Percepção
manifestada pelo presidente Bolsonaro não é compartilhada pelo mercado
financeiro, o disjuntor mais sensível em situações de inadimplência
Se
o presidente
Bolsonaro não pode fazer nada, como disse, “porque o País está
quebrado”, então, para começar a fazer alguma coisa, ele tem de consertar o
País.
Ele
aponta duas causas da quebra: o novo coronavírus, que paralisou a atividade
econômica e derrubou a arrecadação em 2020; e a “mídia sem caráter, que
potencializou a covid-19”.
Sobre o diagnóstico de que o País está quebrado, não há o que acrescentar ao que seu próprio ministro da Economia e economistas independentes já disseram.
A percepção manifestada pelo presidente não está sendo compartilhada pelo mercado financeiro, o disjuntor mais sensível a cair ao primeiro curto-circuito produzido por situações de inadimplência. Não há corrida ao dólar; o índice de risco Brasil medido pelo Credit Default Swap de 5 anos (CDS5) está em queda, como mostra o gráfico; e a Bolsa vive seu momento de pico. Além dos US$ 356 bilhões em reservas externas, a balança comercial apresentou superávit de US$ 50 bilhões em todo o ano de 2020. Portanto, as contas externas não preocupam.
Há,
sim, um rombo de R$
651 bilhões contabilizado nas contas públicas em 2020, que pode
comprometer o futuro. A dívida pública deve ter terminado o ano passado nos
93,3% do Produto
Interno Bruto (PIB) e avança rumo
aos 100% do PIB (veja o gráfico). Esse rombo poderia ser
coberto ou reduzido com três providências: com uma estratégia confiável de
retomada da economia; com o encaminhamento das reformas administrativa e
tributária; e com mais competência na administração dos recursos do setor
público. Mas o governo não se move nessa direção.
É
verdade que a pandemia de covid-19 produziu enorme estrago no mundo e também
por aqui. Foi ela a causa da queda do PIB do Brasil, próxima dos 4,5% em 2020.
Mas a depressão foi menor do que o projetado em abril e maio, o tal recuo de
9,5%.
Se
o novo coronavírus foi a causa principal da quebra apontada por Bolsonaro,
então seria de esperar que seu governo montasse um aparato destinado a
combatê-lo. Não foi o que se viu. Até agora, Bolsonaro insistiu em negar a
gravidade da pandemia e chegou a tratá-la como “gripezinha”. Para ele, não
havia o que fazer para enfrentar a pandemia além de levar a população a tomar
cloroquina. Era deixar que as leis de Darwin e as reações espontâneas do
sistema imunológico dos brasileiros começassem a funcionar, supostamente até
alcançar a polêmica imunização de rebanho.
Foi
essa postura negacionista que deixou o País despreparado para as vacinas que
vêm vindo aí. Quando, finalmente, o Ministério da Saúde, comandado por um
“especialista em logística”, entendeu que seria preciso correr atrás dos
suprimentos, ficou tarde demais. Na atual marcha das estatísticas, até fevereiro,
o Brasil terá contabilizado pelo menos 200 mil mortes.
Os
países avançados já haviam se adiantado para garantir seus suprimentos de
vacina e de tudo o que a acompanha: pessoal, equipamentos de conservação,
seringas e tudo o mais. Até mesmo países mais pobres do que o Brasil começaram
a vacinar sua população, como é o caso da Argentina,
da Índia,
do México e
do Chile.
Se
Bolsonaro estivesse correto e se a principal causa da suposta quebra do Brasil
fosse mesmo a pandemia, pela mesma lógica, seria preciso admitir que a omissão
do governo em combatê-la terá sido causa equivalente. Se se recusam a combater
um incêndio, os bombeiros também são causa e têm de ser responsabilizados por
ele.
A
alegação de que a “mídia sem caráter” ajudou a afundar o País não merece
consideração.
Bastam as contradições do presidente para mostrar como o País está sem rumo e sem liderança.
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