Valor Econômico
Se o Banco Central é considerado politizado, suas decisões deixam de ser vistas pelo prisma técnico. Tudo vira política
O Comitê de Política Monetária do Banco Central (BC) deve decidir, em sua reunião de dois dias que começou na terça-feira (18), pela manutenção da taxa básica de juros Selic em 10,5%. É um revés importante para o governo Lula, já que se trata de um indicativo forte de que a autoridade monetária entende ser necessário subir a remuneração dos investidores que se dispõem a ter títulos de dívida pública em sua carteira. Um dado diretamente relacionado às incertezas que os investidores veem sobre a consistência fiscal do país.
É dentro dessa perspectiva que se deve
entender as declarações do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra o
presidente do BC, Roberto Campos Neto, na manhã de terça em entrevista
exclusiva à Rádio CBN. O primeiro ponto que merece ser ressaltado é que foi um
ataque espontâneo. Os entrevistadores não provocaram Lula a falar sobre o BC.
“Nós só temos uma coisa desajustada no Brasil, que é o Banco Central. O
comportamento do Banco Central é uma coisa desajustada”, disse o presidente.
Em outras palavras, Lula diz que o Banco
Central não age em reação aos fundamentos da economia e se orienta pela
política. Segundo Lula, Campos Neto “não demonstra nenhuma capacidade de
autonomia, tem lado político, trabalha muito mais para prejudicar o país do que
para ajudar o país”. O presidente mencionou o jantar recente de Campos Neto com
o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e compara o presidente da
autoridade monetária ao senador Sergio Moro (União Brasil-PR).
A menção do encontro de Campos Neto com
Tarcísio é uma alusão a uma suposta motivação política: Campos Neto trabalharia
pra prejudicar o governo de forma a ajudar um dos principais presidenciáveis da
oposição. A comparação com Moro é uma forma de dizer que Campos Neto sai de seu
papel institucional.
A conclusão dessas duas premissas é que, se a
taxa básica de juros sobe, é porque Campos Neto politizou o Banco Central. “A
quem esse rapaz é submetido? Como é que ele vai a uma festa do governo de São
Paulo quase assumindo a candidatura a um cargo do governo? Cadê a autonomia
dele?”, indaga Lula. E nesse momento o presidente lembra de Henrique Meirelles,
seu presidente do Banco Central entre 2003 e 2010, como modelo de gestor
independente. Soa irônico, já que Meirelles era deputado federal eleito pelo PSDB
por ocasião de sua indicação. Foi a única vez que o Brasil teve à frente do
Banco Central alguém veterano em eleições.
Se o Banco Central é considerado politizado, suas decisões deixam de ser vistas pelo prisma técnico. Tudo vira política. É exatamente esse o objetivo das declarações de Lula. O ataque é uma vacina ao que vem na ata do Copom.
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