- Revista Será?
Conservador é quem rejeita mudanças, indicando que está satisfeito com a situação e que imagina possível manter as regras atuais no futuro, embora sejam evidentes os sinais de reestruturações econômicas e sociais. Quem é contra as reformas em discussão no Brasil não quer mudança e, portanto, é conservador. Os sistemas de regulação na sociedade e na economia não podem ser rígidos e definitivos, porque devem se adaptar e renovar para acompanhar as transformações das estruturas e das relações de produção, de modo a garantir o equilíbrio entre proteção social e eficiência econômica.
Como as estruturas e relações de produção estão mudando radicalmente no mundo e no Brasil, manter as velhas e rígidas regras do século XX é reacionário, anacrônico e insustentável. Isto vale, principalmente, para a reforma da previdência e para a reforma trabalhista, considerando dois fenômenos de grande relevância: a profunda mudança demográfica e as intensas transformações tecnológicas, com impactos nas relações de produção e de trabalho.
O sistema previdenciário brasileiro, construído quando a estrutura demográfica era predominantemente jovem, não cabe mais num país que envelhece de forma acelerada. Em 2040, o Brasil terá mais idosos que crianças e adolescentes, quase 20% da população terão mais de 65 anos, resultado de um crescimento médio de 3,68% ao ano, muitas vezes acima do crescimento de apenas 0,42% ao ano da população total. Os benefícios dos trabalhadores inativos vão crescendo muito mais rápido do que a contribuição dos ativos, anunciando a falência do sistema. Mas os conservadores querem simplesmente manter o sistema previdenciário atual, cheio de injustiças e privilégios, deficitário e insustentável no futuro.
A manutenção das regras atuais da previdência vai provocar a implosão do sistema, com prejuízo de todos, inclusive dos atuais aposentados que não serão atingidos por nenhuma reforma devido ao chamado “direito adquirido”. É bom lembrar da Grécia, onde o sistema implodiu e atropelou mesmo estes direitos adquiridos.
Grupos e partidos conservadores defendem também a manutenção das rígidas regras trabalhistas definidas no século passado, quando a produção era também rígida, hierarquizada e verticalizada. Essas regras não cabem mais nas relações de produção e de trabalho que emergem com a revolução tecnológica e organizacional, e que demandam um sistema de regulação compatível com a flexibilidade do trabalho e com o declínio do emprego tradicional, substituído por novas e inovadoras formas de trabalho (flexível, dinâmico e instável) e novo perfil de profissões, empresas e negócios. A manutenção da atual legislação trabalhista não ajuda a proteger o trabalhador do vendaval das mudanças tecnológicas que estão redefinindo as relações de produção e a organização do trabalho. Por outro lado, esta manutenção compromete gravemente a competitividade da economia e, como resultado, a geração de emprego no Brasil, melhor forma de proteger os trabalhadores.
A discussão não pode ser contra ou a favor das reformas, mas, entendendo que são indispensáveis, sobre a natureza e os conteúdos das mudanças que criem novos mecanismos de regulação, capazes de equilibrar proteção social e eficiência econômica, nas condições emergentes do novo paradigma de desenvolvimento. Mas ser simplesmente contra reformas é conservador e reacionário. Como dizia o saudoso Fernando Lyra noutro contexto, os segmentos organizados da sociedade e os partidos políticos que se mobilizam hoje contra as reformas são a “vanguarda do atraso”.
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