Acertadamente, o Supremo Tribunal Federal (STF) proibiu, em setembro de 2015, a doação de pessoas jurídicas a partidos e campanhas políticas, por reconhecer que esse tipo de financiamento desrespeita a Constituição de 1988. As empresas não têm direitos políticos e, portanto, não lhes cabe interferir no processo eleitoral por meio de doações aos partidos. Além disso, esses repasses de dinheiro às campanhas envolviam interesses no mínimo pouco compatíveis com a isenção que o poder público deve manifestar em todas as esferas de sua atuação.
Como já era previsível, o STF, ao definir que estava encerrada a principal fonte de receita até então dos partidos, afetou fortemente o financiamento das campanhas eleitorais e até hoje alguns políticos tentam fazer o Estado assumir essa conta, com o aumento da destinação de recursos públicos aos partidos. Logicamente, é preciso rejeitar esse tipo de manobra, que também fere a Constituição. Os partidos são entidades privadas e devem ser sustentados por contribuições voluntárias dos eleitores. É a população, no exercício de sua liberdade política, quem deve escolher quais ideias e projetos políticos deseja sustentar. Quando se transfere essa decisão ao Estado, além de afastar ainda mais a sociedade da política, ocorre uma violação da liberdade política individual.
É necessário, portanto, preservar o sentido da decisão do STF que, além de outros benefícios para a moralidade pública, devolve ao cidadão o seu protagonismo no processo eleitoral. Logicamente, com o reconhecimento da inconstitucionalidade do financiamento da política por empresas, ganham enorme importância as doações de pessoas físicas aos partidos políticos. Na verdade, elas voltam a ter a relevância que sempre deveriam ter tido, como elemento inarredável da liberdade política.
Sendo assim, chama a atenção a frágil estrutura da Justiça Eleitoral para fiscalizar as contas dos partidos, sejam as das campanhas eleitorais, sejam as que as organizações partidárias são obrigadas a apresentar anualmente. Conforme reportagem do Estado, a Justiça Eleitoral tem apenas 148 servidores escalados para fiscalizar os dados dos partidos, que, só em 2017, receberam R$ 819 milhões do contribuinte.
Os Tribunais Regionais Eleitorais, que analisam contas dos candidatos a deputados, senadores e governadores, bem como as contas dos diretórios estaduais, têm apenas 137 fiscais em todo o Brasil. No Tribunal Superior Eleitoral (TSE), responsável por avaliar as contas dos candidatos a presidente da República e as dos diretórios nacionais, há 11 fiscais.
Divulgado em abril, um estudo comparou a Justiça eleitoral brasileira com a do México. Lá, existem 9 partidos e são 350 servidores para fiscalizar as contas eleitorais. Aqui, são 137 fiscais para 35 partidos. Um servidor ouvido pelo Estado admitiu que, nas atuais condições, é impossível fazer uma “análise profunda e absoluta” das contas.
Mais do que discutir a destinação de mais recursos públicos aos partidos políticos, faz-se necessário capacitar a Justiça eleitoral para realizar eficazmente seu trabalho de fiscalização. Especialmente em matéria eleitoral, não cabe fingir que as coisas estão funcionando, como se bastasse uma avaliação superficial.
Não há dúvida de que a decisão do STF de proibir doações empresariais acaba por aumentar o trabalho da Justiça Eleitoral, já que, nesse novo regime, deve haver um maior número de doações de pessoas físicas. Tal realidade só aumenta a importância de prover o poder público da necessária estrutura para uma fiscalização eficiente, capaz de descobrir eventuais fraudes nas contas partidárias. Como reconheceu a Suprema Corte, a origem das doações não é uma questão burocrática – ela interfere na qualidade da democracia.
O que seria desprovido de todo sentido é abandonar ou fazer minguar um sistema eleitoral apoiado nas doações de pessoas físicas simplesmente porque sua fiscalização é mais difícil. Afinal, o mérito da democracia não está em eventual facilidade.
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