Por Juliano Basile | Valor Econômico
WASHINGTON - Ele foi a pessoa mais criticada no Brasil durante os dias em que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) julgou a chapa Dilma-Temer e registrou picos nessa posição após ter proferido o voto decisivo que manteve o presidente Michel Temer no cargo, no instante em que a votação estava empatada em três a três, mas Gilmar Mendes não está nem aí.
Segundo pessoas próximas ao ministro, ele não tem dificuldades em ser criticado e nem mesmo xingado nas ruas e na internet. "O que ele não admite são mentiras a seu respeito", dizem.
Gilmar tornou-se o juiz de confronto por excelência no Brasil. Ele não apenas vota as questões mais importantes do país como promove e articula reformas na política e na economia, conversa cotidianamente com deputados, senadores e ministros, tem linha direta de contato com o presidente e fala em tom elevado tudo o que pensa, mesmo que isso vá incomodar meio mundo e ainda voltar-se contra ele próprio.
Com essa conduta, Gilmar tornou-se não apenas a figura mais polêmica do TSE e do Supremo Tribunal Federal (STF), que vêm a ser as duas cortes mais importantes do país hoje. As declarações que atingem a Polícia Federal, o Ministério Público, partidos políticos e, em algumas vezes, até colegas de tribunais acabaram alçando o ministro à condição de um dos maiores polemistas do Brasil. E isso num cargo que tradicionalmente teria a função de servir como o de pacificador do país.
Em condições normais, os ministros do Supremo resolveriam conflitos, promoveriam soluções às questões nacionais e pacificariam o Brasil, principalmente nos momentos em que a classe política caminha para o caos e o desentendimento.
Já Gilmar Mendes atua muitas vezes em ritmo de provocação de modo a fazer advertências que, na visão dele, fariam as coisas se moverem rumo a mudanças que ele julga necessárias para ajustar a situação.
"Ele dá declarações que obrigam as pessoas a se mexerem", comentou uma pessoa próxima ao ministro. "Esse impulso que ele dá acaba ajudando a movimentar as questões", defendeu. Só que muitas vezes essa atuação cria novos conflitos, especialmente para o ministro.
Em avaliação feita recentemente, nos Estados Unidos, sobre os dilemas do Supremo, o ex-ministro do STF Nelson Jobim, que ocupou a cadeira que, hoje, é da presidente da Corte, Cármen Lúcia, disse que falta liderança que tire os julgamentos dos grandes processos da realização de anseios individuais dentro do tribunal. "Não há quem lidere e Gilmar opera no conflito", comentou.
Ao mesmo tempo em que é provocativo, alimentando seguidas polêmicas com suas declarações, Gilmar é também um reformista. Assim que assumiu o comando do TSE, em maio de 2016, o ministro se colocou uma missão: a aprovação de uma reforma política no país. Para ele, é necessário um novo sistema para as eleições de 2018, já que o STF, sem o seu voto, derrubou as doações de empresas às campanhas.
"Nós vamos para uma eleição grande, em 2018, sem modelo. Só com as pessoas físicas doando, algo que não há tradição no Brasil", explicou o ministro em visita à Universidade de Harvard, em abril passado. "Então, vamos ficar entregues ao crime organizado ou a algumas organizações que têm modo próprio de financiamento? Corremos o risco de termos uma eleição muito distorcida. Daí o meu engajamento, desde que assumi a Presidência do TSE para fazer a reforma", justificou.
O prazo final para que se elaborem as regras que irão reger as eleições de 2018 se encerra no fim de setembro.
Ao assumir a campanha por uma reforma política, o ministro tornou-se promotor de mudanças no cenário político nacional ao mesmo tempo em que atua como julgador. Ele passou a convocar autoridades para discutir o tema publicamente. Imbuiu-se, assim, de dois papéis simultâneos - promotor e juiz.
Mais recentemente, Gilmar fez o mesmo quanto à reforma trabalhista. Ele ajudou o Tribunal Superior Eleitoral (TST) a organizar estudos sobre o que pode ser feito nessa área enquanto o Congresso discute a reforma. Mas simultaneamente a esse apoio, o ministro declarou num evento, em abril, que o TST estaria funcionando como "um laboratório do PT" e contaria com simpatizantes da CUT.
De uma só vez, Gilmar desagradou não apenas o partido e a central sindical, que já o contam como adversário, como motivou uma nota de protesto do presidente do tribunal, ministro Ives Gandra Martins Filho, de quem é amigo e aliado.
Ao agir dessa forma, Gilmar provoca os seus interlocutores, como fez no fim do julgamento do TSE que manteve Temer na Presidência, quando ironizou os colegas que votaram em sentido inverso ao seu, alertando para consequências supostamente negativas de suas conclusões.
As múltiplas faces do ministro - julgador, promotor de reformas e polemista - indicam uma personalidade que quer abraçar várias causas ao mesmo tempo. A principal, no momento, é a reforma política e ele fez várias menções a ela em discurso final, após proferir o voto decisivo no TSE. Mas as manchetes foram: "Gilmar salva Temer". A defesa de sua causa pouco repercutiu. Já as críticas a ele deverão ser cada vez maiores daqui em diante.
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