DEU NO JORNAL DO BRASIL
Antes que a direção favorável dos ventos mude, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva revelou ter chegado sem esforço à conclusão de que deve ao poder tudo que aprendeu e, em seguido, se convenceu sem dificuldade de que ele também foi bom para o Brasil. A conclusão, portanto, é que tudo acabou bem para os dois.
A recíproca não deixa de ser verdadeira. Os brasileiros também devem ter aprendido com ele o suficiente. O Brasil, nem tanto. Terá desaprendido o suficiente para temer pelos costumes políticos. Sem ter como aplicar politicamente o sucesso nas pesquisas, Lula se recusa a ouvir falar de consequências imprevisíveis, que não mostram pressa em se manifestar. Como dizia o próprio conselheiro Acácio, que cedia precedência às causas, as consequências podiam esperar. Por culpa de outras questões, a entrevista ao jornal espanhol El País ficou sem repercussão e um Lula diferente, sem leitores.
Chefe de Estado (observou, certamente em portunhol, que vem a ser a maneira espanhola de pronunciar palavras em português) não é pessoa, mas instituição. Não tem vontade própria todo santo dia e, se quiser governar, fica obrigado a fazer acordos que sejam possíveis. Olha o mensalão aí. O presidente Lula carimbou a definição segundo a qual política é a arte do possível, sem desconsiderar os que pensam exatamente o contrário.
Mesmo assim, a circunstância presidencial não tem impedido Lula de tentar o impossível e aprender que recuar também é atributo político, sem o qual governantes se estrepam. Quanto à conclusão de que foi bom para o Brasil, o tempo dirá. Que ele se tenha em conta mais alta do que os que o precederam, fica também para depois. A última palavra será a do tempo, e pela boca da História, que não aprecia lorotas.
Luiz Inácio Lula da Silva ainda aproveitou a oportunidade para declarar que nada o obriga a gostar de um presidente porque é de esquerda ou de direita; ou, ao contrário, de abominar outro governante por ser direitista. Estando em solo espanhol, foi delicadeza fazer a barretada com a citação nominal do ex-presidente José Maria Aznar, conservador, e do socialista José Luis Zapatero. Uma no cravo, outra na ferradura. E aí Lula foi mais Lula ao sacar do bolso a frase embrulhadinha para concluir que, no exercício do poder, sou um cidadão, como diria, multinacional e não multideológico. Ainda bem. Que seria de nós se não fosse?
À medida que o fim do segundo mandato tarda mas não falha, o presidente acelera o processo político com o que aprendeu e o que, ao sair, ainda está aprendendo. Deu dados suficientes para ser decifrado ao menos um dos mistérios que envolvem a lenda de que era metalúrgico de esquerda e conseguiu, sem alarde, fazer mais do que a direita pretendia e muito menos do que seu anterior discurso de esquerda autorizava.
A afirmação de que Marx que não é autor cujas páginas costume frequentar recomendou primeiro construir o capitalismo e depois fazer o socialismo é, primeiro, um escudo, depois, uma derrapagem. A questão é que o capitalismo jamais designaria o socialismo herdeiro do seu saldo histórico. Há uma ordem natural que o capitalismo não precisou observar, pois existiu antes de haver teoria e continua fagueiro até hoje. Já o socialismo encheu tratados de teorias luminosas, que a realidade insiste em contradizer, na prática, para baralhar as cabeças. Trata o socialismo como o primo pobre que estudou demais e se empanturrou de teoria e dissidências intermináveis.
A história vai ter dificuldades em classificar Lula, seja à esquerda, que ele recusa terminantemente, seja à direita, na qual não confia por instinto. Na verdade, ele reeditou o personagem de Molière que se abalou quando soube que era prosador sem desconfiar, ainda que por exclusão: não sendo poeta, só lhe restava ser prosador. Não havia outra. Lula também ficou confuso, sem saber se era, politicamente, de esquerda ou de direita, até perceber que, não sendo esquerdista, não tinha como não ser de direita. Pronto. Guardou segredo e se satisfez em recuar para o centro com uma carta de intenções que lhe valeram (as intenções, fique claro) a eleição e a reeleição e ainda lhe reservam o juízo final.
(Por serem inesgotáveis, entrevistas do presidente Lula continuam sempre na próxima oportunidade)
Antes que a direção favorável dos ventos mude, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva revelou ter chegado sem esforço à conclusão de que deve ao poder tudo que aprendeu e, em seguido, se convenceu sem dificuldade de que ele também foi bom para o Brasil. A conclusão, portanto, é que tudo acabou bem para os dois.
A recíproca não deixa de ser verdadeira. Os brasileiros também devem ter aprendido com ele o suficiente. O Brasil, nem tanto. Terá desaprendido o suficiente para temer pelos costumes políticos. Sem ter como aplicar politicamente o sucesso nas pesquisas, Lula se recusa a ouvir falar de consequências imprevisíveis, que não mostram pressa em se manifestar. Como dizia o próprio conselheiro Acácio, que cedia precedência às causas, as consequências podiam esperar. Por culpa de outras questões, a entrevista ao jornal espanhol El País ficou sem repercussão e um Lula diferente, sem leitores.
Chefe de Estado (observou, certamente em portunhol, que vem a ser a maneira espanhola de pronunciar palavras em português) não é pessoa, mas instituição. Não tem vontade própria todo santo dia e, se quiser governar, fica obrigado a fazer acordos que sejam possíveis. Olha o mensalão aí. O presidente Lula carimbou a definição segundo a qual política é a arte do possível, sem desconsiderar os que pensam exatamente o contrário.
Mesmo assim, a circunstância presidencial não tem impedido Lula de tentar o impossível e aprender que recuar também é atributo político, sem o qual governantes se estrepam. Quanto à conclusão de que foi bom para o Brasil, o tempo dirá. Que ele se tenha em conta mais alta do que os que o precederam, fica também para depois. A última palavra será a do tempo, e pela boca da História, que não aprecia lorotas.
Luiz Inácio Lula da Silva ainda aproveitou a oportunidade para declarar que nada o obriga a gostar de um presidente porque é de esquerda ou de direita; ou, ao contrário, de abominar outro governante por ser direitista. Estando em solo espanhol, foi delicadeza fazer a barretada com a citação nominal do ex-presidente José Maria Aznar, conservador, e do socialista José Luis Zapatero. Uma no cravo, outra na ferradura. E aí Lula foi mais Lula ao sacar do bolso a frase embrulhadinha para concluir que, no exercício do poder, sou um cidadão, como diria, multinacional e não multideológico. Ainda bem. Que seria de nós se não fosse?
À medida que o fim do segundo mandato tarda mas não falha, o presidente acelera o processo político com o que aprendeu e o que, ao sair, ainda está aprendendo. Deu dados suficientes para ser decifrado ao menos um dos mistérios que envolvem a lenda de que era metalúrgico de esquerda e conseguiu, sem alarde, fazer mais do que a direita pretendia e muito menos do que seu anterior discurso de esquerda autorizava.
A afirmação de que Marx que não é autor cujas páginas costume frequentar recomendou primeiro construir o capitalismo e depois fazer o socialismo é, primeiro, um escudo, depois, uma derrapagem. A questão é que o capitalismo jamais designaria o socialismo herdeiro do seu saldo histórico. Há uma ordem natural que o capitalismo não precisou observar, pois existiu antes de haver teoria e continua fagueiro até hoje. Já o socialismo encheu tratados de teorias luminosas, que a realidade insiste em contradizer, na prática, para baralhar as cabeças. Trata o socialismo como o primo pobre que estudou demais e se empanturrou de teoria e dissidências intermináveis.
A história vai ter dificuldades em classificar Lula, seja à esquerda, que ele recusa terminantemente, seja à direita, na qual não confia por instinto. Na verdade, ele reeditou o personagem de Molière que se abalou quando soube que era prosador sem desconfiar, ainda que por exclusão: não sendo poeta, só lhe restava ser prosador. Não havia outra. Lula também ficou confuso, sem saber se era, politicamente, de esquerda ou de direita, até perceber que, não sendo esquerdista, não tinha como não ser de direita. Pronto. Guardou segredo e se satisfez em recuar para o centro com uma carta de intenções que lhe valeram (as intenções, fique claro) a eleição e a reeleição e ainda lhe reservam o juízo final.
(Por serem inesgotáveis, entrevistas do presidente Lula continuam sempre na próxima oportunidade)
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