Mariana Haubert – Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - Cortejado tanto pela presidente afastada, quanto pelo presidente interino, Michel Temer, o senador Cristovam Buarque (PPS-DF) diz que o impeachment de Dilma Rousseff será a única chance de o PT se reconstruir –o que faz parte, afirma, de uma estratégia para as eleições presidenciais de 2018.
Em entrevista à Folha, o senador confirma o voto pelo afastamento definitivo da petista e, fazendo a ressalva de que Michel Temer está "gastando muito", afirma que ele tem condições de "trazer algo novo".
O ex-ministro de Lula fala que, ao apoiar o impeachment, está perdendo prestígio mesmo é nas rodas internacionais. "Para eles é como se estivesse tirando o Mujica ou o papa Francisco."
• Folha - O que o convenceu a votar pelo impeachment?
Cristovam Buarque - O impeachment não é golpe. Se estivéssemos no parlamentarismo, eu não teria a menor dúvida de que deveríamos dar um voto de desconfiança, pela inflação, desperdício, mentiras na campanha. Mas do ponto de vista presidencialista, eu disse desde o começo que só decidiria depois que o processo se esgotasse.
E o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG) [relator do processo] terminou seu parecer demonstrando que houve crime. Eu vejo até que foi um crime pequeno, mas foi um crime.
• Temer também passará por processo semelhante?
Não acredito. É muito raro ter dois terços contra quem está no poder. A presidente Dilma só conseguiu isso porque não soube fazer o trabalho parlamentar. Faltou ter o respeito ao Parlamento. Ao desrespeitar, paga-se o preço.
Os próprios deputados do PT contam que não eram recebidos por ela. Eu fui ministro dela e nunca fui recebido [na verdade Cristovam foi ministro da Educação de Lula, de janeiro de 2003 a janeiro de 2004].
• O senhor sente mágoa dela ou do PT?
Sinto uma frustração de não termos aproveitado esse momento. Eu fui quatro vezes a Dilma neste período e fui uma vez ao Temer. Tentei que houvesse uma saída diferente. Na última vez, quando não havia mais jeito, eu propus que ela renunciasse e desafiasse o Temer a renunciar também. Ela reagiu muito duramente.
Eu tenho certeza de que se o voto fosse secreto, o PT votaria pelo impeachment. Porque é a chance do PT de se reconstruir. Ele vai jogar a culpa de tudo o que fez de errado nos ombros do Temer. Inflação, desemprego, dívida, deficits da Previdência. Aí vão para a oposição onde ficam em uma posição cômoda. E tentando fazer valer a bandeira do golpe. É um papel dentro de uma estratégia eleitoral da bandeira do golpe em que vão dizer que brigaram até o fim.
• Qual a avaliação do senhor sobre o governo Temer até agora?
Apesar de ter estado com Dilma por 12 anos, vejo que Temer pode trazer algo novo. Acho que ele tem mais condições de reequilibrar o processo econômico, barrar a inflação. Mas também me preocupo porque está gastando muito. Embora eles digam que tudo isso estava previsto, eu acho que eles estão abrindo um flanco muito perigoso. E ele vai nos dar uma travessia porque já não é mais a esquerda no poder. Vai nos obrigar a buscar alternativas.
• Na Comissão Especial do Impeachment, o senhor disse que também está perdendo muito prestígio internacional.
É onde realmente eu estou perdendo, é no prestígio que construí no exterior: as cartas que recebo de grandes personalidades. Lá fora fica a impressão de que estão tirando a presidente. Ninguém sabe quem é Sergio Moro, ninguém sabe que tem presos do PT, pedalada.
Então o que é que se sabe: a presidente [que é] do PT que tem uma simpatia muito grande, o ex-presidente Lula que ainda é muito respeitado e é um mito. Para eles é como se estivesse tirando o Mujica [ex-presidente do Uruguai] ou o papa Francisco.
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