Acossado pelas manifestações, o governo Dilma tenta responder aos gritos das ruas contra a corrupção com um plebiscito para realização de uma reforma política praticamente limitada às regras eleitorais. Difícil imaginar o eleitorado diante da urna eletrônica tendo que escolher entre voto proporcional, distrital puro ou distrital misto, financiamento de campanha público, privado ou misto, proibição de coligações proporcionais ou outra qualquer opção, simplesmente porque não dá para perceber em que estas opções influenciam o futuro do Brasil e vida dos cidadãos. E se a intenção é combater a corrupção, esta reforma representa quase nada considerando os múltiplos ralos de negociatas na política e na gestão pública. A forma de financiamento das eleições pode ser importante para evitar desequilíbrio nas campanhas dos candidatos, mas está longe de ser fonte importante de corrupção, a não ser quando gera as "sobras de campanha" que teriam levado ao mensalão.
A corrupção tem vários outros ralos mais significativos que o financiamento de campanha. O mecanismo central de corrupção é o superfaturamento de contratos e compra de serviços pelos governos nas diversas instâncias e órgãos públicos, forma endêmica e permanente de desvio de dinheiro para partidos ou patrimônios pessoais. Por isso os cargos comissionados são tão disputados pelos políticos desonestos e seus apadrinhados, por isso tantos políticos vendem seu apoio aos governos por cargos, de ministro de Estado aos escalões mais simples, desde que ordenadores de despesa. Trinta e nove ministérios e mais de 22 mil cargos comissionados na União formam uma ampla e inesgotável malha de desvio de recursos. Neste sentido, o plebiscito e a reforma política, quase apenas eleitoral, são uma resposta ridícula.
Mais uma vez, o governo desvia o foco da questão e inventa um artifício para encobrir sua incompetência e desinteresse. O combate à corrupção requer, ao contrário, uma reforma do Estado e do sistema de governo para acabar com a farra dos cargos comissionados. Excetuando o segundo escalão dos governos, todo cargo público deveria ser assumido exclusivamente por servidores de carreira com profissionalização total das atividades de direção governamental e não por indicação política. A profissionalização dos cargos comissionados evitaria a contaminação da gestão pública por pessoas despreparadas e apadrinhadas, frequentemente especialistas em superfaturamento, e impediria o mecanismo nefasto de compra do apoio político dos parlamentares com cargos de confiança.
A corrupção tem vários outros ralos, é verdade. Mas bastaria quebrar esta relação promíscua dos políticos com os executivos e gerentes dos governos para reduzir drasticamente o sumidouro ilegal dos recursos públicos que compromete a qualidade dos serviços públicos no Brasil. Sem nada desta figuração marqueteira da presidente.
Sérgio C. Buarque é economista e consultor
Fonte: Jornal do Commercio (PE)
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