• ...mas com os procuradores da República no Paraná não há acordo. Os próximos alvos são gigantes como Odebrecht e Andrade Gutierrez
Flávia Tavares e Murilo Ramos - Època
Havia quase um mês que a presidente Dilma Rousseff não falava publicamente. Ela escapuliu como pôde das cobranças sobre os rumos da economia do país, as mudanças nas regras trabalhistas, apagões, estiagem e outros colapsos do início de seu segundo mandato. Na terça-feira, dia 27, Dilma reuniu seus 39 ministros para um reunião - e finalmente falou. Mas disse coisas preocupantes. Para a presidente, as empreiteiras acusadas de corrupção no petrolão não devem ser punidas pela Justiça. Somente as pessoas. É precisamente o contrário do que a Lei Anticorrupção, enviada por ela ao Congresso e aprovada pelos parlamentares, exige: punição severa às empresas que desviem dinheiro público.
Em discurso, Dilma mostrou preocupação com o futuro da Petrobras, principal empresa de uma cadeia produtiva que responde por 13% do PIB brasileiro. "Temos de apurar com rigor tudo de errado que foi feito. Temos de aprimorar mecanismos para que coisas como essas não voltem a acontecer. Temos de saber apurar e investigar", disse a presidente. Em seguida, ela capitulou: "Nós temos de saber fazer isso sem prejudicar a economia e as empresas.
Queria dizer que punir, ser capaz de combater a corrupção, não quer dizer destruir as empresas. As pessoas têm de ser punidas, e não as empresas" (leia o editorial na página 9). Em três frases, a palavra "empresas" apareceu três vezes. Podia ser falha retórica. Mas não. Era um recado claro.
O Ministério Público Federal discorda da presidente. Os procuradores que atuam na Lava Jato querem, sim, alcançar as pessoas, no caso os políticos enlameados no escândalo, mas também as empreiteiras. A estratégia para ter sucesso na missão é a divisão de tarefas. Os procuradores do Paraná miram as empreiteiras; o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, os políticos. Nesta semana, com a volta das atividades do Supremo Tribunal Federal, Janot vai pedir que voltem à Justiça paranaense os casos de políticos que perderam mandato nas últimas eleições e, assim, o foro privilegiado. Além disso, Janot vai mandar a Curitiba integrantes da força-tarefa que ele próprio montou, formada por procuradores da República e promotores de Justiça do Distrito Federal. O objetivo é estreitar a relação com os membros de uma outra força-tarefa, criada em abril do ano passado por nove procuradores da República lotados no Paraná.
O MPF partiu para o contra-ataque. Criou um site repleto de documentos e dados sobre a Lava Jato - não faltam provas sobre o caso. Incluiu um espaço para que internautas façam denúncias. Aproveitou para divulgar resultados do trabalho até agora: foram recuperados R$ 500 milhões em dinheiro desviado da Petrobras. O site sobre a força-tarefa do MPF entrou no ar na quarta-feira, logo após Dilma ter conclamado seus ministros a "travar a batalha da comunicação".
Numa entrevista concedida ao jornal O Globo, o procurador da República no Paraná, Deltan Dallagnol, refutou que as empreiteiras envolvidas no escândalo sejam meras vítimas de servidores da Petrobras. Para ele, as empreiteiras são as protagonistas do esquema de corrupção instalado na estatal há anos. "Se as empresas se organizaram em cartéis para fraudar licitações e aumentar ilegalmente suas margens de lucro, não íaz sentido alegar que foram vítimas de achaques por seus cúmplices", disse Dallagnol. Quando o procurador acrescenta que os desvios, somente na Diretoria de Abastecimento, aquela que era comandada por Paulo Roberto Costa, podem ultrapassar os R$ 5 bilhões, fica ainda mais difícil imaginar que a Justiça deva aliviar as punições para as empreiteiras.
As empresas que até agora não foram denunciadas deverão ganhar atenção especial dos investigadores nos próximos capítulos da investigação. Entre elas está a Odebrecht, que mereceu um inquérito exclusivo. O principal objeto da apuração é um contrato de R$ 3,1 bilhões assinado em dezembro de 2009 com a Petrobras para a construção da Refinaria Abreu e Lima, em Pernambuco. Em outubro do ano passado, ÉPOCA revelou uma suspeita de superfaturamento na obra, num percentual de 18% a 20%. Ali, segundo as evidências colhidas pelo MPF e uma investigação independente de ÉPOCA» foram embutidas as propinas embolsadas por Paulo Roberto Costa e o ex-diretor de Serviços da Petrobras Renato Duque»- além da "colaboração" financeira com as campanhas dos partidos que comandavam o aparelhamento político na Petrobras. Em um dos depoimentos da delação premiada, Costa afirmou ter sido orientado por um diretor da Odebrecht, Rogério Santos de Araújo, a abrir uma conta na Suíça para receber US$ 23 milhões em propina paga pela empreiteira entre os anos de 2008 e 2009. Costa disse que, após receber as propinas, costumava redistribuí-las para outras contas. "A Odebrecht nega veementemente as alegações caluniosas feitas pelo réu confesso e ex-diretor da Petrobras. Nega em especial ter feito qualquer pagamento ou depósito em suposta couta de qualquer executivo ou ex-executivo da estatal", diz a empreiteira, em nota.
A Andrade Gutierrez também é objeto de uma investigação específica. Em um de seus depoimentos, o ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa afirmou ter recebido entre US$ 2 milhões e US$ 2,5 milhões da construtora. Costa afirmou que o dinheiro foi movimentado em contas de um banco em Lichtenstein. Os pagamentos foram intermediados pelo lobista Fernando Baiano, operador do PMDB preso pela PF. Em seu depoimento, Costa se queixou da Andrade Gutierrez. Disse que a empresa não costumava cumprir acordos. "Mesmo após ganhar algum contrato, a empresa custava a depositar o valor devido ao PP (Partido Progressista)", disse. O PP era um dos três partidos que controlavam politicamente a Diretoria de Abastecimento da Petrobras, em conjunto com o PT e o PMDB. Em nota, a Andrade Gutierrez afirmou categoricamente que "nunca, em momento algum, fez qualquer tipo de repasse de valores para o senhor Paulo Roberto Costa ou para qualquer pessoa".
No mesmo depoimento, Costa acusou outra empresa: a Estre Ambiental. Por meio de Baiano, Costa disse ter se aproximado do então proprietário da empresa, Wilson Quintela Filho. Ainda de acordo com Costa, Quintela pagou R$ 1,4 milhão em propina para que a Estre pudesse participar de uma licitação de uma subsidiária da Petrobras. Costa disse ter recebido o dinheiro das mãos de Baiano. Afirmou, ainda, que parte do dinheiro foi entregue por Baiano depois de ele ter deixado a Diretoria de Abastecimento da Petrobras, em abril de 2012. A Estre Ambiental afirmou que "desconhece as razões da menção e estranha a inclusão de seu nome no referido depoimento".
Nenhum comentário:
Postar um comentário