Muitos ficaram chocados com o bloqueio de dotações orçamentárias do Ministério da Educação e reagiram como se estivessem vendo um raio em dia de céu azul e o corte fosse algo extemporâneo. Sem entrar no mérito da questão - se a área de educação deveria ser atingida por cortes -, o que surpreende é a "surpresa" dos críticos. Será que se esqueceram de que as finanças públicas, no conceito consolidado (União, Estados e municípios), estão no vermelho desde 2014 e que o Tesouro só consegue cobrir as despesas por meio do aumento da dívida pública, que, em março, chegou a 78,4% do PIB?
A educação não foi a única área afetada. Todos os órgãos, com exceção do Ministério da Saúde, sofreram bloqueio de verbas. A medida, decorrente de determinação legal, transformou-se numa trapalhada, produzida pela própria comunicação oficial. Inicialmente, o governo informou que puniria universidades federais onde houvesse "balbúrdia" - foram citadas a UnB (Brasília), a UFBA (Bahia) e a UFF (Federal Fluminense). Depois, anunciou-se a aplicação de corte linear de 30% no conjunto das universidades.
A informação estava errada: o tamanho do corte variou de acordo com a situação de cada universidade, uma decisão acertada, uma vez que cortes lineares põem em risco a execução de programas bem-sucedidos, enquanto outros, sem mérito algum, são mantidos.
No dia 22 de março, cumprindo determinação do artigo 9º da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o governo divulgou o relatório de avaliação de receitas e despesas do primeiro bimestre. No relatório, informou que, para cumprir a meta fiscal de deste ano, é necessário contingenciar R$ 29,782 bilhões, pois a arrecadação federal ficou abaixo do nível esperado. O Orçamento de 2019 foi elaborado com expectativa de crescimento da economia de 2,5%, inflação de 4,2%, preço médio do petróleo de US$ 74 por barril e aumento da massa salarial de 7,5%. Esses parâmetros foram revisados por força da realidade e, alguns deles, para pior, como é o caso da expansão do PIB.
Com ritmo menor de elevação do PIB, menor é a receita tributária. Por causa da revisão dos parâmetros, a Receita Federal reduziu em R$ 11,1 bilhões a estimativa da arrecadação com tributos federais para este ano. A receita da Previdência foi reestimada para baixo em R$ 6,7 bilhões. Além disso, o governo decidiu retirar das contas estimativa de receita de R$ 11,8 bilhões com a concessão de usinas hidrelétricas pertencentes à Eletrobras. Como não haverá mais privatização da estatal neste ano, a concessão das usinas foi cancelada. Diante disso, o governo foi obrigado por lei a realizar o bloqueio de verbas. Se isso não fosse feito, o presidente Jair Bolsonaro incorreria em crime de responsabilidade.
No dia 29 de março, Bolsonaro assinou o decreto determinando o montante global do corte. A comunicação oficial não esclareceu que, caso a arrecadação melhore, o bloqueio será suspenso, total ou parcialmente. Por isso, do ponto de vista técnico, não se pode falar em corte de gastos, mas em contingenciamento. O governo também não explicou que o bloqueio não atingiu as despesas obrigatórias nem, por exemplo, o programa Bolsa Família. Apenas as despesas discricionárias (custeio da máquina administrativa, que não inclui o pagamento de salários dos servidores, e os investimentos) foram atingidas.
Na escolha dos cortes, o ministério mais atingido foi o de Minas e Energia, que perdeu 79,54% de suas despesas discricionárias, principalmente porque o governo desistiu de capitalizar a Eletrobras em R$ 3,5 bilhões neste ano. O Ministério da Defesa perdeu 37,22%, o de Infraestrutura, 38,47%, o da Ciência e Tecnologia, 41,44%, e o da Educação, 23,19%, citando apenas os principais. No dia 22 deste mês, o governo fará nova avaliação de receitas e despesas e já anunciou que haverá novo bloqueio das despesas, pois a economia vai crescer menos ainda do que projetou na primeira avaliação. Agora, projeta 1,5% e não 2,2%, como imaginou em março.
A situação trágica das contas públicas poderá ser amenizada se for concretizado o mega-leilão do petróleo excedente dos campos de petróleo cedidos pela União à Petrobras, de forma onerosa. Com o leilão, o governo espera arrecadar, em termos líquidos, R$ 72 bilhões. Isso permitirá uma reversão do bloqueio das verbas. O problema é que o dinheiro só deverá ingressar nos cofres do Tesouro no fim do ano, na melhor das hipóteses. Até lá, os ministérios terão que continuar reduzindo despesas.
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