- Folha de S. Paulo
BRASÍLIA - O ministro Gilmar Mendes, do STF (Supremo Tribunal Federal), criticou nesta terça-feira (21) a Procuradoria-Geral da República e a Polícia Federal por terem supostamente vazado informações das operações Lava Jato e Carne Fraca.
Segundo Mendes, a divulgação de dados sob sigilo é uma "forma de chantagem implícita ou explícita". "É uma desmoralização da autoridade pública", disse.
Ele mencionou a coluna do último domingo (19) da ombudsman da Folha, Paula Cesarino Costa, que tratou dos pedidos de abertura de inquéritos feitos pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, ao STF.
Segundo ela, a divulgação do material se deu pelo que chamou de "entrevista coletiva em off" - sem identificação da fonte - da Procuradoria a veículos de imprensa. Ela menciona telejornais, rádios, portais de internet, a Folha e os jornais "O Estado de S. Paulo", "O Globo" e "Valor".
"Cheguei a propor no final do ano passado o descarte do material vazado, uma espécie de contaminação de provas colhidas licitamente e divulgadas ilicitamente e acho que nós devemos considerar esse aspecto", afirmou o ministro do STF.
"A novidade trazida pela publicação da ombudsman está na divulgação de um novo instrumento de relacionamento com a imprensa, a entrevista coletiva em off", ressaltou Mendes.
De acordo com ele, "a imprensa parece acomodada com esse acordo de traslado de informações".
O ministro disse que a PGR deve explicações ao STF. " As investigações devem por objetivo produzir provas, não entreter a opinião pública ou demonstrar autoridade", disse.
E afirmou: "Quem não tiver essa noção de que não estão em jogo os personagens que hoje ocupam as funções, mas as instituições, é um irresponsável. Não é digno de ocupar os cargos que porventura está a ocupar".
Segundo o ministro, o vazamento de informações sob sigilo é "eufemismo para um crime".
Presente à sessão, a subprocuradora da República Ela Wiecko afirmou que o discurso de Mendes expõe "defeitos em todas as instituições". "A sua fala se centrou muito na Procuradoria-Geral da República, no procurador-geral, não vou contestar, não sei detalhes desta suposta entrevista coletiva em off", disse.
"Uma coisa que me chama muito a atenção é o poder da mídia. Aqui no caso a ombudsman da Folha inclusive critica o próprio jornal. E é isso que vejo: a mídia estabelece o momento, eles fazem investigação, sim, ministro, têm acesso, não sei como, mas eles têm muitas informações e estabelecem o momento em que colocam essas notícias a público", disse. Segundo ela, o princípio da legalidade deve ser respeitado.
Mendes então rebateu: "A mídia não estaria divulgando nomes se esses nomes não estivessem sido fornecidos. É muito claro, não vou acreditar que a mídia teve acesso a partir de uma sessão espírita, isso parece ser evidente".
"Não tenho dúvidas de que aqui está narrado um crime. A Procuradoria não está acima da lei", disse o ministro.
Procurada pela Folha, a assessoria de imprensa da PGR disse que o órgão não vai se manifestar.
No contexto de sua fala, feita em sessão da 2ª Turma, da qual faz parte, Mendes criticou a divulgação do nome do ministro da Justiça, Osmar Serraglio (PMDB), flagrado em uma interceptação na Operação Carne Fraca, da Polícia Federal.
Ele compara o episódio a um vazamento de delação de empreiteira (no caso, a OAS), em agosto do ano passado, que mencionaria o ministro Dias Toffoli.
"É claro que isso tem um propósito destrutivo como acabam de fazer com o ministro da Justiça ao dizer que ele fez um telefonema para uma autoridade envolvida nesses escândalos", disse. No caso da gravação telefônica que menciona Serraglio, a divulgação de seu teor foi autorizada pela Justiça.
"Um delegado decide fazer uma operação, a maior já realizada no Brasil, para investigar a situação de carnes e anuncia que estaríamos comendo carne podre e que o Brasil estava exportando para o mundo carne viciada. Por que ele fez isso? Porque num quadro de debilidade da política, não há mais anteparo, perderam os freios, não há mais freios e contrapesos", afirmou Mendes.
O ministro Dias Toffoli adotou discurso parecido. Segundo ele, o Judiciário deve evitar o que classificou de "pirotecnia" em relação à ação da PF no caso das carnes. "Sem contraditório e sem ampla defesa, estão colocando pessoas e setores da economia inteiros sob suspeita", disse.
"Se todos comêssemos carne podre não estaríamos em sessão, mas no hospital", disse. A PF ainda não se manifestou sobre as declarações dos ministros.
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