Militares do futuro governo Bolsonaro encontrarão ambiente diverso do que prevalecia no AI-5
O Ato Institucional nº 5, decretado há 50 anos, municiou o presidente da República de poderes absolutos. Facultou-lhe fechar o Congresso, cassar mandatos e direitos políticos, intervir em estados e municípios e ordenar o estado de sítio, tudo isso sem a possibilidade de revisão de seus comandos seja pelos legisladores, seja pelas cortes.
No contexto da radicalização de alguns grupos de esquerda, que aderiram à luta armada e ao cometimento de atentados, inaugurou a fase mais violenta da ditadura que havia se instalado quase cinco anos antes. A proscrição, a tortura, o assassinato e a censura patrocinados pelo regime se acentuariam até meados da década de 1970.
A consubstanciação da brutalidade do AI-5 num texto com dicção legalista produz grande estranhamento. Ali, afinal, a sintaxe do direito foi empregada para negar o próprio direito —e atestar a sua submissão à força e a nada mais.
O despojamento do verniz civilizatório naquele libelo autoritário ajuda a entender, pelo contraste, como é crucial o princípio da limitação do Poder Executivo numa democracia. Sem esse mecanismo, apreendido pelo pensamento e pela prática política do Ocidente após séculos de tribulações, não há barreira contra o despotismo.
A lição, pode-se afirmar aos 30 anos de vigência da Constituição de 1988, também foi absorvida no Brasil. O presidente da República foi submetido a um eficaz e multifacetado sistema de controles.
Algum excesso de prerrogativas do ocupante do Palácio do Planalto presente na largada da nova Carta, como a amplitude para a edição de medidas provisórias e a gestão do Orçamento, foi corrigido ao longo do tempo, sem contudo tomar-lhe a capacidade de governar em nome da maioria do eleitorado.
Os direitos fundamentais, massacrados pelo AI-5, recebem agora uma camada extra de proteção e não podem ser alterados nem sequer por emenda constitucional.
E não se trata de mero formalismo legal. O Ministério Público e o Judiciário, com plena autonomia, têm se destacado na defesa e na promoção do regime das liberdades. A imprensa atua sem amarras, e as disputas são resolvidas nas urnas, nas casas legislativas ou nos tribunais —não mais nos quartéis.
Nesse ambiente perpassado por controles e liberdades constitucionais, um apoiador do regime militar, o deputado Jair Bolsonaro (PSL), elegeu-se presidente. Oficiais das Forças Armadas foram nomeados para postos de comando na máquina do Executivo federal.
Vão experimentar o duro e incontornável desafio de governar numa democracia, na qual ninguém possui parcela avassaladora de poder. Ou se esmeram na arte de costurar apoios pela política ou fracassam. Fechou-se, e faz tempo, o atalho aberto pelo arbítrio em 1968.
Nenhum comentário:
Postar um comentário