Valor Econômico
A pergunta que se faz é se o futuro PGR atuará para que a Corte se reequilibre ou será sua linha auxiliar
Com o retorno antecipado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na manhã desta quinta, crescem as expectativas de que o novo procurador-geral da República saia esta semana.
Ao contrário da vaga da ministra Rosa Weber, que se aposenta no dia 28 do Supremo Tribunal Federal, a demora em substituir Augusto Aras, cujo mandato termina dois dias antes, tem consequências objetivas e indesejáveis. Acarretaria na itinerância da vice-presidente do Conselho do Ministério Público Federal, Elizeta Ramos, com poder de nomeação e distribuição de processos.
Como Lula só encontrou dois candidatos, o sub-procurador-geral da República, Antonio Carlos Bigonha, e o vice-procurador-eleitoral, Paulo Gonet, antes da viagem, conclui-se que a escolha se afunilou entre os dois, embora nenhum deles o tenha convencido de sua ascendência sobre a corporação.
Quem a tem é o subprocurador da República Mario Bonsaglia, mas seu nome é envenenado exatamente por esta razão. Ao contrário de Bigonha, nunca foi próximo de Rodrigo Janot, nome que passou a sintetizar tudo que a política rejeita no MPF, mas integrou a lista tríplice, o que lhe confere a alcunha de “corporativo”.
Ao contrário de Bonsaglia e Bigonha, Gonet não tem padrinhos no PT. É também um desconhecido no Congresso. Os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, que acompanharam Lula a Nova York, fizeram boa figuração de um Brasil unido pela economia do baixo carbono, mas até a tarde dessa terça ainda não tinham sentado com o presidente para discutir nomeações pendentes.
Sabem que seu candidato, Aras, é carta fora do baralho, mas temem o que o PT pode fazer com uma PGR para chamar de sua. Basta ver o apego de Lira, exibido à “Folha de S.Paulo”, por cargos de porteira fechada. Quando o presidente da Câmara fecha uma porteira não se recusa apenas a compor na indicação de cargos. Também pretende deixar PF, TCU e MPF longe da fiscalização de autarquias sob seu patrocínio.
Gonet tem simpatizantes como a deputada Bia Kicis (PL-DF), da tropa de choque bolsonarista, mas é, sobretudo, o candidato da dupla de ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes. O apoio tanto pode lhe assegurar o céu quanto o inferno. Será favorecido se Lula avaliar que o estilo deixa-que-eu-resolvo da dupla lhe é útil. Será prejudicado se o presidente avaliar que os ministros já acumulam poder demais para ainda ganharem o PGR.
O excesso de poder do Supremo saltou aos olhos nas sessões em que estiveram em pauta os atos de 8/1. E surpreende que a substituição do PGR se afunile à margem deste julgamento. Apesar de o processo ora em curso ter sido iniciado no MPF, os atos antidemocráticos só se transformaram na invasão de Brasília porque sua incitação pelo ex-presidente foi, ao longo de todo seu mandato, solenemente ignorada pelo PGR.
A omissão de Aras lastreou o ativismo do STF. Basta ver o desempenho de Moraes. O relator foi mais agressivo com os advogados do que Carlos Frederico Santos, o subprocurador.
O pedido para que o quarto réu fosse enviado ao plenário virtual, junto com os demais denunciados, foi uma maneira envergonhada de Moraes reconhecer, além dos excessos, a falta de cabimento de tornar o STF o foro de julgamento de centenas de réus.
Se Rosa Weber aceitar o pedido de Moraes, os advogados serão poupados das adjetivações do relator sobre sua atuação, mas seus clientes terão seu direito de defesa cerceado por um julgamento sem sustentação oral ou interação entre as partes.
Os advogados foram agressivos, ignorantes e pueris, mas isso é um problema dos clientes deles. Ao juiz cabe analisar a defesa apresentada e julgá-la ou não procedente. Não foi o que Moraes fez. É bem provável - e condenável - que os advogados tenham feito naquele julgamento, como apontou o ministro, sua pré-campanha pra as eleições de 2024, mas se Moraes assinou e lavrou em cartório a renúncia a uma carreira eleitoral pós-Supremo não é de conhecimento público.
Ao patrocinar uma candidatura, como a de Gonet, para a PGR, ao lado do ministro Gilmar Mendes, não está claro o que pretende Moraes. Se quer um PGR que lhe poupe de assumir o papel que hoje desempenha neste processo do 8/1 ou que lhe franqueie espaço para continuar a fazê-lo. O desempenho de Gonet na Procuradoria-Geral Eleitoral em 2022 favorece a segunda alternativa.
A omissão da Ordem dos Advogados do Brasil no julgamento só reforçou a necessidade de uma PGR que seja tão independente do presidente da República quanto do STF. O ofício da OAB para que Rosa Weber indefira o pedido de transferência para o plenário virtual é atitude tardia que não remedeia a atuação da entidade.
Se o apoio à atuação do Supremo como guardião do Estado democrático de direito se fez necessário, a omissão na defesa dos advogados permaneceu sem explicação. Aqueles que a cobraram na reunião do Conselho Federal da entidade, na segunda-feira, inclusive três ex-presidentes, não tiveram acolhida. A sessão não teve sua costumeira transmissão pelo canal da OAB no YouTube. A entidade tampouco disponibilizou o acesso público ao áudio ou o vídeo da reunião.
É assim que a OAB autoriza a interpretação de que o STF segue sem anteparo. Seus excessos não passam ao largo da população e corroboram para manter o país dividido, como mostram as pesquisas. A pergunta que se faz é se o futuro PGR atuará para que a Corte se reequilibre ou será sua linha auxiliar.
2 comentários:
Perfeito, realmente perfeito!
Fato.
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