• O Congresso parece não entender o risco que o país corre. Há um clima de baile no salão do ‘Titanic’, enquanto o navio se aproxima do iceberg
A quarta-feira foi um dia revelador das mazelas do momento, com o país travado numa crise fiscal séria, enquanto tenta sair dela e, assim, dar algum horizonte de segurança à sociedade, em especial aos agentes dos mercados. Sem eles, não giram as engrenagens da produção, do emprego, da renda. Mas anteontem, com este pano de fundo, o Senado teve de adiar a votação de parte do ajuste fiscal — MP 655, que atenua distorções no seguro-desemprego e abono salarial —, quando ficou claro o risco de derrota da proposta do governo; e no mesmo dia, como se o país estivesse em tempos de bonança, a Comissão de Constituição e Justiça, também do Senado, aprovou um reajuste de salários no Judiciário que custará R$ 25 bilhões em quatro anos.
Os sinais que a realidade emite e o comportamento do Congresso são de sentidos opostos. Há um clima de baile no salão do “Titanic”, enquanto o navio se aproxima do iceberg. Ora, as contas públicas fecharam 2014 sem sustentabilidade. Impossível sobreviver muito tempo com um déficit público nominal de 6,7% do PIB, uma dívida bruta acima do 63%, e assim por diante. O ajuste, incompreendido em parte do Congresso e no PT, partido do governo, é para evitar o pior: fuga de capitais, explosão do câmbio e da inflação, recessão selvagem, à la Grécia. E ainda neste cenário há um governo fraco e políticos inconsequentes, desinformados da real situação do país, tudo potencializado pela adesão da oposição ao estilo destrutivo com que o PT combateu os governos FH. Dá-se o troco, mas prejudicam-se todos.
Entre as causas da debilidade planaltina está o próprio estelionato praticado por Dilma e cúpula do PT na campanha, com o aceno de um quadro econômico irreal. Manipulou-se a grande massa de brasileiros desinformados, alertando-os contra medidas que a oposição tomaria caso vencesse as eleições, mas que tinham mesmo de ser adotadas. E por isso Dilma as adota.
Com isso, sua popularidade naufragou junto aos eleitores, e ela perdeu apoio também no PT, no qual sempre foi um corpo estranho. Acertou na unção de Michel Temer na coordenação política, mas já deve ter percebido que sequer o antigo instrumento do fisiologismo funciona como antes, pois o político patrimonialista prefere se posicionar de forma demagógica junto ao eleitorado, diante de um governo fragilizado. O PDT é um exemplo: vota contra o ajuste e continua no Ministério. A melhor alternativa é persistir no convencimento do Congresso. Outra, pior, é abandonar a negociação política e pesar a mão nos cortes, mas fazê-los de forma que os investimentos sejam mais uma vez penalizados. Ou abrir uma rodada deplorável de aumento de impostos, cujo resultado será impedir uma retomada do crescimento em prazo razoável.
Falta, também, mais empenho da presidência em fazer o que é preciso, como o demonstrado na aprovação pelo Senado do jurista Luiz Fachin para o STF. Talvez escasseie convicção.
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