Ministro da Economia diz que, sem a reforma da Previdência, proporá desvincular gastos
A franqueza demonstrada pelo recém-empossado ministro da Economia, Paulo Guedes, é pouco usual em Brasília, onde declarações inábeis não raro criam dificuldades políticas desnecessárias. Ao assumir o posto nesta quarta (2), ele expôs diagnósticos e prioridades corretas, mas ainda assim deu motivo para certa inquietação.
De melhor, exibiu entendimento amplo das distorções da Previdência, que não se limitam ao gasto excessivo —a diferença entre os regimes dos servidores públicos e dos demais trabalhadores se mostra, sobretudo, “uma fábrica de desigualdades”, como descreveu.
Reforçou, assim, a primazia da reforma das aposentadorias, em nome da qual havia recomendado em novembro uma “prensa” no Congresso e provocado mal-estar no meio político. Agora, a estranheza vem de Guedes anunciar desde já um plano para o caso de derrota legislativa do projeto.
Este seria, disse, uma proposta de emenda constitucional destinada a eliminar, de forma drástica, as regras que determinam aplicações mínimas das receitas em determinadas áreas, notadamente educação e saúde. Desvincular o Orçamento, conforme o jargão técnico.
Tal ideia, que já havia circulado antes da posse da nova equipe, deve incluir ainda o fim da correção automática de valores como os dos benefícios assistenciais, trabalhistas e previdenciários. “Desindexa, desvincula e desobriga todas as despesas e receitas da União”, conforme as palavras do ministro.
Pode-se interpretar o plano como mero exercício de realismo e lógica, pois reformar a Previdência é, sem dúvida, empreitada das mais árduas. O governo incorrerá em riscos, entretanto, se der a entender que considera sua alternativa igualmente satisfatória.
Esta Folha defende a revisão das vinculações orçamentárias, para que União, estados e municípios possam alocar suas receitas de acordo com as escolhas políticas e as circunstâncias de cada momento e local. Mas fazê-lo sem equacionar as despesas com aposentadorias tenderia a aprofundar distorções das políticas públicas.
De imediato, os ajustes inevitáveis dos desembolsos governamentais sacrificariam verbas de educação, saúde e benefícios sociais, voltadas para a parcela mais pobre da população. Enquanto isso, setores organizados e influentes tratariam de assegurar suas vantagens.
É fato que esse conflito distributivo já foi explicitado pela instituição do teto constitucional para os gastos da União —a compreensão da finitude dos recursos, afinal, faz ver que contemplar alguns sempre implica dizer não a outros.
Justamente por isso fica evidente o imperativo de uma reforma previdenciária que combata as injustiças apontadas pelo ministro. Ela demanda um persistente trabalho de convencimento da sociedade, do qual não se deve tirar o foco.
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