• O Ministério Público não pode ajudar a doutora Dilma a escolher seus ministros; ela é que deve parar de errar
- O Globo
A doutora Dilma podia ter a melhor das intenções quando anunciou que pediria ajuda ao Ministério Público na escolha de seus ministros. Ou a pior. Na hipótese benigna, não queria correr o risco de nomear um larápio. Na maligna, queria transferir para o Ministério Público uma responsabilidade que é inteiramente sua. Nomearia o sujeito, ele apareceria numa petrorroubalheira e ela tiraria o corpo fora, pois a Procuradoria nada tivera contra o magano. O ex-ministro Joaquim Barbosa disse muito bem: "Que degradação institucional! Nossa presidente vai consultar um órgão de persecução criminal antes de nomear um membro de seu governo!!! Du jamais vu." Barbosa vocalizou em francês a expressão de Nosso Guia: "Nunca na História deste país..."
Os "nunca na História..." são muitos, mas nem um oposicionista delirante seria capaz de supor que um comissário do segundo escalão entesourasse US$ 100 milhões. Em benefício da doutora, reconheça-se que ela conhece mal o funcionamento das instituições. Só isso explica a insistência com que propõe em pactos e plebiscitos. Se falasse sério, no caso dos petrocomissários consultaria a Agência Brasileira de Inteligência, mas esse ectoplasma palaciano do falecido Serviço Nacional de Informações ainda não mostrou a que veio. Se a Abin não colocou sobre sua mesa uma análise das petrorroubalheiras, é melhor fechá-la. Afinal, em 2013 custava R$ 500 milhões. Se a agência acendeu algum tipo de luz amarela e não conseguiu atenção, o problema é da doutora.
Durante a campanha eleitoral o comissariado repetia um bordão, segundo o qual não se poderia pré-julgar pessoas acusadas de envolvimento nas petrorroubalheiras. O próprio ministro da Fazenda despediu-se do "amigo Paulinho" agradecendo os "relevantes serviços" prestados à Petrobras. O líder do governo no Senado considerou "satisfatório" seu primeiro depoimento à CPI, anterior à decisão de colaborar com a Viúva. Era uma coleção de lorotas. Há no Planalto quem saiba bastante sobre a Petrobras. Sabem até mais que os procuradores. O que eles não sabem, e aí está o problema dos comissários, é o caminho das pedras para sair da enrascada.
Pela blindagem do Ministério Público, pelo silêncio do ministro Teori Zavascki e pelo naufrágio das primeiras patranhas dos maganos, esse caminho das pedras pode não existir. De alguma maneira, o comissariado precisa se recompor com a verdade. A doutora já se disse "estarrecida" com os malfeitos e considerou "absurdas" as quantias desviadas. É pouco. Precisa despir o manto da surpresa. Esse vem sendo o erro do PT desde que estourou o mensalão.
Outro dia, num debate na Corte Suprema dos Estados Unidos, o juiz Antonin Scalia foi confrontado por uma colega por ter votado numa posição contrária à que tomara noutro caso. Meter-se com a rapidez de raciocínio de Scalia é arriscado. Ele defendeu-se citando o grande juiz Robert Jackson: "Não vejo por que eu deva ficar conscientemente errado hoje porque, inconscientemente, estive errado ontem". Retirando-se o "inconscientemente" da frase de Jackson, a lição pode ser um presente de Natal para o comissariado.
Elio Gaspari é jornalista
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