Iniciativa de parlamentares dos EUA deixa Planalto em situação crítica para fechar pacto comercial
Na quarta-feira, o embaixador Robert Lighthizer, negociador dos acordos comerciais dos Estados Unidos, vai discutir com deputados americanos a agenda da política comercial dos EUA para os próximos 12 meses. O Brasil é tópico relevante nesse debate.
Há meses os governos Jair Bolsonaro e Donald Trump negociam um acordo “sobre regras comerciais e transparência, incluindo facilitação do comércio e boas práticas regulatórias”, conforme divulgaram. As negociações seguem a moldura do Acordo de Comércio e de Cooperação assinado pelos ex-presidentes Dilma Rousseff e Barack Obama em 2011.
Na semana passada, 24 deputados do Partido Democrata, que compõem a maioria desse comitê de tributação (Ways and Means) — o principal e mais antigo do Congresso dos EUA— , enviaram longa carta ao embaixador Lighthizer. Nela advertem que consideram “inapropriadas” negociações “de associação econômica de qualquer alcance” com o governo Bolsonaro.
Consideram que o presidente brasileiro “ignora o estado de direito” e atua para desmantelar “o difícil progresso em direitos civis, humanos, ambientais e trabalhistas”. Insistiram: “Nos opomos firmemente a qualquer tipo de acordo comercial com o governo Bolsonaro.”
Essa inédita iniciativa deixa o Palácio do Planalto numa situação crítica. Sem aval dos democratas, não haverá acordo com Washington. E, em Brasília, não há — e nem poderia haver — respaldo a uma negociação encoberta pelo segredismo oficial que há 17 meses impede o debate, a fiscalização e o controle das iniciativas relevantes na política externa.
Há dias, em sintomática unanimidade, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e os ex-ministros responsáveis pela diplomacia brasileira nos últimos 30 anos divulgaram documento acusando a atual gestão do Itamaraty de “sistemática violação” da Constituição, por atuar na contramão dos interesses nacionais — especificamente, nas escolhas feitas sem nenhuma transparência no jogo de poder hegemônico entre os EUA e a China.
O quadro se agrava. O chanceler Ernesto Araújo não apenas oculta algo relevante ao país. Seu discurso na reunião ministerial de abril, tornada pública por ordem do Supremo Tribunal Federal, sugere que também enleva seu chefe no delírio de uma “reinvenção do Brasil” no cenário de “uma nova ordem mundial” à margem da China, a potência emergente.
O radicalismo que impregna as políticas externa, de meio ambiente e de direitos humanos se tornou pretexto a iniciativas protecionistas nos EUA e na União Europeia, onde avançam vetos parlamentares a um acordo de livre comércio com o Brasil, por razões idênticas às alinhadas pelo Partido Democrata na carta ao negociador-chefe do U.S. Trade Representative. Nessa marcha desorientada, o governo Bolsonaro se torna vítima da própria insensatez.
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