Em entrevista ao Pulso, sociólogo e cientista político do Ipespe defende análise baseada em votos totais, que incluem nulos, brancos e abstenções
Por Bianca Gomes / O Globo
O senhor defende que as pesquisas eleitorais
sejam lidas por meio dos votos totais, e não dos votos válidos, como é feito
mais tradicionalmente na véspera das eleições. Por quê?
Quando saiu o resultado da eleição, no
domingo à noite, eu acompanhei os comentários e críticas e constatei que estava
havendo um grande equívoco. As pessoas estavam comparando literalmente alhos
com bugalhos. Alhos eram os votos válidos. Bugalhos, os votos totais. A
pesquisa é baseada numa amostra extraída do total dos 156,5 milhões de
eleitores. Então, o resultado das pesquisas precisa ser comparado com o
resultado da eleição levando-se em conta os 156,5 milhões de eleitores.
Qualquer outra comparação não faz sentido. Os votos válidos derivados das
pesquisas são apenas ilações, porque a pesquisa não consegue captar a abstenção
na sociedade. É importante que não se repita esse erro no segundo turno.
Por que predomina a cultura de olhar para
votos válidos em vez de votos totais?
É um problema que os institutos e os veículos de comunicação precisam refletir. É preciso melhorar a qualidade da divulgação, para que o eleitor compreenda que os números da véspera são números sob o total e que entre aquele número e o resultado das eleições há um espaço de mudança, pois as pesquisas não são prognóstico, elas medem atitude, não medem comportamento. A única pesquisa que pode medir o comportamento é a boca de urna, que não foi feita este ano. Quando você compara o resultado das pesquisas sob o total e o resultado do TSE sob o total, você vê que a votação do Bolsonaro é dentro do que a fotografia das pesquisas na véspera das eleições estavam mostrando.
Mas os votos do Lula, agora, aparecem
discrepantes. Por quê?
Há uma diferença de nove pontos. A votação
do Lula foi tragada, boa parte dela, pela abstenção. Lula perdeu no dia da
eleição cerca de 13 milhões de votos, sem nenhuma dúvida. E onde a abstenção
ocorre na sociedade? Ela é concentrada sobretudo nas camadas de menor
escolaridade, que é onde tem o voto de Lula. Sabemos que 45% dos eleitores do
Lula têm, no máximo, o fundamental completo. O nome da diferença do resultado
das pesquisas com o resultado da eleição chama-se abstenção. A explicação para
o Lula não ter levado a eleição no primeiro turno também se chama abstenção.
Como fica a abstenção no segundo turno?
Segundo turno, em geral, a abstenção
cresce. Em 2018, cresceu perto de 1,5 ponto de um turno para outro. Em
compensação, no segundo turno diminui o número de votos nulos, porque também a
anulação do voto não é deliberada. Não existe nem uma tecla para anular o voto,
a anulação do voto é erro. E, obviamente, esse erro se dá nas camadas de menor
escolaridade. Quem é o candidato mais prejudicado? O Lula. Então, se seguir o
mesmo comportamento de 2018, aumentar um pouco a abstenção, mas diminuir um
pouco o voto nulo, talvez uma coisa compense a outra.
Por que o cálculo dos votos válidos não
traz um resultado compatível com o do TSE?
Qual o equivalente à abstenção na pesquisa?
Como a abstenção é um comportamento, além de ilegal, socialmente ilegítimo, o
eleitor não confessa (na hora da pesquisa). Então, aparece nas pesquisas o
percentual de intenção de votos dos candidatos e uns 3% ou 2% de “não sabe” ou
“não respondeu”, além do branco e nulo, que fica em torno de 4%. O “não sabe”
ou “não respondeu”, que é o potencial de abstenção, vira 21% na eleição. E de
onde saem os outros 19%? Dos outros candidatos. Candidatos de terceira via,
nanicos, sempre perdem no dia da eleição. E perde um candidato como Lula que
tem uma forte concentração naquele segmento social que mais se abstém.
Nos votos válidos das pesquisas, se você
exclui indeciso e quem não sabe, a margem de erro não deveria aumentar?
Na verdade, esse voto válido da pesquisa talvez nem devesse ser feito, porque a pesquisa não traz quanto vai ser a abstenção. E quando o instituto chama de voto válido, ele passa uma ideia errada para o eleitor de que o instituto calcula voto. Instituto mede intenção. Voto é comportamento efetivo. Estou começando uma discussão para ver se podemos criar uma regra, uma bula para divulgação das pesquisas.
Um comentário:
Adorei a entrevista,eu conheço um monte de gente que é lulista,mas não vota,Bolsonarista que não foi votar conheci apenas um.
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