Quem fala demais, diz a sabedoria popular, acaba dando bom dia a cavalo. Às vésperas de assumir o segundo mandato presidencial num contexto político e econômico, para dizer o mínimo, complicado, e acossada pelas denúncias sobre o maior escândalo de corrupção da história da República, Dilma Rousseff tem demonstrado que não aprendeu com seu criador a lição de que, quando a situação aperta, em público olha-se para o outro lado.
Tivesse seguido o exemplo de Lula, Dilma teria se poupado, na ânsia de mostrar que está empenhada num combate sem tréguas à corrupção, do ridículo de proclamar que doravante, antes de nomear um ministro de Estado, vai querer saber do Ministério Público (MP) se ele tem ficha limpa.
A investigação meticulosa da vida pregressa de pessoas indicadas para cargos públicos é prática corriqueira nas democracias mais avançadas. Nos Estados Unidos, o presidente da República nem pensa em nomear qualquer autoridade do alto escalão, sem antes passar os olhos pelo dossier preparado pelo Serviço Secreto. É um trabalho de cuja execução o alvo nem se dá conta, embora saiba muito bem que é feito. E quem não deve não teme.
Trata-se de um instrumento legítimo de salvaguarda da idoneidade do serviço público, quando utilizado dentro dos limites legais que garantem a preservação dos direitos individuais. Por isso mesmo, nenhum presidente norte-americano precisa sair por aí anunciando que só nomeia quem tem atestado de honestidade passado em cartório.
Dilma faz muito bem, é claro, de tomar precauções necessárias na hora em que está empenhada em finalizar a montagem de sua nova equipe de governo. Mas o anúncio, feito durante café da manhã com jornalistas na segunda-feira, além de revelar preocupante ignorância a respeito do funcionamento das instituições do Estado, só pode ser classificado como uma tentativa canhestra de exibir empenho em promover aquilo que não conseguiu ao longo dos quatro anos do primeiro mandato: blindar o primeiro escalão do governo contra a corrupção.
De resto, ninguém se ilude quanto ao fato de que é de eficácia muito relativa a "assessoria" do Ministério Público de que Dilma anuncia que vai se socorrer. Não porque os procuradores da República não sejam competentes. Mas porque até os ascensoristas do Palácio do Planalto sabem que, na hora de se consumar uma nomeação de ministro, o que prevalece é o interesse político das forças partidárias envolvidas na "transação". Do resto ninguém precisa ficar sabendo.
É importante observar ainda que a decisão de Dilma de contar com a assessoria do Ministério Público para avaliar a idoneidade de candidatos ao Ministério provoca controvérsia em relação à sua legalidade e constitucionalidade. O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa, que foi procurador da República, afirmou: "Ministério Público é órgão de contenção do poder político. Existe para controlar-lhe os desvios, investigá-lo. Não para assessorá-lo".
Na mesma linha de impropriedade e imprudência que marcou o anúncio do atestado de probidade para os candidatos a ministro, está a manifestação de Dilma, também naquela oportunidade, diante dos jornalistas, de confiança irrestrita no desempenho de Graça Foster no comando da Petrobrás. Sem precisar da ajuda do MP, Dilma contemplou a amiga com uma certidão de idoneidade e competência, proclamando-a intocável.
Com isso, aparentemente, resolveu um problema seu, adiando pelo menos para até depois da posse a necessidade de tomar em relação à Petrobrás uma atitude compatível com o tamanho da encrenca. E deixou o abacaxi no colo da amiga que, apesar da retórica de Dilma, vai passar as festas de fim de ano com a famosa espada de Dâmocles pendendo sobre a cabeça.
Enfim, o lulopetismo, que Dilma representa, é isso mesmo: fala muito mais do que faz, quando faz. E a compulsão de falar que a reeleita presidente tem revelado ultimamente pode ser indício de que ela não anda lá muito certa sobre o que precisa fazer. O ano novo o dirá.
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