A recuperação econômica que se esboçou no trimestre passado e se refletia de
forma tênue no ânimo dos empresários, começa novamente a se esvair. A
recuperação mais vigorosa na produção industrial e nos investimentos, que se
esperava a partir deste último trimestre do ano, não está se materializando e
nem há sinais efetivos de que isso acontecerá em 2013. A taxa de inflação teima
em persistir num patamar incômodo. A mudança promovida pelo governo no conjunto
de preços macroeconômicos para recuperar a competividade da indústria e reduzir
o custo do capital - taxa de câmbio menos apreciada e taxa real de juros Selic
menor -, não têm promovido estímulos esperados nem mesmo nas expectativas.
Medidas de desoneração tributária, redução nas taxas de juros, redução no
custo de energia e outras de proteção à indústria nacional produzem resultados
pontuais, fundamentais no curto prazo para evitar uma recessão e promover a
recuperação. No entanto, seus efeitos sobre o crescimento são a médio prazo. O
conjunto não trivial de medidas de estímulo tomadas pelo governo afeta mais a
demanda no curto prazo, que não é o nosso problema central, particularmente no
setor de serviços.
O problema central é que não há resposta adequada da indústria, setor vital
para o crescimento. O nível de emprego e a folha de pagamento real caíram neste
ano no acumulado até setembro, e tanto a participação no Produto Interno Bruto
(PIB) como a produtividade também vêm declinando. Os investimentos e o saldo
comercial também.
Os estímulos pontuais e de curto prazo não repercutem nas expectativas de
longo prazo
Paradoxalmente, mesmo neste quadro de contração da indústria, os seus custos
continuam subindo, o salário real médio aumentou 4% de janeiro a setembro, a
despeito da queda de 3,5% da produção no mesmo período. Apesar da depreciação
da taxa de câmbio, as importações continuam de vento em popa, mas com custos
mais elevados. O que se depreende é que está havendo uma óbvia redução na
margem de lucro da indústria.
Em contraste com esse quadro de retração na indústria, o setor de serviços
vem ampliando o nível de emprego em 3,5%, de janeiro a setembro deste ano em
relação ao ano anterior. O salário médio vem aumentando 8,1%, acima da inflação
no mesmo período, com forte pressão nos custos. Por ser um setor não
comercializável não sofre competição externa como a indústria, repassa os
custos aos preços acelerando a inflação, que vem se mantendo persistentemente
em nível preocupante e próximo a 9%.
O quadro descrito acima pede uma parada para repensar. Afinal, nem as
mudanças na política macroeconômica pró-crescimento, nem as medidas sucessivas
de incentivos tributários e creditícios estão provocando reações, no médio
prazo, na indústria, para acelerar o crescimento econômico. Mais do que isso,
as medidas de estímulo afetam a demanda agregada no curto prazo, mas em grande
parte estão beneficiando o exterior e elevando os preços dos serviços, pois o
setor de serviços responde, mas a oferta da indústria é incapaz de atender aos
estímulos mencionados. Das muitas explicações plausíveis duas são imediatas.
Primeiro, que o quadro de deterioração e perda de competitividade da
indústria brasileira é muito maior que imaginávamos. Alguns dados sobre a
estagnação da produtividade, pressão nos custos, particularmente da energia
elétrica e transportes e elevação na carga tributária somada ao "custo
Brasil" indicam que as medidas de estímulos, a depreciação cambial e
redução nos juros nem de longe conseguem compensar as perdas sofridas pelo
setor nos últimos anos.
Significa que são necessárias medidas mais fortes e profundas que revertam a
dinâmica perversa em que atolou a indústria brasileira. De fato, instalou-se um
círculo vicioso de pressão de custos e queda da produtividade e das margens de
lucro.
Neste quadro, os estímulos pontuais e de curto prazo não repercutem nas
expectativas de longo prazo que deprimem os investimentos. É preciso repensar a
economia brasileira, estendendo o horizonte temporal, com um planejamento
estratégico de longo prazo, reformando e reestruturando e definindo claramente
o papel que cabe ao estado.
No atual cenário de crise financeira global, este último aspecto se tornou
fundamental. Sem uma reforma do estado, melhorando a sua competência técnica,
que é hoje absolutamente medíocre, melhorando a eficiência de seus serviços e
desonerando, tanto do ponto de vista tributário como em custos de transação, o
setor privado dificilmente terá o horizonte desanuviado e disposto a elevar a
taxa de investimento na magnitude que necessitamos. Se estas reformas não forem
executadas, permaneceremos no medíocre crescimento médio da última década de
pouco mais de 3%.
A segunda explicação para o quadro paradoxal se refere à falsa exuberância
do setor de serviços em contraste com o retrocesso na indústria. Aqui, a taxa
real de câmbio apreciada por longos anos promoveu a substituição da produção
nacional pelas importações, desindustrializou o país, provocou enormes pressões
de custos e reduziu a margem de lucro e o estímulo aos investimentos. Afinal,
hoje se impõe os efeitos de um longo período com um preço relativo (taxa de
câmbio) desfavorável para o setor industrial de bens comercializáveis e
favorável aos serviços. O que mais poderíamos esperar? Afinal, os preços
relativos são determinantes fundamentais da dinâmica dos mercados.
Yoshiaki Nakano, mestre e doutor em economia pela Cornell University.
Professor e diretor da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getulio
Vargas (EESP/FGV). Ex-secretário da Fazenda do governo Mário Covas (SP).
Fonte: Valor Econômico
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