Valor Econômico
Taxa de desemprego deve seguir em níveis
elevados em 2022
O emprego tem mostrado uma recuperação
significativa nos últimos meses, mas a situação no mercado de trabalho segue
difícil. Apesar da maior criação de postos de trabalho, a desocupação continua
muito elevada, a taxa de subutilização da força de trabalho permanece nas
alturas e as perspectivas para a economia no ano que vem não são animadoras,
dado o cenário formado por juros em alta, incertezas fiscais e políticas e o
risco imposto pela crise hídrica. Para completar, as pressões inflacionárias se
mostram resistentes, corroendo a renda dos trabalhadores, e o nível de
endividamento das famílias está em nível recorde.
Na visão do economista Bruno Ottoni, o emprego de fato reage, mas o quadro geral do mercado de trabalho ainda é ruim. Em texto para o Blog do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), Ottoni diz que tanto os dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) quanto da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua sugerem realmente uma retomada expressiva do emprego. Pesquisador do FGV Ibre e da consultoria IDados, ele ressalva, contudo, que, “diante da grande perda de emprego causada pela pandemia, a forte geração de postos de trabalho de 2021 se mostra até pequena”. Além disso, muita gente ainda precisa voltar à força de trabalho, diz ele.
“Nesse
cenário, a taxa de desemprego pode até cair, mas ainda deve permanecer em
patamares elevados entre setembro de 2021 e dezembro de 2022”, afirma Ottoni.
Ele observa que a geração expressiva de empregos tem contribuído para a queda
do nível de desocupação - a taxa recuou de 14,5% no trimestre encerrado em
dezembro de 2020 para 13,7% nos três meses até julho, em números com ajuste
sazonal. O desemprego, porém, ainda se encontra claramente num nível muito
elevado, segundo ele. Antes da pandemia, por exemplo, esse número estava em
11,8%, um percentual que já era alto.
Considerando dados até julho, o Caged, uma
pesquisa baseada em dados administrativos com informações sobre trabalhadores
formais, mostra a geração de 1,8 milhão de empregos com carteira assinada neste
ano. A Pnad Contínua, por sua vez, também tem indicado uma criação forte de
postos de trabalho, incluindo vagas formais e informais, diz Ottoni. “A
população ocupada aumentou em mais de 2,8 milhões agora em 2021, mais
precisamente entre o trimestre encerrado em dezembro de 2020 e aquele terminado
em julho de 2021”, escreve ele.
“O problema é que uma análise abrangente do
mercado de trabalho brasileiro não pode parar apenas nessa constatação de
geração forte de empregos em 2021”, afirma o economista. “É importante
considerar que essa expressiva criação de empregos está ocorrendo após uma
grave crise, causada pela pandemia da covid-19, que debilitou gravemente o
mercado de trabalho”, avalia Ottoni, notando que, “ao longo de 2020, foram
eliminados cerca de 8,3 milhões de empregos” por causa do impacto da covid, de
acordo com a Pnad Contínua. A população ocupada caiu de mais de 94,5 milhões,
no trimestre encerrado em dezembro de 2019, para quase 86,2 milhões, no
trimestre encerrado em dezembro de 2020. “Diante dessa evidência, de perda de
aproximadamente 8,3 milhões de postos de trabalho por conta da pandemia ao
longo de 2020, a geração de emprego no ano de 2021, apesar de forte, se mostra
claramente insuficiente”, afirma ele, ressaltando que “outra variável
importante em uma análise mais abrangente do mercado de trabalho é a taxa de
desemprego”. E a desocupação segue muito alta, nos já mencionados 13,7% nos
três encerrados em julho, embora tenha recuado em relação ao nível do fim do
ano passado.
Para Ottoni, “as perspectivas para frente
também não são boas”, olhando para o horizonte de setembro de 2021 até o fim de
2022. “Nesse período acreditamos que a população na força de trabalho deve se
aproximar dos patamares vigentes antes da pandemia.” Isso significa um retorno
de mais 3 milhões de pessoas nesse intervalo. “Projetamos que, até o final de
2022, a população na força de trabalho deve se aproximar do nível vigente antes
da crise, porque a tendência é que até lá a pandemia já tenha ficado para trás.
Sem pandemia, o normal é que aqueles que saíram do mercado de trabalho voltem a
tentar procurar uma ocupação”, diz Ottoni. Com isso, “ainda deve haver muita
pressão de oferta de mão de obra afetando o mercado de trabalho brasileiro até
o final do ano que vem”. Nesse quadro, a taxa de desemprego pode até baixar,
mas deverá se manter em níveis elevados, reitera ele. Ottoni vê um cenário
pouco favorável ao crescimento, devido à combinação de fatores como juros em
alta, incertezas fiscais e políticas elevadas e o desafio imposto pela crise
hídrica.
Outro problema do mercado de trabalho é que
a taxa de subutilização continua muito alta. No trimestre terminado em julho,
eram 31,7 milhões de pessoas, uma taxa de 28% da força de trabalho ampliada,
somando os desempregados, os que trabalhavam menos horas do que gostariam e as
pessoas que não buscaram emprego, mas estavam disponíveis para trabalhar, além
daqueles que procuraram vagas, mas não estavam à disposição para trabalhar na
semana de referência da pesquisa.
Além da situação complicada no mercado de trabalho, as famílias enfrentam pressões inflacionárias persistentes e disseminadas, com alta forte de preços de alimentos, combustíveis, energia e serviços, corroendo a renda disponível, em especial dos mais pobres. Para completar, o nível de endividamento dos brasileiros é crescente. Segundo pesquisa da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), quase três quartos da população tem dívidas. Em setembro, 74% dos ouvidos no levantamento relataram estar endividados, o maior nível da série iniciada em 2010. No mesmo mês do ano passado, o percentual era de 67,2%. São fatores que limitam as perspectivas de expansão do consumo das famílias, que tem peso de mais de 60% no PIB pelo lado da demanda.
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