O Estado de S. Paulo
Um Ministério Público ‘incontrolável’
garante o equilíbrio entre Poderes
Existem vários modelos estáveis de
democracia, da mais majoritária (com poucas restrições às preferências de uma
maioria parlamentar) à mais consensualista (com vários pontos de veto capazes
de proteger interesses minoritários).
Não se pode dizer qual modelo é o melhor. O importante é que exista equilíbrio entre os mais variados componentes do sistema.
Os founding fathers da democracia brasileira de
1988 constituíram um sistema político essencialmente consensualista, com vários
elementos de proteção, tais como separação de Poderes, federalismo,
multipartidarismo e, o que aqui interessa, independência do Judiciário e
do Ministério Público.
Para contrabalançar e gerar
governabilidade, os legisladores delegaram uma grande quantidade de poderes ao
presidente para que ele tivesse condições de atrair suporte político
majoritário, mesmo em um ambiente fragmentado.
Neste desenho, cumpre papel fundamental para o equilíbrio do jogo a existência de um MP e Judiciário independentes. Um MP “incontrolável” teria condições de controlar chefes do Executivo poderosos. Naturalmente que essa escolha não é destituída de custos. A falta de controle pode levar a potenciais excessos e desvios. Mas esse foi o preço que o legislador constituinte decidiu pagar.
Preferências podem ser alteradas, já que
constituições não são “camisas de força”. Mas deve-se atentar para os custos
dessa alteração.
O controle externo do MP já existe em
alguns países. Mas os elementos que garantem o equilíbrio do sistema são
diferentes dos daqui. Portanto, o que funciona lá não necessariamente vai
funcionar aqui.
A indicação de membros do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP)
e do seu corregedor pelo Legislativo, bem como a possibilidade desse conselho
passar a rever atos do MP, como proposta na PEC 5/21, certamente aumentará o
controle sobre os membros do MP, desestimulando potenciais excessos e
desvios.
Mas não podemos esquecer o outro dado da
moeda. Na medida em que um presidente constitucionalmente poderoso tem
condições de montar maiorias legislativas, serão essas maiorias que terão
capacidade de interferir na composição do CNMP e, por consequência, na própria
atuação do MP.
Se o problema é a falta de controle do MP,
poder-se-ia criar um controle exógeno que fosse exercido pela minoria
parlamentar de oposição. Um controle exercido por uma maioria parlamentar,
proposto na PEC 5/21, é uma “bomba atômica” que tem o potencial de
dessensibilizar o equilíbrio de todo o sistema político em prol do
Executivo.
* Professor titular FGV EBAPE, Rio
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