiga fazer este trabalho. O economista Ricardo Paes de Barros, especialista em programas sociais, e que desenvolveu o Bolsa Família, propôs, em entrevista à GloboNews, que sejam mobilizadas instituições que atuam em comunidades e que conhecem esta população. Paes de Barros mencionou os “novos pobres”, que precisam ser alcançados. Pessoas invisíveis que não constam dos arquivos. Mas pessoas reais a serem amparadas.
Brasil precisa testar o maior número possível de pessoas – Editorial | O Globo
Para conter pandemia do novo coronavírus, OMS prega testes em massa, além do isolamento
No combate a uma epidemia grave e de amplitude poucas vezes vista, como a do novo coronavírus, é natural que protocolos e decisões de autoridades de saúde sejam revistos no curso da evolução da doença. Nesse sentido, é bem-vindo o recuo do governo em relação à testagem da população. De início, a ideia era focar apenas nos casos graves, que demandam internação, às vezes em UTI. Alegava-se falta de recursos. A postura, porém, contrariava orientação da Organização Mundial da Saúde (OMS), que recomenda que o diagnóstico seja massivo.
Nos últimos dias, o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, e equipe têm convergido para uma posição mais sensata, que é de fazer testes em massa, seguindo o modelo bem-sucedido da Coreia do Sul, um dos países que conseguiram conter a epidemia. No sábado passado, o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson de Oliveira, anunciou que o Brasil iria adquirir já nas semanas seguintes 5 milhões de testes para o diagnóstico da Covid-19, número que aumentaria gradualmente para 10 milhões. “O objetivo central dessa medida é que a própria OMS recomendou que se testasse para isolar. Ou seja, que fizéssemos muitos mais para identificar as pessoas doentes e afastá-las”, justificou. Outra notícia auspiciosa é que o Brasil pretende repetir a estratégia da Coreia do Sul de testar as pessoas em sistema de drive-thru, ou seja sem que elas saiam do carro, diminuindo os riscos de contágio.
Na terça-feira, o Ministério ampliou esse número para 22,9 milhões de testes. Uma parte é de testagem rápida e outra demanda alguns dias para se obter o resultado. Esses diagnósticos seriam feitos inicialmente em profissionais de saúde, agentes de segurança e nos casos graves. Estima-se que, no pico da epidemia, o Brasil precisará ampliar de 6,7 mil para 50 mil testes/dia.
A falta de recursos não poderia mesmo ser justificativa para não se seguir a recomendação da OMS, para quem a epidemia só pode ser contida com isolamento e testes em massa. O objetivo é detectar os doentes — muitos assintomáticos — e afastá-los do convívio social, impedindo que propaguem a doença. Sabe-se que esses testes custam caro, e a penúria da saúde pública é conhecida. Mas vive-se situação de guerra, em que todas as armas disponíveis devem ser usadas para salvar vidas.
Além disso, há maneiras de se contornar a falta de recursos, como as parcerias. A Vale, por exemplo, prometeu doar ao governo 5 milhões de testes. A Petrobras, 600 mil. A Fiocruz tem aumentado a produção de kits de diagnóstico. De fato, é hora de a sociedade se mobilizar. A responsabilidade por combater essa epidemia que aterroriza o mundo é de todos.
Pacote americano – Editorial | Folha de S. Paulo
Após hesitações de Trump, EUA adotarão megaplano de amparo a famílias e empresas
Avança, no Congresso dos Estados Unidos, um monumental pacote de gastos públicos no esforço da guerra, à falta de melhor expressão, contra a epidemia de Covid-19.
O texto final do plano ainda não é conhecido, mas trata-se de gastos ou oferta de gastos na casa dos US$ 2 trilhões —o equivalente a mais de 40% do gasto anual do governo federal dos EUA, ou cerca de 9% do Produto Interno Bruto da maior economia global.
O programa complementa a renda de americanos mais pobres, desempregados e sem renda. Serão transferidos US$ 1.200 para cada cidadão que recebe menos de US$ 75 mil por ano, o dobro para casais, mais US$ 500 por criança.
O plano eleva ainda o valor do seguro-desemprego em US$ 600 por semana, quase o dobro do salário mínimo nacional, o que provocou ameaça de obstrução por parte de senadores republicanos. O auxílio será concedido inclusive para trabalhadores em empregos precários. Para esses dois programas, haverá mais de US$ 500 bilhões.
Serão ofertados empréstimos para pequenas empresas, por meio de um fundo bancado pelo governo com mais de US$ 350 bilhões. Caso as beneficiadas não demitam pessoal, a dívida será perdoada.
Grandes empresas em dificuldades financeiras contarão com outro fundo, de cerca de US$ 500 bilhões, voltado especialmente para setores de início mais afetados pela crise do novo coronavírus, como o das companhias aéreas.
Haverá dinheiro para serviços de saúde (mais de US$ 100 bilhões), ventiladores respiratórios e outros equipamentos hospitalares, remédios e vigilância sanitária. Estados e cidades terão US$ 150 bilhões.
O programa, portanto, tenta proteger os empregos em pequenas empresas, oferece renda mínima para os mais pobres e a classe média, providencia crédito corporativo, verbas para a saúde e governos regionais.
Parcela significativa dos recursos será concedida a fundo perdido — em princípio, pouco mais da metade.
Ninguém se propõe a estimar se, mesmo gigantesca, tal ajuda será suficiente. Não se pode prever com exatidão a duração da crise e o efeito real da epidemia sobre os negócios e o mercado de trabalho.
No entanto a mera oferta de tamanha rede de auxílios vai de antemão diminuir os impactos humanos e econômicos da paralisia provocada pelas medidas sanitárias.
A redução do consumo será menor, assim como o pessimismo de famílias e investidores. Mais empresas sobreviverão à calamidade. Haverá mais recursos para a frente de batalha principal, na saúde.
Trata-se de alento que, dada a dimensão do PIB americano, tem repercussão mundial. Como outros líderes populistas, Donald Trump relutou em aceitar a necessidade de providências drásticas contra a pandemia, mas ainda que tardiamente rendeu-se à realidade.
É urgente lançar medidas de apoio à economia –Editorial | Valor Econômico
O Brasil pode estar às vésperas de uma aguda crise social, se as redes de amparo do Estado não forem acionadas logo
Os estímulos fiscais precisam ser acionados rapidamente diante dos evidentes sinais de paralisia da economia como efeito do combate à covid-19. A pressa é mais do que necessária, como atesta, por exemplo, os 3,3 milhões de pessoas que pediram auxílio desemprego nos Estados na semana passada, pouco tempo depois de terem iniciado quarentenas rigorosas no país. Nos países desenvolvidos, amplos pacotes de resgate da atividade econômica e de apoio a famílias e empresas foram lançados quase que simultanemente às medidas rígidas de isolamento. Em países mais pobres e com menor rede de proteção social, como o Brasil, essa urgência é ainda mais necessária.
O Banco Central reduziu ontem projeção do crescimento da economia para zero, em parte pelo efeito do menor crescimento da China, que retirará um ponto percentual do PIB brasileiro neste ano. A estimativa é preliminar e está repleta de incertezas, mas dificilmente o Brasil escapará de uma recessão se a economia ficar congelada por alguns meses. A crise se sucede a uma expansão medíocre, que legou quase 12 milhões de desempregados, mais milhões de desalentados, aos quais podem se juntar outros milhões de novos demitidos e autônomos que ficaram sem renda.
O Brasil pode estar às vésperas de uma aguda crise social, se as redes de amparo do Estado não forem lançadas tempestivamente. O principal obstáculo a uma resposta à altura, a situação fiscal do país, foi deixado de lado diante da magnitude do perigo que ronda a saúde e as finanças de pessoas e empresas. Tornou-se inescapável porque a pandemia forçou legalmente a interrupção dos negócios. As sugestões domésticas coincidem com as medidas que vem sendo tomada por países mais atingidos pela pandemia. As linhas de ação são mais ou menos comuns, mas se adaptam às peculiaridades da economia e ao estado das finanças públicas nacionais.
Um dos meios de socorro é a concessão de garantias públicas para empréstimos às empresas afetadas pela parada súbita das atividades. Os EUA terão US$ 500 bilhões para isso. O Reino Unido, junto com a associação de bancos, criou um Mecanismo de Interrupção de pagamento de empréstimos para apoiar com crédito em especial as pequenas e médias empresas. Algo parecido poderá ocorrer no Brasil. Os bancos privados, diante da crise, tendem a apertar as condições de empréstimos e aumentar os juros, o contrário do que se necessita. O Tesouro e o BC terão de arrumar meios, com apoio dos bancos públicos e privados, para diferir pagamentos que vencem e suprir com dinheiro novo necessidades urgentes de caixa, com prazos de carência compatíveis. Dois terços dos empregos são gerados pelas PMEs no país.
Medida correlata para apoiar empresas em geral é a do adiamento do pagamento de impostos, que o governo cogita por 3 meses. O diferimento do Simples e de 50% das taxas do Sistema S já foram acordados. É preciso mais e logo, porque as receitas estão em queda livre.
As ações de suporte ao emprego e à renda da população são vitais para a sobrevivência de muitas famílias e para sustentar de alguma forma o consumo. Dado o enorme contingente de informais, transferências diretas terão de ser feitas. Para os muito pobres, o Bolsa Família e o Cadastro Único servirão de referência e meio de acesso. Para os formais, é preciso um estímulo para manutenção do emprego.
O governo estuda então amparar quase toda a renda subtraída pela redução de jornada para os que ganham até três mínimos (algo como 60% da mão de obra formal). Já a transferência de renda para informais pretendida pelo governo é baixa, de R$ 200, e líderes no Congresso pensam em elevá-la para R$ 500.
O tamanho do pacote deve estar à altura da necessidade. A Austrália lançou um de 9,9% do PIB, a Franca, de 13%, os EUA, 10% e a Alemanha, de nada menos de 24% do PIB. No Brasil, está em 2,1% do PIB, nem todo ele de gastos fiscais, e alguns economistas mencionam carência de R$ 500 bilhões, algo como 7% do PIB, o que não é de modo algum descabido.
Alemanha e EUA têm algo a ensinar sobre a organização e gestão de recursos. Os alemães criaram um Fundo de Estabilização Econômica para isso. O populista Donald Trump não quis que ninguém vigiasse os US$ 500 bilhões para socorrer empresas, os democratas bateram o pé e um inspetor-geral e um painel do Congresso farão isso. No Brasil, Tesouro, BC e parlamentares poderiam integrar um fundo do tipo, que se encarregaria de recursos que virão na maior parte fora do Orçamento.
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