O Estado de S. Paulo
Não há garantia que a proposta apresentada
pelo governo Bolsonaro reduzirá os preços dos combustíveis, porque ela aumenta
as incertezas políticas e fiscais, que puxam a cotação do dólar para cima
O governo Bolsonaro está
achincalhando a Constituição. Faz dela
gato-sapato, emendável e remendável, até para atender a banais pretensões
eleitoreiras. Na segunda-feira, 6, propôs uma emenda à Constituição não para a
vida inteira, mas para durar menos de seis meses.
A proposta é o Projeto de Emenda à Constituição (PEC), ainda sem número, a “PEC do Diesel”, que garante uma compensação aos Estados que zerarem a alíquota de ICMS para o diesel e o gás de cozinha. Não está claro de onde sairão os recursos para ressarcir os Estados, que devem custar inicialmente R$ 46,4 bilhões aos cofres públicos, segundo estimativa feitas pelo senador Fernando Bezerra (MDB-PE). Até agora o governo não disse o que faria para compensar os municípios, que também perderiam participação no ICMS.
Não confundir essa “PEC do Diesel” com
o Projeto de Lei Complementar (PLP) 18/2022,
que considera combustíveis, energia elétrica, telecomunicações e
transporte público como bens ou serviços essenciais e, nessa condição, proíbe
que a taxação pelo ICMS passe dos 17%. Esse é um projeto que também tem seu
viés eleitoreiro, pelo seu objetivo imediato, que é o de reduzir o impacto dos
preços dos combustíveis sobre o custo de vida. Mas o mérito da lei é
inquestionável.
O projeto tem caráter permanente. Passou na
Câmara dos Deputados e agora tramita no Senado, onde enfrenta oposição dos governadores,
que pleiteiam compensações por essas perdas. No texto original, Estados e municípios só serão recompensados - em caso
de perda de arrecadação superior a 5% - e ela será
feita por meio de abatimento da dívida desses entes com a União. A PEC
pressupõe a aprovação do PLP-18 e, portanto, a compensação aos Estados
pelas perdas na arrecadação somente do diesel e do gás de cozinha até
31 de dezembro contadas até os tais 17%.
Se há fator positivo nesta “PEC do Diesel”, está em que, finalmente, o governo reconheceu que a tributação da energia elétrica e dos combustíveis é escorchante. Mas contém absurdos. O primeiro, já citado, é o de que mostra que a Constituição é purê de batatas que pode assumir qualquer forma até para atender a interesses eleitoreiros. Foi montada açodadamente, com pontas desamarradas.
O governo fala em usar recursos
extraordinários, não previstos no Orçamento, provenientes do
crescimento da arrecadação gerada pelo aumento de preços (inflação) das receitas com royalties, participações especiais e
dividendos da Petrobras e da
outorga com a privatização da Eletrobras, que
ainda não aconteceu, para indenizar os Estados. Não está claro se esses
excedentes serão suficientes para cobrir as novas despesas. Mas, para pagar
essas indenizações, o governo pede autorização do Congresso para furar o teto de gastos.
Não há garantia de que essa PEC reduzirá substancialmente os preços dos combustíveis, porque as incertezas políticas e fiscais provavelmente voltarão a puxar para cima a cotação do dólar. E para onde irá o preço dos combustíveis a partir de 1º de janeiro, quando a PEC e o interesse eleitoreiro caducarem?
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