O Globo
Está lá um corpo estendido no chão. Há meses.
Ainda não visto. Está lá, podre já. Gere-se o cadáver; a ocultação do bicho.
Processo mui favorecido pela fluência da valsa entre enganados e enganadores.
(Fingir não ver faz esperança e preço; faz também um ministro.) Ainda não
avistado o presunto, coberto pela maré alta; que fantasia e charme não deixam
baixar. (Maré artificial cuja sustentação custa caro. Você pagará a fatura.
Nenhuma novidade. E vale: o país está salvo, derrotado o capeta. Pague-se.)
Trabalhando com a maré, a favor do “me engana
que eu gosto”, a espuma; que dissimula a perversidade, de natureza necrófila,
contida em tanto bulir na carcaça. O troço esvaído — e mexido, mexido, mexido.
Jesus!
A espuma: Musk já cansado ou por se cansar do Brasil, doravante dedicando-se à liberdade na China e na Rússia. Ficaremos mesmo — em defesa da democracia — com revigorados Xandão e inquéritos xandônicos. Destino cuja previsibilidade só não era maior que a do fado da regra fiscal haddadiana. (Ou que a de novo calote de governos estaduais e seus claudiocastros. Renegocie-se, em honra à incompetência e ao estelionato eleitoral.)
Endividamo-nos, para déficit também do Estado
de Direito. Sina. O ajuste, o equilíbrio, a vir nalgum porvir. A conta que não
fecha hoje. Jamais hoje. A da democracia garantida por autoritarismos. A da
economia, por petismos.
O mundo real se impõe. Sempre. E ficaremos
mesmo — em defesa da responsabilidade — com o fiscalista Fernando Haddad, cuja
“Fazenda não se opôs” ao contrabando que garantirá gasto extra de quase R$ 16
bilhões. Culpa do vilão Rui Costa. Né? O mordomo de um governo
incondicionalmente comprometido com a liberdade de gastar.
(Haddad não quer gastar. Ok? Apenas precisa
arrecadar para o governo gastar.)
Está lá um corpo estendido no chão. Há meses.
Coberto o presunto pela maré alta que fantasia e charme não deixam baixar.
O corpo morto, inchado dos sais, é do
arcabouço fiscal. Natimorto, desde então submerso. Morto muito louco. Fantasia:
a meta zero. Charme: o violão de Haddad. Protegido o defunto — a água da fé e
outros interesses tapando também o cheiro — pelo desejo (jogo) em acreditar
(fazer acreditar) no fechamento de conta que não fecha. E então se mexe no
morto.
A regra natimorta: gastar sempre e mais;
nunca cortar despesas; arrecadar e arrecadar e arrecadar. Para simular rebater
a despesa que cresce. A conta que não fecha. Que nunca poderia fechar. Meta
fiscal em xeque, pois. A fachada, peça de propaganda, que facilitou o delírio.
Haddad vencedor. O compromisso mantido! Meta já era. E não a dos anos
vindouros, que essas já foram para o saco. Em xeque a meta de 2024. O
compromisso... meios de arrecadação “se exaurindo” — né, ministra Tebet? Algo
que se tratou como “soluço do arcabouço”. Nunca vi defunto soluçar. Você
soluçará. Compromissos como bolinhas de sabão.
Arrecadação cansada. Exaustão ineficiente
para provocar alguma prudência; e aí está: revira-se o cadáver — que soluça —
para disparar, com base nas receitas de meses vencidos, gatilho
antecipador-liberador de granas que as projeções do futuro travariam.
Se “a previsão de receitas não aponta
recursos suficientes”, soltem-se hoje, para efeito amanhã, recursos com base no
resultado do passado. Ainda assim, não será suficiente. Não seria suficiente
nem se houvesse uma PEC da Transição por ano.
Manchete deste GLOBO: “Pressionado, governo
dá aval a mudança no arcabouço fiscal para garantir recursos”.
Pressionado? Por quem? Elão? Xandão?
Bolsonaro? Fascistas? Golpistas? Pressionado o governo por ele próprio. Pela
farsa que criou. Pela carga do finado que encobre e carrega. E então se bole
com o morto. Maquia-se o morto.
Na falta de uma PEC da Transição permanente —
a turma queria — para despejar bilhões de orçamento em orçamento e vestir
perdulários de operadores no azul, a Fazenda não se opõe à maldade de Costa.
Fala José Guimarães, líder de Lula na Câmara:
– Foi uma opinião do governo comandada pelo
Rui Costa.
O governo é Lula. Costa é Lula. Haddad é
Lula. A opinião do governo Lula é de Lula: dane-se; gaste-se.
A isso não faltará o Parlamento de Lira e
Alcolumbre. Grana extra negociada, incorporada aos orçamentos do futuro, em
troca de acomodação para aqueles cerca de R$ 5,5 bilhões vetados às emendas de
comissão, esse conjunto constitutivo de fundo eleitoral paralelo em ano
eleitoral. Padilhas e outras espumas à parte, a galera afinal se acerta.
Capaz ainda de o governo, com essa pedalada,
comemorar a chance de desbloquear porções do Orçamento. Rapaziada competente.
Morto eficiente, o arcabouço fiscal. Um
morto, nascido morto, cuja morte ainda será declarada. Não se sabe quando.
Talvez nunca. Um morto que morre diariamente. Um morto muito vivo.
Convenientemente.
Um comentário:
Pensei que o ''morto muito louco'' fosse aquele da cadeira de rodas,apesar que naquele caso,a sobrinha é que está louca.
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