Folha de S. Paulo
Coletânea de artigos de Peter Singer traz
textos em que filósofo defende infanticídio, liberação do doping e a
comercialização de rins
Peter Singer é um dos mais estimulantes filósofos da
atualidade. Embora ele abrace uma corrente teórica —o consequencialismo—,
dedica-se mais a discutir questões práticas. E, ao fazê-lo, não hesita em ir
até onde seu pensamento o leva, mesmo que as conclusões sejam controversas.
Em "Ethics in the Real World", uma coletânea de 90 ensaios voltados para o público geral, Singer mostra a que veio. Entre as muitas teses polêmicas que ele defende estão o infanticídio (a eutanásia de bebês gravemente doentes), a liberação do doping para atletas e a criação de um mercado de rins. O interessante é que, apesar de as conclusões poderem ser classificadas como radicais, Singer chega a elas através de argumentos muito ponderados.
Outra característica de seus escritos é que
ele sempre deixa espaço para o leitor discordar. Singer foi um dos primeiros
proponentes do vegetarianismo ético, que abraça com entusiasmo. Mas ele não
nutre a ilusão de que toda a humanidade se tornará vegetariana. Para os
carnívoros irredutíveis, ele propõe que pelo menos exijam que animais destinados ao abate não sejam submetidos a uma
vida inteira de maus-tratos. Difícil discordar.
Ilustração de Annette Schwartsman, sobre
coletânea de ensaios de Peter Singer, para a coluna de Hélio Schwartsman, esta
que será publicada também na versão impressa da Folha neste domingo (5.jan.25)
- Annette Schwartsman/Folhapress
O próprio Singer explica por que se dedica a
escrever para o público geral. Artigos científicos que saem em periódicos com
revisão por pares são lidos em média por dez pessoas. Um texto de opinião num
jornal de grande circulação pode ser lido por centenas de milhares ou mesmo
milhões. E alguns destes leitores mudarão seu modo de ver as coisas e talvez
até suas atitudes.
Um dos problemas da modernidade, como Singer
mostra num dos ensaios, é que a maioria de nós tirou a reflexão moral de suas
vidas. Apenas 23% dos americanos param com alguma frequência para pensar sobre
os aspectos éticos de decisões; 31% o fazem às vezes; e 46%, nunca.
Na maioria das situações, nós apenas nos
deixamos levar pelas intuições morais que vêm embutidas em nossas cabeças. O
problema é que elas evoluíram para lidar com questões da Idade da Pedra que têm pouca relevância no mundo de hoje.
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