Folha de S. Paulo
Na compra de vacinas e até no Cristo
Redentor
Ricardo
Salles pediu demissão, mas o estrago foi feito e vai prosseguir. Ele deixou
o caminho da boiada livre para o sucessor. Criou regras que dificultam a
aplicação de multas, solapou
os poderes da pasta ambiental limitando a atuação dos fiscais e os
substituindo, favoreceu o trabalho de garimpeiros ilegais e grileiros de
terras, bancou um esquema de contrabando de madeira. E comprou briga com a
Polícia Federal —único erro na sua estratégia de destruição. Foi o maior
predador da história da Amazônia debaixo do nariz do Exército.
Tudo isso só foi possível porque ele agiu com o amém de Bolsonaro, que agora o descarta para desviar a atenção do escândalo envolvendo a compra da vacina Covaxin. Salles tinha tanta liberdade que decidiu mandar no Cristo Redentor. Segundo o Ministério Público Federal, a gestão dele atuou para favorecer, sem licitação, o grupo Cataratas na exploração comercial do ponto turístico no alto do Corcovado.
São seis pequenas lojas de alimentação e
suvenires que funcionam aos pés do monumento, que antes da pandemia recebia
cerca de dois milhões de visitantes por ano. Uma delas estava nas mãos da mesma
família há quatro gerações. Bisavós do atual lojista ganharam a concessão da
Igreja Católica. Em julho de 2019 ele recebeu uma ordem de despejo da ICMBio,
órgão do Ministério do Meio Ambiente responsável pelo Parque Nacional da
Tijuca, área de floresta urbana que circunda o Cristo.
Na terça (22) as lojas foram desocupadas. A
Arquidiocese do Rio de Janeiro defende a permanência dos antigos comerciantes e
afirma que o terreno pertence à Igreja. Salles caiu e pode até ser preso, mas a
disputa judicial pela exploração do Santuário não acabou.
Às vésperas do seu aniversário de 90 anos,
do alto e de braços abertos, o Cristo Redentor tem acompanhado a transformação
do país em feira de milicianos. Mas não esperava que a sujeira chegasse tão
perto.
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