A crise econômica e social causada pela pandemia tem levado mais famílias a recorrer aos serviços públicos - e o Estado tem de dar uma resposta à altura
A pandemia de covid-19 tem imposto uma série de desafios na área da medicina, de forma especial para o Sistema Único de Saúde (SUS). Mas não é apenas em relação à saúde que o novo coronavírus acrescenta demandas para o poder público que, na maioria das vezes, tem dificuldades para atender satisfatoriamente a população mesmo em circunstâncias normais. A crise econômica e social causada pela pandemia tem levado mais famílias a recorrer aos serviços públicos – e o Estado tem de dar uma resposta à altura.
No mês de julho, por exemplo, houve aumento de 73% de pedidos de matrícula de crianças de 4 a 6 anos nas escolas municipais de São Paulo em relação ao mesmo período do ano passado. Em 2019, 981 crianças pediram vaga em julho; agora, 1,7 mil. Dos pedidos feitos neste ano, 400 ainda não foram atendidos.
Atípica para esse período do ano, a demanda por vagas na rede pública de educação infantil é uma consequência da migração de alunos de pré-escolas particulares. A corroborar esse diagnóstico, bairros com população de mais baixa renda – com menos crianças matriculadas na rede particular em tempos normais – tiveram menor aumento de pedidos de matrícula.
No mês passado, verificou-se também aumento dos pedidos de vagas nas creches, para crianças de 0 a 3 anos. As matrículas para essa faixa etária têm uma dinâmica diferente, já que ocorrem ao longo de todo o ano. Mesmo assim, cresceram 44% em relação ao mesmo mês de 2019, agravando o problema da falta de vagas nas creches. Na cidade, há 22 mil crianças à espera de uma vaga na creche.
Se todo o ensino foi afetado pela pandemia do novo coronavírus, a educação infantil sofreu especialmente com a crise, também em razão da dificuldade em oferecer atividades remotas para crianças pequenas. O Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Estado de São Paulo (Sieeesp) estima que 30% das instituições privadas de educação infantil fecharam as portas durante a pandemia.
O encerramento de tantas escolas agrava o drama do desemprego, com a demissão de professores e funcionários, e sobrecarrega diretamente a rede pública. Segundo a legislação vigente, a partir dos quatro anos todas as crianças devem estar matriculadas na escola. O descumprimento dessa obrigação dá ensejo à responsabilização judicial dos pais.
A rede estadual, que inclui os ensinos fundamental e médio, também sentiu o aumento da demanda de vagas em função da crise social e econômica causada pelo novo coronavírus. No mês de julho, houve aumento de 35% das matrículas em relação ao mesmo período do ano passado. Segundo informou o Estado, movimento similar ocorreu em outras redes de ensino no País.
Não há apenas aspectos negativos na migração das crianças para a rede pública de ensino. “É uma nova população para a escola pública, que traz outras experiências, e pode contribuir para o desenvolvimento do projeto pedagógico”, disse a educadora Anna Helena Altenfelder, presidente do conselho do Cenpec. “É importante que os pais não vejam essa mudança como um castigo para o filho”, explicou. Segundo a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), uma sala de aula heterogênea, com diferenças sociais, culturais e étnicas, traz benefícios para todos.
De toda forma, o aumento da demanda nas redes públicas de ensino traz uma série de desafios para o poder estatal, em suas variadas esferas. Por exemplo, torna ainda mais evidente a necessidade da reforma administrativa, para que se tenha um Estado mais eficiente, e do ajuste fiscal, para que as atividades essenciais, como educação, disponham dos recursos necessários. A pandemia do novo coronavírus traz urgência em relação aos assuntos de curto, médio e longo prazos.
Decisiva para atenuar os efeitos da crise social e econômica, essa responsabilidade envolve não apenas os agentes públicos, mas todos os brasileiros. A necessidade de um Estado eficiente e inclusivo deve ser estímulo para o voto em candidatos competentes e honestos, bem como para o acompanhamento diligente dos que já foram eleitos.
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