• Repressão a críticos de pemedebista é condenável
- Valor Econômico
A abertura da Olimpíada foi até agora o ponto alto de um gradativo reconhecimento, pela comunidade internacional, da legalidade do processo de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff. O presidente interino Michel Temer manteve a discrição, como era esperado, e mesmo assim foi vaiado na cerimônia de abertura realizada na sexta-feira no Estádio do Maracanã. Para seus auxiliares, porém, ele ganhou o dia ao receber em um coquetel antes da solenidade 40 chefes de Estado, governo e outros líderes internacionais.
Desde que a Câmara acolheu o pedido de abertura do processo de afastamento de Dilma, em dezembro, o vice Michel Temer notou uma evolução na percepção da legitimidade do impeachment. Há cerca de oito meses, por exemplo, embaixadores estrangeiros sediados em Brasília questionavam-se sobre os cenários decorrentes da abertura do processo. Os diplomatas debatiam a solidez da denúncia, as probabilidades de Dilma ser afastada e as possíveis reações da comunidade internacional à interrupção de seu mandato.
Não passou despercebida no governo, por exemplo, a diferença de 43 dias entre a data em que o Brasil concedeu o "agrément" a Peter McKinley como novo embaixador dos Estados Unidos no país e o anúncio feito em 7 de julho pelo governo americano de que concedera o mesmo tipo de autorização para o embaixador Sérgio Amaral atuar em Washington. Não se previa, no Palácio do Planalto, que demoraria tanto. Mas, agora, o caso se aproxima de um desfecho com a chancela do Supremo Tribunal Federal (STF), fator considerado crucial pelos observadores que acompanham a situação do Brasil e as condições do regime democrático nacional.
Integrantes do governo interino de Michel Temer ponderam que as autoridades estrangeiras não participam das solenidades de abertura de uma Olimpíada para prestigiar o governo do país em que o evento é organizado, mas para apoiar as suas próprias delegações de atletas. Mesmo assim, comemoram o clima de naturalidade e descontração em que se deu a recepção oferecida pelo presidente interino no Palácio Itamaraty, no Rio.
Alguns dos presentes reconheciam a gravidade da situação brasileira, mas diziam entender que o país passa por um período de transição. Demonstravam ainda saber que a presidente afastada não deve retomar o posto. Não houve constrangimentos, Temer até realizou uma reunião com os presidentes da Argentina e do Paraguai para discutir o destino do Mercosul e recebeu os cumprimentos do secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, do secretário de Estado dos EUA, John Kerry, e de líderes europeus.
Temer também não precisou preocupar-se com a presença de Dilma ou do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que não foram ao Rio.
O governo interino trabalha para que a Rio 2016 seja uma vitrine, uma oportunidade para o país começar a recuperar sua imagem no exterior. A Olimpíada é considerada pelo Palácio do Planalto como um potencial instrumento para o Brasil novamente ser visto de forma positiva, reavivando a curiosidade de investidores estrangeiros e potenciais turistas pelo país, depois de figurar nas manchetes internacionais nos últimos anos devido à crise econômica, à instabilidade política ou ao surto do vírus zika.
A Copa de 2014 é dada como exemplo. Problemas de organização e planejamento também causaram incômodos, sobretudo nos primeiros dias do evento. Imprevistos elevaram os gastos relacionados à competição, mas, no fim das contas, o saldo foi positivo.
É verdade que grande parte dos preparativos foram levados adiante pela gestão Dilma Rousseff e dependem de outras esferas administrativas, assim como a decisão do governo interino de afastar servidores que há anos trabalhavam na organização do evento às vésperas da Olimpíada atrapalhou o desempenho do Ministério do Esporte neste momento. Mas agora o próprio Temer e diversos ministros estão se empenhando pessoalmente para que tudo dê certo.
A segurança é uma das principais preocupações do Planalto. Além de querer evitar o potencial noticiário negativo sobre a violência contra turistas, atletas ou autoridades estrangeiras presentes no Rio, o governo busca evitar qualquer possibilidade de que um eventual ataque terrorista cause uma tragédia e coloque tudo a perder.
Acredita ainda que a Olimpíada tem tudo para melhorar o ânimo da própria população brasileira. Internamente, na avaliação de auxiliares de Temer, ela pode ajudar a marcar uma mudança de fase em relação à atual conjuntura política. Afinal, os jogos coincidem com o avanço dos processos de impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff no Senado e o de cassação do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ).
Ontem, conforme prometido pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi lido em plenário o parecer do Conselho de Ética que recomenda a cassação de Cunha. A votação do caso ainda não foi marcada, mas estará pronta para ser incluída na pauta da Casa nos próximos dias - caso os aliados de Eduardo Cunha não tenham força para postergar a conclusão do seu julgamento.
Temer ainda não colheu todos esses frutos e, agora, enfrenta o risco de novos desdobramentos da Lava-Jato produzirem maiores danos ao seu governo. Por outro lado, algumas contas já começam a chegar ao seu gabinete.
O governo federal teve que desembolsar de última hora R$ 120 milhões para ajudar nos custos das festas de abertura e encerramento da Olimpíada. O Executivo também confirmou ao Congresso que a realização da Rio 2016 deve demandar uma renúncia fiscal de R$ 3,8 bilhões entre 2013 e 2017. A estimativa é que R$ 2,9 bilhões impactem o Orçamento deste ano e outros R$ 212,7 milhões no do ano que vem. Tudo isso num período em que o governo tenta fazer um ajuste fiscal e recuperar a confiança dos investidores.
Os casos de repreensão a torcedores que criticam o processo de impeachment de Dilma e o governo Temer durante os jogos não ajudam em nada a estratégia de relacionar a Olimpíada a um Brasil melhor.
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