- O Estado de S. Paulo
Temos dois caminhos a escolher e um deles significa andar ainda mais para trás
O Brasil perdeu. Estamos fora da Copa da Rússia. Discordo dos críticos e pessimistas de plantão, que tendem a nos diminuir e a menosprezar nossas conquistas. A seleção foi combativa, impôs respeito e nos fez acreditar que poderíamos sim conquistar o hexa.
Além da tristeza e da ressaca, só nos resta, porém, encarar que temos uma eleição pela frente. Em um país que respira futebol e que a cada quatro anos encara uma eleição majoritária e uma Copa do Mundo, não há como ignorar o sincronismo e deixar de arriscar um paralelo.
Essa Copa começou com um sentimento parecido com o que ainda temos hoje com as eleições. Até que a seleção entrasse em campo, o entusiasmo estava envergonhado. Com as cicatrizes de 2014 ainda abertas, havia aqueles que, receosos de outro vexame, preferiam não acreditar que um resultado positivo fosse possível. Outro grupo, o dos oportunistas, quis se apropriar desse receio e associá-lo a questões que nada tinham a ver umas com as outras, como se futebol não fosse um assunto em si no Brasil. Como se o verde-amarelo não fosse nossa expressão mais forte de nação.
Mas já no segundo jogo, o Brasil parou e a crença no País vitorioso voltou no hino cantado, no grito de gol e na bandeira empunhada com orgulho. Infelizmente, não fomos muito mais longe. Perdemos, vimos nossas crianças chorarem e choramos com elas. Mas saímos de cabeça erguida, com autoestima reconquistada e com respeito – por nós e pelos outros.
Agora acabou a Copa para nós, julho já avança e não há mais como adiar um debate que hoje só perde em interesse para aquele primeiro empate com a Suíça. Mas é hora de encarar nossos problemas de frente e entender a importância de uma eleição que, dentre tantas outras, nos coloca diante de uma bifurcação. Escolheremos entre um caminho fácil, vendido em discursos por pretensos salvadores autoritários – à esquerda ou à direita – ou um caminho claro e real, mas baseado em verdades difíceis.
Para fazer as escolhas certas precisamos nos lembrar, em cada um dos próximos 88 dias que nos separam do 7 de outubro, que o Brasil vive hoje uma das suas piores crises – e que ela foi fruto de escolhas erradas, mas também foi causada pela nossa omissão. Cavamos o maior dos buracos no campo fiscal, mas também assistimos hoje passivos ao esgarçamento das nossas instituições. Os poderes autônomos não mais entendem seu papel e moral e ética perderam espaço na cena nacional. O público virou privado e o privado se apoderou do público. A corrupção continua, apesar da Lava Jato, o patrimonialismo impera apesar dos discursos, o balcão político continua apesar do repúdio da sociedade, e o Judiciário, aparelhado, toma decisões políticas em completo abandono da sua imprescindível imparcialidade.
Temos uma eleição pela frente. E ela é, certamente, a nossa chance de retornar aos trilhos e evitar o abismo. Ela é o palco dos debates e das escolhas. Ela não pode ser o retrato da indiferença, pois temos dois caminhos a escolher e um deles significa andar ainda mais para trás.
Nelson Rodrigues, amante fervoroso do futebol, bem disse que a seleção é a pátria em calções e chuteiras e que Onestaldo, seu amigo de infância que cismava em menosprezar o Brasil e dizer que não tínhamos mesmo jeito, era o Narciso às avessas. Pois assim como nos enchemos de entusiasmo e de esperança em cada jogo da seleção, com o orgulho batendo no peito com força, temos de fazer despertar em nós a vontade de participar e da certeza do poder das nossas escolhas. São elas que vão determinar que, assim como nosso futebol não passou, também nosso País não passou.
O Brasil tem jeito. Daremos aos céticos um banho de democracia escolhendo um presidente que vai nos tirar do buraco. Não validaremos o discurso do ódio, da divisão, da truculência e do preconceito. Não deixaremos que as nossas instituições, aparelhadas e trabalhando para si, continuem atentando contra o País.
Precisamos de união e de fé. Fé já temos, apesar dos muitos Narcisos às avessas nos gorando no dia a dia. Agora nos falta a união. Esta terá de vir nas urnas porque, afinal, somos “rodriguianamente” Brasil, imensamente Brasil, eternamente Brasil.
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