O ministro da Fazenda, Paulo Guedes, fez ontem, ao tomar posse, a até agora mais ampla e séria exposição de para aonde o governo de Jair Bolsonaro pretende conduzir a economia nos próximos 4 anos. É uma mudança radical em relação às políticas econômicas executadas desde a redemocratização e tem inspiração liberal. O plano de Guedes parte de um diagnóstico forte e possui um leque coerente de medidas para atacar o que ele julga ser o "mal maior", o desequilíbrio dos gastos públicos, que atravessou todas as tentativas de estabilização ocorridas no país.
Será preciso uma ampla reforma de Estado para atacar a ruína fiscal do país em várias frentes. O teto de gastos é fundamental, para o ministro, e permitirá romper a tradição "monotônica e ininterrupta" de aumento dos gastos públicos, que partiram de 18% do PIB há três décadas e chegam a 36% do PIB, excluída a conta dos juros. O ideal, para o ministro, é diminuir a carga de impostos em algo ao redor de 20% do PIB. Sem minimizar o desafio, Guedes disse que "não será preciso cortar os gastos dramaticamente, apenas não deixar que subam da forma como subiam".
Se a reforma da Previdência for aprovada, ele calcula que um par de anos com despesas reais sem variação serão suficientes para reduzir substancialmente sua proporção no PIB - ele considerou que um crescimento de 3% por dois ou três anos com o teto de gastos operante fariam o serviço.
As "paredes" do teto de gastos serão a reforma do Estado, com três pilares fundamentais. A da Previdência é a "primeira e a maior" das reformas e Guedes sugeriu que ela poderá ser aprovada pelo Congresso em dois a três meses. Se for bem sucedida, o Brasil terá "dez anos de crescimento pela frente", prevê.
Se a reforma da Previdência não for aprovada, Guedes tem alternativas - a desvinculação e desindexação total das despesas do Orçamento por meio de proposta de emenda constitucional. Para ele, o Congresso dessa forma resgataria sua missão primordial. Um dos motivos de descrédito do Legislativo junto ao povo, segundo o ministro, é "ter muitos privilégios e poucas atribuições".
A reforma da Previdência é o primeiro passo para o acerto da dimensão fiscal. O segundo será melhorar o balanço patrimonial da União, por meio de privatizações e desmobilizações de ativos. Guedes acredita que há importantes fontes de receitas nestas ações, se forem perseguidas com afinco. O terceiro pilar será o da "redução, simplificação e eliminação" de tributos, disse Guedes, mencionando que o titular da secretaria, Marcos Cintra, trabalha na criação de um Imposto Único Federal, iniciativa sobre a qual não deu detalhes mas que conta com sua simpatia. Outra ideia da equipe é sepultar de uma vez por todas os programas de refinanciamento de dívidas (Refis).
Com as mudanças tributárias Guedes quer "inverter a pirâmide" fiscal no Brasil, onde os impostos têm de passar dos Estados para a União e depois serem redistribuídos. "O dinheiro tem de ir aonde o povo está", afirmou. Não haverá mais tributos que não sejam repartidos com os entes federativos.
A face administrativa da reforma de Estado está a cargo da secretaria do Planejamento, que aproveitará trabalho desenvolvido pelo então ministério no governo anterior sobre a reorganização das carreiras no Estado - hoje são 390. Guedes disse que há potencial de cortes de 30% das despesas com a reestruturação. Da mesma forma, as primeiras medidas do combate a fraudes e privilégios serão encaminhadas na próxima semana e têm potencial para recuperar R$ 17 bilhões em receitas. É o primeiro passo, segundo o ministro, de uma rota que conduz a meios mais sofisticados de controle e fiscalização, como a identidade e o governo digitais. Uma "enxurrada" de medidas de simplificação, desregulamentação e desburocratização serão encaminhadas nos próximos 30 dias.
Guedes considerou prova de força da democracia a alternância de poder. Após 30 anos de uma aliança entre o centro e a esquerda, chegou a vez da aliança entre conservadores e liberais governar o país. "A democracia brasileira estava capenga sem isso", afirmou. Ele disse que os liberais têm preocupações e respostas para a área social que diferem das que foram aplicadas, que tinham como corolário o "Estado como motor do crescimento" e como produto "dois filhos bastardos: a corrupção política e a estagnação econômica". Há dois obstáculos para que os planos de Guedes possam funcionar. Um é que a maior parte das reformas depende do Congresso, cujo apoio é incerto. O segundo é até que ponto Jair Bolsonaro concorda com eles.
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