- Folha de S. Paulo
Medidas daninhas, extremistas e reacionárias são limitadas por Congresso e Judiciário
Jair Bolsonaro tende a se beneficiar de avanços que não são resultado da atuação do presidente, de seu entorno e de sua articulação parlamentar, que inexiste. A reforma da Previdência progride, apesar do Planalto. Por outro lado, as derrotas do bolsonarismo “raiz”, embora nenhuma avassaladora, podem ter um saldo positivo para o governo, no entanto.
Medidas daninhas, extremistas e reacionárias, quando não ilegais, são limitadas por Congresso e Judiciário.
Existe a possibilidade de que Parlamento e Justiça vistam o governo com um paletó de direita, em vez da fantasia de extrema direita do maluco da serra elétrica.
Sim, a camisa de força continua no guarda-roupa. O Congresso talvez aprove reformas que podem salvar Bolsonaro do naufrágio econômico, sem ganho político imediato algum; também por isso planeja limitar poderes presidenciais, pontual ou sistematicamente.
Por ora, houve reação no caso do sigilo de atos de governo, dos decretos faroeste (sobre armas), da extinção de conselhos e da promessa de punir universidades “da balbúrdia” com corte de verbas, por exemplo. Por bons e maus motivos, o Congresso adiou “sine die” a apreciação do mui problemático pacote anticrime do avariado Sergio Moro.
Gente mais sensata do governo tolheu dedaços de Bolsonaro na Petrobras e no Banco do Brasil. Militares contiveram o avanço ainda maior da filhocracia e de ideólogos youtubers sobre o Planalto.
Não se faz aqui uma previsão. Trata-se de constatar uma resultante recente e precária do embate entre os instintos mais primitivos do governo com instituições e parte da opinião pública.
Obviamente, o bolsonarismo “raiz” tem a seu modo uma ideia de revolução, de “quebrar o sistema”. Pode estar apenas em fase de muda e recuo tático; Bolsonaro mal sabe o que diz e faz. Etc. Ainda assim, se o sistema de algum modo funcionar, pode ser que o show antiestablishment perca plateia.
O programa teológico-escatológico instalado no Itamaraty por ora parece tolhido. Foi o que aconteceu com as iniciativas mais práticas, praticamente loucas, tal como a intervenção na Venezuela e a conversa de combater o “globalismo”. Houve reação de ministros militares, do Ministério da Economia, da Agricultura e da burocracia das Relações Exteriores.
Note-se que parte do governo tem anunciado com orgulho possibilidades como o acordo com a União Europeia e a entrada do Brasil na OCDE, duas frentes do “globalismo”. A viagem do vice-presidente Hamilton Mourão à China tapou outra parte da cornucópia de maluquices comerciais e diplomáticas.
Se essa diplomacia extraoficial vai dar certo, é outra história. Goste-se ou não dessas políticas, são planos que estão no universo da razão. Seria ainda mais esperto elaborar um programa geral de governo, que quase não existe. Há promessas de desmonte, como na educação e no ambiente, ambições vagas e grandiosas na economia e os decretos dos ressentimentos de Bolsonaro.
Que a reforma da Previdência ainda caminhe nesse pântano é uma surpresa, resultado do pacto de lideranças parlamentares com boa parte da elite econômica.
Diz-se que a economia com a reforma teria baixado a R$ 850 bilhões, a esta altura um chutaço. Mas, caso o palpite não seja muito errado, mesmo essa economia pouca tende a beneficiar Bolsonaro, que quase nada fez a respeito. Se o governo fosse menos amador, alucinado e extremista, o resultado seria ainda melhor.
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