- O Globo
A primária democrata tende a se polarizar entre 3 esquerdas (...). A dúvida é qual delas terá mais força para vencer Trump
Os republicanos querem voltar para os anos 1930, e alguns democratas, para os anos 1990. Mas nenhum dos dois terá sucesso. Esta linha de pensamento, com outras palavras, foi elaborada pelo pré-candidato democrata a EUA, Pete Buttigieg, que é o mais jovem e primeiro homossexual assumido a concorrer à Presidência dos EUA, além de ser veterano da Guerra do Afeganistão, ter diplomas de Harvard e Oxford e ter trabalhado na consultoria McKinsey, falar nove idiomas e governar uma cidade no Meio-Oeste americano.
A direita já deixou para trás a defesa de um sistema econômico pró-mercado que a marcou no pós-Segunda Guerra para focar numa agenda nacionalista na Europa e nos EUA. Basta ver que a maior força política da direita francesa é Le Pen; na Itália, Salvini; no Reino Unido, Boris Johnson. Além, claro, de Trump. Uma das raras exceções contrárias a esta tendência da direita é Angela Merkel, que ruma para a aposentadoria sem termos claro qual será o futuro dos democratas-cristãos alemães.
Já a esquerda se divide em três grupos. Primeiro, temos políticos com propostas quase anos 1990, como Joe Biden, nos EUA. Sentem um saudosismo daquela década de vigor da liberal-democracia, ainda que tenha ocorrido um genocídio um Ruanda e massacres na Bósnia. Seriam os órfãos da Terceira Via, dos tempos de Bill Clinton, Tony Blair e, no Brasil, Fernando Henrique Cardoso. O segundo grupo seria ainda mais ultrapassado, com posições dos tempos da Guerra Fria, como Corbyn, no Reino Unido, Mélenchon, na França, Bernie Sanders, nos EUA, e mesmo setores da esquerda brasileira.
O terceiro grupo está ainda se formando eé composto por uma nova esquerda mais jovem e cosmopolita. São mais preocupados com o meio ambiente, os direitos das minorias religiosas e sexuais, mobilidade urbana nas grandes cidades e coma integração de imigrantes. Estão mais antenados com o mundo de hoje e não com o dos anos 1980 e o dos 1990. Entendem que aquelas eras acabaram. Veem como adversários anova direita populista. Querem garantir avanços deste século. Sabem que seria impensável no passado haver um premier homossexual na católica Irlanda, um muçulmano prefeito de Londres, a maconha legalizada na Califórnia, carros elétricos e um negro filho de africano presidente dos EUA. Estas vitórias devem ser consolidadas e ampliadas para esta nova esquerda.
Ao redor do mundo, entre as figuras desta nova esquerda, podemos citar Jacinda Ardern, da Nova Zelândia, Justin Trudeau, do Canadá, e alguns líderes de partidos verdes europeus, além de políticos como o prefeito de Londres, Sadiq Khan. No Brasil, esta ideologia tem crescido entre setores mais jovens de grandes cidades, mas a esquerda associada ao PT e Lula ainda segue muito forte, deixando pouco espaço para esta nova vertente.
A primária do Partido Democrata tende a se polarizar entre estas três esquerdas. Biden representando o saudosismo dos anos 1990; Bernie buscando levar o partido para uma agenda econômica da esquerda americana dos anos 1970 e 80; e Buttigieg e a senadora californiana Kamala Harris, que representariam mais esta esquerda moderna. Elizabeth Warren teria um pouco de cada uma destas vertentes. A dúvida é qual delas terá mais força para vencer Trump, que conseguiu transformar com o seu populismo o Partido Republicano.
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