A partir do entendimento com a UE, Mercosul pode abandonar orientação protecionista
Depois de 20 anos de negociações, finalmente o Mercosul e a União Europeia chegaram a um entendimento político para viabilizar o maior acordo de livre-comércio já obtido pelos dois blocos.
A área abrangida compreenderá 780 milhões de pessoas e 25% do Produto Interno Bruto mundial, com uma corrente de comércio de bens e serviços de aproximadamente US$ 138 bilhões. A longo prazo serão eliminadas cerca de 91% das tarifas de lado a lado.
O acordo tem grande dimensão histórica. Tanto pelo longo tempo de gestação, que abrangeu quatro governos brasileiros, quanto por seu significado no contexto mundial atual de recrudescimento de pressões protecionistas.
Não parece exagero considerar que o Mercosul deu um passo decisivo para sua reorientação.
Tem agora sua melhor chance para se converter de mero espaço protecionista —uma união aduaneira que na prática dificultava acordos bilaterais— em plataforma de integração com o restante do mundo, com ganhos de produtividade e acesso a novos mercados.
O governo Jair Bolsonaro (PSL), que em declarações passadas desdenhou do bloco sul-americano, colhe agora os frutos de um penoso trabalho de antecessores —em particular, da gestão econômica liberal de Michel Temer (MDB).
Além da redução de tarifas, que no caso do Mercosul será significativa para bens industriais, sobretudo automóveis e peças, o acordo envolve um amplo conjunto de temas de natureza regulatória, compras governamentais, barreiras técnicas, propriedade intelectual e padrões sanitários.
Preveem-se um período de transição razoavelmente longo e salvaguardas de lado a lado, de modo a regular importações e evitar mudanças abruptas que ameacem o equilíbrio econômico e social.
As tarifas incidentes sobre automóveis, por exemplo, cairão dos atuais 35% para zero em 15 anos, com sete anos de carência. Enquanto isso, haverá uma cota de importação de 50 mil carros.
O mesmo padrão se adota no caso da agricultura, do lado europeu. Vendas de carne bovina ficarão limitadas a 99 mil toneladas por ano com tarifa preferencial de 7,5%, embora uma vasta lista de produtos deverá ter acesso livre.
Também foram superadas as suspeitas de falta de compromisso com a proteção ambiental do lado brasileiro, o que vinha travando o entendimento nos últimos momentos. Na prática, o que é bem-vindo, o país se comprometeu em cumprir as normas do Acordo de Paris, tema a constar do texto.
Em outro aspecto importante, torna-se ainda mais urgente para o Brasil realizar reformas internas que possam alavancar a produtividade —caso do redesenho do sistema tributário.
A aplicação do acordo não é imediata. Haverá um período de revisão legal e ratificação pelos respectivos Legislativos, o que pode ainda trazer ruídos e atrasos. Mas o compromisso político está firmado e tudo sugere o início de uma nova fase de dinamismo para o comércio exterior brasileiro em seu segundo maior mercado.
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