Apesar de a campanha presidencial deste ano estar dominando corações e mentes no Congresso, ressurgiu nos últimos dias o interesse em retomar a discussão da reforma tributária. A intenção é colocar o tema em discussão e aprová-lo logo após as eleições. Como mudanças na Constituição, como é o caso da reforma tributária, não podem ser aprovadas enquanto estiver vigorando a intervenção federal no Rio de Janeiro, já tramita na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) proposta para suspendê-la e permitir a análise de propostas de emenda constitucional (PECs) no plenário.
O presidente Michel Temer abraçou a proposta como um "legado" que pode deixar do seu governo. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) também apoia a ideia. Ambos sabem a dificuldade que será conseguir a aprovação das duas casas do Legislativo, por duas vezes, mas estão embalados pelo fato de que alguns dos principais presidenciáveis também defendem mudanças, em maior ou menor grau. Na verdade, será difícil encontrar alguém contra uma reforma do sistema tributário, um dos culpados ao longo dos anos pelo recuo do Produto Interno Bruto (PIB) potencial, perda da competitividade do país e aumento da desigualdade, entre outras mazelas. Somente os litígios fiscais são estimados em até R$ 3,3 trilhões, ou metade do PIB; e a sonegação atinge quase R$ 500 bilhões.
Esses números contribuem para prejudicar a competitividade e a atração do capital externo. No ranking de 190 países do Banco Mundial em facilidade de pagar impostos, o Brasil está no 184º lugar, apenas à frente da República do Congo, Bolívia, República Centro-Africana, Chade, Venezuela e Somália.
Há muito tempo se discute a necessidade de uma reforma tributária no Brasil. Só não foi avante até agora por falta de interesse político. Ao longo do tempo, a situação apenas se agravou com a disputa entre Estados, municípios e a própria União pela arrecadação. Incentivos fiscais, desonerações, regras especiais e a guerra fiscal tornaram o sistema ainda mais complexo. A recessão do segundo semestre de 2014 a 2016 e a pífia recuperação que se seguiu exacerbaram os problemas. A situação crítica a que se chegou, para alguns especialistas, acaba favorecendo a disposição para a reforma, que ressurge como promessa de simplificar a tributação e abrir espaço para o crescimento econômico.
Uma das propostas de reforma tributária cuja discussão está mais adiantada na Câmara está sendo conduzida pelo relator da comissão do tema, deputado Luiz Carlos Jorge Hauly (PSDB-PR), que tomou como base a PEC 293/04, ainda da época do primeiro governo do ex-presidente Lula, que era originalmente focada no ICMS estadual e teve o escopo ampliado com o objetivo de realizar uma mudança mais abrangente. Na semana passada, foi protocolada mais uma proposta, a do economista Bernard Appy, do Centro de Cidadania Fiscal (CCiF), apresentada como uma emenda do deputado Mendes Thame (PVSP).
Embora diferentes, as duas propostas se inspiram na experiência internacional com o Imposto de Valor Agregado (IVA). Em síntese, pretendem unir impostos estaduais e municipais em uma versão do IVA, batizado de Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), que unificaria tributos e seria cobrado na cidade e Estado de destino dos produtos, ou seja, no local de consumo. Mas há diferenças na composição dos impostos, nas alíquotas propostas e nas regras de transição (Valor 16/8), pontos que deverão concentrar as negociações. Pela proposta de Hauly, haveria a unificação de nove tributos - ISS, ICMS, IPI, PIS, Cofins, Cide, salário-educação, IOF e Pasep - transição de seis anos para as empresas, e 15 anos para a nova divisão da receita com Estados e municípios. Appy sugere que o IBS unifique cinco tributos - IPI, PIS, Cofins, ICMS e ISS - com transição de 10 anos para os contribuintes e de 50 anos para a nova partilha entre os entes federativos.
As propostas não tocam diretamente em temas como impostos sobre patrimônio ou sobre a renda, mas sustentam que a equidade vai melhorar com uma menor penalização do consumo. Outras seis sugestões de reforma tributária foram apresentadas, a maioria de deputados buscando defender os interesses que representam. A movimentação indica que a proposta chega ao momento mais delicado, que vai determinar seu vai ou não atingir os objetivos almejados de simplificação da tributação, melhorar a competitividade e estimular o crescimento.
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