Relatório da ONU registra 6.856 mortes suspeitas de opositores ao regime de Nicolás Maduro
Aplausos podem custar caro. Na semana passada, em Caracas, a cleptocracia venezuelana gastou mais de US$ 70 milhões numa auto-homenagem, com plateia composta por representantes de partidos políticos que se dizem progressistas e de esquerda. A ditadura de Nicolás Maduro pagou despesas de uma centena de delegações — a brasileira foi capitaneada pelo Partido dos Trabalhadores, fundador do agrupamento Foro de São Paulo, em cuja lista de associados se destacam também o PDT, o PCdoB e o PSB.
Seria mais uma milionária reunião de simpatizantes de ditaduras, não fosse pelo panorama insólito: a crise humanitária sem precedentes, que já provocou o êxodo de 4 milhões de venezuelanos, leva a economia a uma contração de 35% neste ano e pulverizou o salário mínimo mensal ao equivalente a US$ 7 (ou R$ 28).
Os convidados da cleptocracia ilharam-se num hotel em bairro nobre da capital venezuelana, onde para 80% da população faltam água e luz, e o sistema de transporte coletivo segue inoperante. Entretidos em mordomias governamentais e discursos contra o imperialismo, ficaram alheios à realidade à volta, caracterizada pelo colapso nos serviços de saúde, educação e abastecimento. Brindaram a Hugo Chávez, como corresponsáveis na construção e amparo de um regime que escreve uma das mais brutais páginas da história continental.
Esse epílogo está resumido no recente relatório do Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos. Ele registra 6.856 mortes suspeitas de opositores, execuções ordenadas nos 17 meses encerrados em maio, ou seja, pouco antes desse conclave em Caracas. Representa, por exemplo, mais do dobro do total de assassinatos e desaparecimentos contabilizados na ditadura de Augusto Pinochet, no Chile, de 1973 a 1990.
A ONU e o Foro Penal Venezuelano contaram 15.045 presos por motivos políticos entre janeiro de 2014 e maio de 2019. A maioria foi torturada, “com aplicação de choque elétrico, asfixia com sacolas de plástico, simulação de afogamento, pauladas, privação de água e comida, postura forçada e exposição a temperaturas extremas” — descrevem, com base em 558 entrevistas com vítimas e testemunhas. Foram documentados dezenas de casos de “violência sexual e de gênero contra mulheres e meninas” nas prisões. E 7.523 casos de mortes violentas nos bairros pobres das maiores cidades, em circunstâncias similares às de execuções extrajudiciais.
Sobre esse cenário não se ouviu uma única palavra dos convivas da cleptocracia venezuelana. Alguns, como o PT, chegaram a divulgar uma nota oficial de protesto, mas contra “o avanço do neoliberalismo e o imperialismo”. Embalados pelas mordomias ofertadas, os autoproclamados representantes de partidos políticos progressistas e de esquerda decidiram que o caos e as vítimas da ditadura da Venezuela simplesmente não existem.
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