quinta-feira, 31 de julho de 2025

Para Trump, o Brasil é ameaça - Celso Ming

O Estado de S. Paulo

Pode parecer paradoxal, mas não é. O tarifaço do presidente Trump chegou como um golpe de tacape, mas o mercado até comemorou: previa-se o pior, que acabou não se concretizando porque o decreto isentou boa parte dos produtos mais importantes que antes estavam sob ameaça.

Escaparam da pancada aviões da Embraer, celulose, suco de laranja, minérios e certos produtos da Weg. Da pauta de exportações do Brasil, itens que não escaparam foram calçados, carnes, café e algumas frutas, como as mangas.

Isso explica por que, desse ponto de vista, o tarifaço produziu certo alívio por aqui. Sobre o PIB brasileiro, provavelmente não produzirá um impacto superior a 1%, e não mais os cerca de 4% previstos se todos os produtos fossem igualmente atingidos pela mega tarifa de 50%. É o que explica a alta de quase 1% na Bolsa, a esticada de 11% nas ações da Embraer, de 0,64% nas ações da Suzano e 0,74% nos papéis da Weg.

Ainda assim, é preciso ver quais serão as maiores vítimas entre os exportadores brasileiros para os Estados Unidos, além dos pecuaristas, cafeicultores, de certos produtores de frutas frescas e de calçadistas.

Ao contrário do que aconteceu com outros países ou blocos de países, esse tarifaço não foi consequência de nenhuma negociação, ainda que desigual. Foi resultado de imposição unilateral dos Estados Unidos.

Os problemas de comércio exterior foram esgarçados. Em alguns casos, as perdas setoriais não podem ser ignoradas. Mas, olhando com casca e tudo, o impacto econômico pode ser absorvido, desde que o governo Lula não apele para revides de peso pena em cima do peso pesado, na base do respeito ao princípio de reciprocidade e tal.

Ninguém imaginava que, na cabeça de Trump, o Brasil fosse uma ameaça tão grande para a salvação do império, a ponto de merecer tudo isso.

A questão política, a geopolítica e a das relações institucionais têm natureza e desenlace mais complicado.

Se havia alguma dúvida, não há mais. Os ataques de Trump tiveram pelo menos três grandes objetivos. O primeiro deles, foi bombardear a atuação do juiz do Supremo Alexandre de Moraes tanto no julgamento do ex-presidente Bolsonaro por tentativa de golpe de Estado, como na atuação das big techs. Por aí, há não apenas uma tentativa de interferência brutal na operação de um organismo independente, de Estado, o Supremo, mas, também, de tentar viabilizar a candidatura de Bolsonaro para as eleições de 2026.

Segundo, Trump agiu para inibir qualquer tentativa do presidente Lula e dos dirigentes do Brics de tirar força do dólar como meio de pagamento internacional e como moeda global de reserva, mediante a utilização de moedas do grupo para liquidar transações dentro do bloco.

O terceiro objetivo, provavelmente mais importante, é desviar o Brasil e outros países emergentes da influência cada vez maior da China e da Rússia.

 

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